Em promessa a prefeito morto, Matonense tenta se reerguer com antigo investidor

Clube disputou a elite paulista na década de 1990 e hoje está na quarta divisão do estado

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Santos

O empresário Antônio Aparecido Galli, 67, fez uma promessa ao político Adauto Scardoelli (PT) durante a campanha à prefeitura de Matão, em novembro de 2020.

Caso Scardoelli vencesse a eleição, ele retomaria o investimento na Matonense, clube do município que fica a 384 km de São Paulo, afundado em crise na quarta divisão do estado.

O petista confirmou a vitória nas urnas, mas morreu em 5 de junho deste ano por complicações de um quadro de diverticulite, inflamação na parede interna do intestino. A promessa, ainda que feita no “fio do bigode”, como cita Galli, precisaria ser cumprida.

“Ele me pediu, caso ganhasse, para assumirmos novamente o futebol de Matão. Fiz um pacto com minha esposa, e ela aceitou também. Voltei com mais disposição”, conta à Folha o empresário.

A Matonense chegou a disputar a primeira divisão do estado na década de 1990
O novo time da Matonense, que teve bons momentos na primeira divisão do Campeonato Paulista na década de 1990 - Iory Keller/Matonense

Galli é um dos nomes mais conhecidos da cidade de pouco mais de 82 mil habitantes. Dirigiu o clube entre 1993 e 2001, período em que conseguiu chegar à elite do futebol paulista com três acessos consecutivos entre 1995 e 1997.

Deixou a Matonense por um pedido da esposa, ao final do último mandato, em setembro de 2001.

“Começou a correr aqui que o Galli não queria mais saber de futebol por conta da mulher. Ela ficava nervosa, e com razão. Eu só pensava no clube, só ia atrás de futebol. Acabavam os treinos, eu saía para beber, ficava até tarde”, confessa.

A Matonense cresceu na época com nomes como o lateral direito Zé Carlos, que disputou a Copa do Mundo de 1998, e o hoje técnico Dorival Júnior (então só Júnior), volante que marcou de falta o gol mais importante da história do clube, contra o Novorizontino, que garantiu o acesso à elite em 1997.

"Há uns anos me chamaram para trabalhar no clube, mas as coisas não estavam legais. Fui até Matão para ver e não senti confiança. Sentimos falta de times assim no interior. Existiam equipes na primeira divisão inferiores à nossa", lembra Zé Carlos, que jogou no São Paulo.

A Matonense se tornou referência no interior paulista, mas jamais teve calendário além do estadual, complicador para se manter em alto nível.

Após a saída de Galli, viveu uma derrocada com seguidas quedas. Ele reassumiu em 2013, quando conquistou, novamente, dois acessos consecutivos e chegou à Série A2. Perto da primeira divisão, parou novamente, desta vez por um câncer de próstata.

“Descobri o câncer em Barretos e operei por lá também. Hoje estou bem, já tem seis anos isso. Não precisei de quimioterapia, mas me deixou fora de combate na época”, conta.

O recomeço da Matonense se dá após longos anos –e tentativas frustradas– com investidores de fora da cidade. Sem recursos, o clube terceirizou o futebol. Desde 2017, a gestão era feita pela empresa Soccer Stars Marketing Esportivo, de propriedade de Reinaldo Morais, que também participa do futebol do Itumbiara-GO e do Tigres-RJ.

No último ano, gerou revolta a aposta do antigo gestor em seu próprio filho, João Daniel, de apenas 22 anos, como técnico principal da equipe. O time venceu somente um dos oito jogos disputados, sendo eliminado logo na primeira fase.

Clube, que já foi referência no interior, conta com investimentos para se reerguer
Treino da Matonense, que trabalha para se reerguer - Iory Keller/Matonense

Apesar de influente, Galli não é o presidente do clube, cargo ocupado por Antônio Aparecido Gaspar. O empresário se uniu a advogados e empresários da cidade para formar o que chamam de “Grupo de Apoio à Matonense”.

A Predilecta, indústria de conservas alimentícias, que patrocinou o clube na década de 1990, foi uma das empresas que retornou. Há outras como a Brasilux, de tintas, a Elite e a Troféu, fornecedores de material esportivo, a Atlética, de suplementos, e a World, de comunicação visual.

“Tínhamos uma estrutura bem debilitada. Arrumamos alojamento, cozinha, banheiros, vestiários, campo. Jogamos muita coisa fora”, conta Pedro Leonardo Filho, executivo de futebol.

Para conduzir a equipe neste retorno, o clube apostou no técnico Márcio Ribeiro, que, de 2013 a 2015, liderou o Água Santa a três acessos consecutivos, feito inesperado para uma agremiação recém-fundada e até então conhecida em Diadema apenas pelos tempos de glória na várzea. Em 2018, ele colocou novamente a equipe do ABC na elite.

“Vim para cá entendendo que podemos repetir esse mesmo roteiro. Pretendo chegar até a Série A1”, explica o treinador. "Estou com 62 anos, gostaria muito de seguir no futebol até 66, 67, já deixando a Matonense no topo.”

Até a estreia na quarta divisão, que acontece neste domingo (22), contra o América-SP, às 10h, o treinador trabalha com 23 atletas no limite dos 23 anos, idade máxima permitida pela competição, e ainda aguarda por mais três reforços para fechar a lista.

Considerado um dos mais fortes e principais candidatos à conquista da divisão, o clube investe cerca de R$ 80 mil mensais com os atletas. O campeonato conta com 30 equipes, algumas delas também tradicionais, como Paulista, Rio Branco, Mogi Mirim e XV de Jaú.

Galli já recorreu a um antigo amuleto de outras épocas. Religioso, convocou um padre para realizar uma missa com os jogadores e benzer todas as camisas que serão utilizadas, além dos vestiários.

Nos tempos de glória, a equipe tinha como tradição ir até Aparecida, ato cancelado pela pandemia da Covid-19. A intenção é, com o título alcançado, voltar à cidade e agradecer pelo feito.

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