Torcida organizada na Europa jamais viu sua seleção ganhar um jogo

E provavelmente não verá neste sábado (9), quando San Marino enfrenta a Polônia de Lewandowski

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São Paulo

Sempre que aparece alguém interessado em fazer parte da torcida organizada, Massimo Visemoli deixa bem claro o que ele ou ela vai encontrar.

“Se acompanhar os jogos, pode ter certeza de que verá muitos gols. Mas quase nunca será nosso”, avisa.

A brigada Mai 1 Gioia, de San Marino
A brigada Mai 1 Gioia, de San Marino - Mai 1 Gioia/Divulgação

Um exemplo disso deve acontecer neste sábado (9), às 15h45 (de Brasília). No Estádio Nacional de Varsóvia, a Polônia receberá San Marino pelas Eliminatórias para a Copa do Mundo. Se tudo acontecer dentro do normal, a equipe de Robert Lewandowski vai golear a seleção que ocupa o último lugar do ranking da Fifa.

“Esta partida veremos pela televisão. Na seguinte, vamos ao estádio”, completa Massimo, referindo-se ao confronto da próxima terça-feira (12), em casa, diante de Andorra.

Ele é o representante da torcida da pior seleção do mundo e que tem um nome apropriado: Brigata “Mai 1 Gioia” (Brigada “Nunca 1 Alegria”, em italiano). Não é original. Há times que também possuem organizadas com a mesma designação. Mas para eles, trata-se de ironia.

No caso de San Marino, não. É a realidade.

A equipe do país com a segunda menor população entre os que disputam torneios da Uefa (à frente apenas de Gibraltar) foi formada em 1990. Tem apenas uma vitória em sua história. Quando ganhou amistoso contra Liechtenstein por 1 a 0 em 2004, a sua torcida organizada ainda não havia sido criada.

Os integrantes da brigada, nascida em 2009, nunca viram sua seleção vencer um jogo. “Sempre encontramos pessoas interessadas em acompanhar as partidas, apesar de tudo. Digo sempre que qualquer um disposto a ir ao estádio vai assistir jogadores que dão tudo em campo. Jogam futebol pelos motivos certos. Nunca é por dinheiro, sempre por amor”, completa Massimo, que desempenha as funções de porta-voz da torcida e mantém as páginas nas redes sociais.

O momento que está na memória das 150 pessoas que frequentam o Estádio Olímpico de San Marino e dos 10 integrantes da brigada que estão em todos os jogos foi um empate. E como a seleção não costuma fazer gols, foi em 0 a 0.

O resultado diante da Estônia, pelas eliminatórias para a Eurocopa de 2016, foi o primeiro ponto conquistado pelo país na história da competição. Também acabou com sequência de 61 derrotas consecutivas que já durava 10 anos.

Jogadores, comissão técnica e integrantes da torcida comemoraram juntos em San Marino depois da partida.

“Aquela foi uma noite inesquecível”, relembra Massimo.

Há outros dois jogos em que a “Mai 1 Gioia” não viu San Marino perder. Terminaram também em 0 a 0: contra Liechtenstein e Gibraltar, ambos em 2020, pela quarta divisão da Liga das Nações.

De 2009 (ano de criação da torcida) até hoje, a equipe atuou 85 vezes e perdeu 82. Marcou nove gols. Dois deles neste ano, em derrotas para Kosovo (4 a 1) e Polônia (7 a 1). Sofreu 364.

“É normal o torcedor querer vitórias e quando elas não acontecem, isso se torna um problema. Não é nosso caso. Queremos incentivar até o último minuto. Não se trata de vencer. Gostamos do futebol como diversão. Todos estão contentíssimos. Nunca encontrei pessoas que reclamassem dos jogadores ou dos resultados”, diz o representante da organizada.

O elenco é composto de amadores. Há apenas três nomes que estão em divisões inferiores do futebol italiano.

Nenhum dos integrantes da brigada mora em San Marino, um enclave localizado entre as regiões de Emilia-Romagna e Marche. Todos viajam cerca de 200 km para verem as partidas no estádio próximo às muralhas da capital (também chamada de San Marino) e suas ruas de pedras.

O nome oficial da torcida é Brigata Mai 1 Gioia/Curva Giampaolo Mazza. “Curva” é o local na arquibancada em que costumam ficar. Mazza foi técnico da seleção por 15 anos.

A brigada Mai 1 Gioia, de San Marino, antes de partida da seleção
A brigada Mai 1 Gioia, de San Marino, antes de partida da seleção - Mai 1 Gioia/Divulgação

“É alguém que dedicou sua vida para o futebol samarinês. Para nós, ele é uma divindade”, explica Massimo.

Como jamais há qualquer clima de cobrança, jogadores conhecem os integrantes da brigada e conversam com eles após as derrotas ou raros empates. De brincadeira, já foram questionados sobre a possibilidade de San Marino disputar uma Copa do Mundo. Para os integrantes da organizada, uma viagem a Marte é perspectiva mais realista.

Se for para assistir futebol por causa de vitórias, veem a seleção italiana pela TV. Foi assim que testemunharam o título da Eurocopa deste ano.

“Se a Itália ganha, fico contente. Quero que vença”, confessa Massimo.

Mas e se tiver de escolher?

“Prefiro San Marino."

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