Descrição de chapéu Copa do Brasil 2021

Nikão supera vício em álcool e conduz Athletico na final contra Atlético-MG

Meia-atacante vai de chacota a peça fundamental no time paranaense e busca mais um título

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São Paulo

Quase cinco meses depois de contratar Nikão em janeiro de 2015, Mario Celso Petraglia, presidente do Athletico, telefonou para o empresário Carlos Roberto Carvalho com o propósito de devolvê-lo. Embora seja amigo do agente, Petraglia não o poupou da sua ira, demonstrada com palavrões.

Aos 22 anos, Nikão caminhava para um precoce final de carreira e estava mais interessado na boemia do que no campo.

Neste domingo (12), o meia-atacante conduz o Athletico no jogo de ida da decisão da Copa do Brasil contra o Atlético-MG, às 17h30, em Belo Horizonte. Globo e SporTV transmitem o confronto.

O convite para defender a equipe paranaense já havia sido inesperado, depois de o jovem atleta ter rodado por mais de dez clubes –entre eles Santos, Palmeiras e Atlético-MG– e deixá-los sem entregar o que dele se esperava. O apelido de "Maradona Negro", que o acompanhou na adolescência, ficou nas categorias de base. E foi ainda nessa fase que, aos 12 anos, começou a ingerir bebidas alcoólicas.

Nikão, camisa 11, é esperança do Athletico contra o Atlético-MG na decisão pela Copa do Brasil - Limara Polli - 30.set.2021/Reuters

"Minha relação com o álcool começou aos 12 anos e foi até os 22 anos. Chegou um momento em que eu jogava para sustentar o meu vício da bebida. Onde tinha bebida, eu estava junto. Bebia vodca, uísque, cerveja, vinho, champanhe", diz Nikão.

Em 2014, o Atlético-MG o cedeu gratuitamente para o modesto Linense, do interior de São Paulo, time que lutou contra o rebaixamento para a Série A-2 do Campeonato Paulista.

O desespero tomou conta de Nikão quando ele trocou Belo Horizonte pela cidade de Lins, no interior paulista. Em um apertado quarto de hotel, ele disse para Wanilton Cézar Silva, o Cezinha, que a carreira chegava ao fim.

Foi Cezinha quem descobriu Nikão em um campinho na periferia de Montes Claros, no norte de Minas Gerais.

Professor de uma escolinha de futebol na cidade, insistiu para que Carlos Roberto levasse o garoto para Mirassol, onde o empresário construiu um centro de treinamento para aperfeiçoar adolescentes e repassá-los a equipes profissionais.

Nikão trata tanto Cezinha como Carlos Roberto como "pai". O jogador teve um único contato com o pai biológico e, aos oito anos, perdeu a mãe, vítima de câncer.

Aos 16, foi a vez de ele ficar sem a avó materna, que o criou. E, aos 18, despediu-se do irmão mais velho, que não resistiu a um acidente.

Quando ainda estava viva, a avó Rita autorizou Nikão a frequentar a casa de Cezinha. Rita temia pelas más companhias e o futuro do neto, na periferia de Montes Claros.

"O Nikão vivia próximo de pessoas caminhando de forma errada, no tráfico, e comecei a ligar para o Carlos Roberto. Dizia assim: ‘Esse menino é muito acima da média, e estou com medo de ele se perder em Montes Claros’", recorda Cezinha.

A distância entre Montes Claros e Mirassol, no interior de São Paulo, é de quase 900 quilômetros. Na primeira tentativa de transferi-lo de estado, Nikão tinha 11 anos, e Carlos Roberto, que vislumbrava problemas com o Conselho Tutelar, estipulou que só receberia o menino a partir dos 14.

Com medo de perder um possível talento, Carlos Roberto comprou uma filmadora para que Cezinha coletasse imagens do garoto com a bola. O empresário gostou do que viu.

"Mandei buscá-lo, imediatamente. O Nikão chegou a Mirassol com a barriga enorme, cheia de vermes", recorda o empresário, que montou uma casa no interior paulista e escalou um casal para cuidar do garoto.

A família de Carlos Roberto, com boas condições financeiras, abraçou o menino.

"Fomos em uma festa, e um rapaz pediu que o meu funcionário aguardasse do lado de fora. Eu disse que o Nikão era meu filho, levantamos e fomos embora", diz o empresário, que exibe a camisa do Athletico com a seguinte mensagem feita pelo atleta: "Para Carlos Roberto, um abraço do filho Nikão".

Do Linense, Nikão foi para o Ceará, mas nem conseguiu concluir a Série B do Brasileiro. A cinco rodadas do término do campeonato, a diretoria rescindiu o seu contrato.

Carlos Roberto, então, procurou Petraglia, que desde as categorias de base havia demonstrado interesse no jogador. O cartola resolveu atender as súplicas do amigo. Porém pagou um preço alto. A torcida ironizou a contratação de Nikão, principalmente o seu biótipo.

No dia 14 de janeiro de 2015, Nikão posou para sua primeira foto com a camisa do Athletico pesando 92 quilos, oito a mais do que o ideal. "Tiveram que esconder a foto no site do clube", recorda Cezinha.

Em 2015, Nikão se apresenta ao Athletico com sobrepeso e vira chacota
Em 2015, Nikão se apresentou ao Athletico bastante acima do peso ideal e virou chacota entre os torcedores - Bruno Baggio/Site Athletico/Divulgação

Enquanto o elenco principal do clube paranaense embarcou para uma excursão na Espanha, o novo reforço teve que ficar em Curitiba e cumprir uma rotina de dieta e exercícios físicos. Nos primeiros dias, quis abandonar o time.

"Se quiser voltar para Mirassol, você tem a sua casa, a sua família, mas vai precisar trabalhar, talvez, como gandula, sendo que Deus te deu o dom para jogar futebol", disse Carlos Roberto.

Desinteressado pelos treinos físicos, Nikão passou a ser criticado internamente. Foi quando Petraglia pediu para Carlos Roberto buscar o jogador. O empresário, então, entrou em contato com Cezinha e implorou para que este desembarcasse em Curitiba e desse um ultimato a Nikão.

Na mesma semana, a equipe reserva do Athletico encerraria a participação no Campeonato Paranaense contra o Nacional, de Rolândia. Carlos Roberto pediu uma última chance para Petraglia, enquanto Cezinha cercava o atleta.

"O Nikão estava cansado daquela rotina de treinos, e o colocaram para jogar", conta Cezinha.

A equipe venceu o Nacional por 5 a 0, o meia marcou um gol e contribuiu com duas assistências. Terminou aquele ano de 2015 como líder de assistências do Athletico na elite do Brasileiro, competição na qual não atuava desde 2012, quando vestiu a camisa da Ponte Preta.

"Para mim, o ano de 2015 foi um ano difícil, mas, ao mesmo tempo, um ano sensacional por tudo aquilo que vivi aqui no clube. Um ano em que pude dar as respostas que todos queriam."

Na Série A de 2022, caso queira continuar no Brasil, Nikão poderá escolher qual camisa defenderá. O Palmeiras é um dos possíveis destinos, e Petraglia tenta convencê-lo da renovação.

"A história dele é muito bonita por ser de recuperação. O Nikão entrou no vício da bebida, a gente foi tentando ajudar, mas a esposa [Izabela] foi fundamental. Ela tomou conta, mostrou o caminho da igreja", afirma Carlos Roberto.

O jogador que chegou acima do peso acabou se tornando peça importante no crescimento do Athletico, campeão da Copa Sul-Americana de 2018 e da Copa do Brasil de 2019. Neste ano, o time conquistou novamente a Sul-Americana, e foi de Nikão o gol do título contra o Red Bull Bragantino.

Agora, o mineiro pretende ajudar o clube rubro-negro a conquistar sua segunda Copa do Brasil. A final começa neste domingo e terá seu jogo de volta na próxima quarta-feira ​(15), às 21h30, em Curitiba.

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