Descrição de chapéu Copa América

Única final que Argentina venceu Brasil teve pancadaria e herói descontente

Copa América de 1937 foi decidida entre brasileiros e argentinos, que ficaram com o título

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São Paulo

A lembrança de finais recentes entre Brasil e Argentina ainda está bastante viva na memória dos torcedores. Especialmente dos brasileiros, vitoriosos em 2004 e 2005 com gols históricos de Adriano, e também em 2007, com a goleada por 3 a 0 diante de uma equipe que já tinha Lionel Messi.

Para recordar uma decisão vencida pelos argentinos contra o rival, é preciso voltar no início do século passado, a 1937.

A final da Copa América daquele ano, competição chamada então de Sul-Americano, foi a primeira entre as seleções na história e a única vencida até hoje pelos alvicelestes –não considerando a Copa Roca ou o Superclássico das Américas, torneios amistosos entre os dois países e com edições esporádicas.

Organizada na Argentina, a competição de 1937 reuniu seis seleções. Além dos anfitriões, participaram Brasil, Chile, Paraguai, Peru e Uruguai.

Multidão do lado de fora do Estádio de Boedo, em Buenos Aires, antes da decisão entre Brasil e Argentina
Multidão do lado de fora do Gasómetro, em Buenos Aires, antes da decisão entre Brasil e Argentina - Conmebol

Para sediar as partidas, foram escolhidos dois estádios: o antigo Gasómetro, em Boedo, que pertencia ao San Lorenzo, e o estádio de Alvear y Tagle, que pertencia ao River Plate e era chamado assim pelo encontro das ruas de mesmo nome. Ambos já não existem mais.

Pela primeira vez, a competição autorizava as seleções a realizar substituições durante as partidas. Mas ainda não havia bancos de reservas. Com isso, os jogadores suplentes ficavam deitados próximos à linha lateral enquanto a partida se desenrolava.

Disputada em pontos corridos e com turno único, cada equipe jogaria cinco partidas, e quem somasse mais pontos levaria o título.

O Brasil chegou ao último jogo, contra a Argentina, na liderança, com 8 unidades. Mas a derrota por 1 a 0 para os argentinos, gol de Enrique "Chueco" García, levou os anfitriões também a 8 pontos e forçou um duelo de desempate para definir o campeão.

Autor do gol da vitória, García é considerado um dos melhores pontas esquerda do futebol argentino. Disputou 35 partidas pela seleção e anotou 9 gols, 4 deles em clássicos diante do Brasil.

Além dele, a equipe também contava com Francisco Varallo, terceiro maior artilheiro do Boca Juniors, e Antonio Sastre, figura histórica do Independiente e que viria ao futebol brasileiro na década de 1940 para se tornar ídolo do São Paulo.

Equipe argentina que foi campeã da Copa América de 1937 tinha Antonio Sastre, que depois foi ídolo no São Paulo
Equipe argentina que foi campeã da Copa América de 1937 tinha Antonio Sastre, que depois foi ídolo no São Paulo - Conmebol

Contudo, apesar de reunir jogadores com talento e experiência, a partida de desempate seria decidida por um garoto que iniciava a sua carreira e, aos 19 anos, ainda era menor de idade pela lei vigente na Argentina.

Vicente de la Mata chegou à Copa América como atleta do Central Córdoba. De acordo com o livro "Quién es Quién en la Selección Argentina", de Julio Macías, De La Mata enfrentou Peru e Uruguai na Copa América de 1937 ainda como representante do clube cordobês.

O Independiente, interessado em seu passe, negociou com o jogador e com o Central. As partes chegaram a um acordo e seu contrato com o novo clube foi assinado por seu pai em 31 de janeiro, dado que o filho não havia atingido a maioridade. No dia seguinte, ele enfrentaria o Brasil no confronto decisivo da Copa América.

Iniciada na noite do dia 1º de fevereiro, a partida só terminou nas primeiras horas da madrugada do dia 2. Isso porque, além do empate em 0 a 0 no tempo normal, brasileiros e argentinos se engalfinharam no campo do velho Gasómetro.

"Foram produzidas todas as incidências imagináveis, desde encontrões mais ou menos fortes até tumultos indescritíveis. Houve suspensões, abandonos, lesionados, agressões", escreveu o jornalista argentino Chantecler para a Revista El Gráfico.

Segundo a crônica de Chantecler, a confusão se deu aos 35 minutos do segundo tempo, após Varallo sofrer uma falta dura do brasileiro Alfonso. O argentino não gostou da entrada e foi tirar satisfação, desferindo dois pontapés no defensor, dando início às agressões entre os desportistas.

Após mais de meia hora com o jogo paralisado, os atletas voltaram a campo, mas uma falta dura de Cherro em Roberto reacendeu os ânimos e os jogadores voltaram a se degladiar. A segunda onda de socos e chutes fez com que o Ministro das Relações da Argentina, Saavedra Lamas, abandonasse o estádio.

Finalizada em um empate sem gols, a partida foi para a prorrogação. Vicente de la Mata, que de acordo com a crônica da El Gráfico havia entrado no lugar do lesionado Varallo, marcou duas vezes, aos 4 e aos 8 minutos do segundo tempo extra.

Os reservas brasileiros, deitados na lateral do gramado, durante o Sul-Americano de 1937
Os reservas brasileiros, deitados na lateral do gramado, durante o Sul-Americano de 1937 - Conmebol

O primeiro gol veio em um chute cruzado, após indecisão do zagueiro Jaú e do goleiro Jurandyr em um cruzamento de "Chueco" García. O segundo chegou após cruzamento de Carlos Peucelle, gol bastante reclamado por Jurandyr e pela crônica brasileira por suposto impedimento.

"O juiz, inicialmente coagido, prejudicou. Os dois tentos foram cedidos a custo, foram arrancados pela violência. O segundo, impedido", escreveu Thomaz Mazzoni em A Gazeta Esportiva.

Apesar de decidir o clássico e entrar para a história como o autor dos gols do título de 1937, Vicente de la Mata, que jogou três partidas na competição, não se empolgou com o feito na final da Copa América.

"Cheguei com 65 quilos e vou embora com 62. Quando me substituíram contra o Uruguai, me desmoralizei. Suado, fiquei para ver o segundo tempo. Adoeci, não sei se da enfermidade ou de amargura. Agora fiz dois gols, mas eu queria ter jogado mais, e não joguei", declarou depois do torneio.

Recém-contratado pelo Independiente, o então menor de idade Vicente de la Mata se tornaria um dos maiores ídolos do clube de Avellaneda, formando, ao lado de Sastre e Arsenio Erico, um ataque recitado como música pelos torcedores. Juntos, foram campeões nacionais em 1938 e 1939.

"Aonde vai essa gente? Vai ver o don Vicente!", cantava a torcida do Independiente na época.

De la Mata disputou 13 jogos com a seleção argentina e marcou 6 gols, os mais importantes da lista na final da Copa América contra o Brasil. Sua despedida do selecionado foi justamente diante da equipe brasileira, em 1946, pelo Sul-Americano.

No dia 10 de fevereiro daquele ano, os argentinos venceram os brasileiros por 2 a 0, no Monumental de Núñez. Entretanto, a partida novamente descambou para a violência. Após Jair fraturar José Salomón em uma dividida, jogadores das duas equipes iniciaram a confusão no gramado.

O confronto ficou paralisado por mais de uma hora. Chico e De la Mata foram expulsos e não puderam finalizar a partida, que terminou em título argentino. Apesar da conquista, o jornalista Julio Macías, em seu dicionário dos argentinos que já atuaram pela seleção alviceleste, lamenta a forma como se despediu o herói de 1937.

"Essa tarde/noite constituiu sua aposentadoria da seleção, e não poderia ter sido mais triste."

Finais entre Brasil e Argentina na história

  • Copa América de 1937

    Argentina 2 x 0 Brasil

  • Copa América de 2004

    Brasil 2 (4) x (2) 2 Argentina

  • Copa das Confederações de 2005

    Brasil 4 x 1 Argentina

  • Copa América de 2007

    Brasil 3 x 0 Argentina

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