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Campeões olímpicos de boxe entram no profissionalismo 'à cubana'

Dirigentes do governo de Cuba atuarão como 'managers' dos atletas

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Eduardo Ohata
São Paulo

Campeões olímpicos, mundiais amadores e jovens em ascensão têm, pela primeira vez desde 1962, permissão do governo de Cuba para voltar a competir no circuito profissional de boxe.

A participação de cubanos no boxe profissional havia sido proibida após a implantação do regime comunista, sob o argumento de que beneficiava exclusivamente empresários e por não existir preocupação com o bem-estar dos pugilistas.

Dois dos maiores ídolos do boxe cubano, os tricampeões olímpicos Teófilo Stevenson e Félix Savon, que dominaram, respectivamente, as décadas de 70 e 90, permaneceram toda a carreira no amadorismo. No caso de Stevenson, não faltaram ofertas milionárias para que fizesse uma luta com o norte-americano campeão profissional Muhammad Ali.

O card que marca esse retorno está previsto para esta sexta (20), com transmissão para o Brasil pela ESPN4, às 22h. Estão programadas participações de cubanos campeões em Jogos Olímpicos e Mundiais amadores, como os bi olímpicos Julio Cesar la Cruz e Roniel Iglesias.

Roniel Iglesias, bicampeão olímpico, atuará em lutas profissionais - Yuri Cortez - 4.ago.16/AFP

O objetivo é que esses atletas cubanos escalem os rankings e cheguem à disputa de títulos mundiais profissionais, mas a prioridade continua sendo a participação em Olimpíadas, Mundiais amadores, Jogos Pan-Americanos, Centro-Americanos, entre outras competições disputadas sob regras olímpicas, importante para a imagem que o país projeta para o mundo.

Ou seja, Cuba tem a última palavra no que se refere à participação de seus atletas em eventos. Na prática, o governo cubano, por meio de seus dirigentes esportivos, assumirá o papel de "manager" dos atletas.

"A participação de cubanos no boxe profissional servirá como motivação às próximas gerações, beneficia economicamente o atleta e a federação cubana de boxe, que destinará sua parte do dinheiro ao desenvolvimento dos programas de boxe", explicou à Folha Gerardo Saldivar, presidente da Golden Ring. "Os boxeadores receberão 80% das bolsas, os técnicos, 15%, e a equipe médica que acompanha o time receberá 5%."

A Golden Ring é uma promotora mexicana de b oxe. Está previsto no contrato firmado com ela que Cuba será compensada financeiramente por meio de percentual sobre as "luvas" (bônus na assinatura de contratos) dos atletas, faturamento com direitos de transmissão dos eventos etc.

A possibilidade de uma compensação financeira mais robusta aos boxeadores, por meio da sua adesão ao boxe profissional, é vista como um incentivo para desmotivar novas deserções, segundo uma fonte com trânsito nos bastidores do boxe cubano ouvida pela reportagem. Segundo a mesma fonte, facilitou também a decisão dos dirigentes cubanos a aproximação, nos últimos anos, dos estilos adotados pelos pugilismos olímpico e profissional.

Saldivar afirmou que não pode revelar os valores, informação protegida por cláusula de confidencialidade.

Julio Cesar la Cruz se esquiva de golpe do brasileiro Michel Borges nos Jogos do Rio, em 2016; cubano viria a ser bicampeão olímpico - Yuri Cortez - 14.ago.16/AFP

Nas últimas décadas, dirigentes cubanos viram dezenas de boxeadores de ponta do país desertarem e irem aos Estados Unidos ou à Europa. Por causa de sua qualidade técnica, produto do sistema cubano, eles chegavam a cinturões mundiais sem que um centavo fosse revertido em favor do governo do país.

Dois desses exemplos são Erislandy Lara e Guillermo Rigondeaux, que tentaram fugir durante o Pan do Rio-2007, foram enviados de volta a Cuba, lograram êxito em desertar posteriormente e chegaram a ser campeões mundiais profissionais.

Por meio do acordo celebrado com a Golden Ring, a ilha caribenha terá direito a pelo menos "uma fatia do bolo".

A Folha entrou em contato com o porta-voz a cargo do boxe cubano, mas não obteve resposta até a conclusão deste texto.

Ao menos uma entidade, o Conselho Mundial de Boxe, não vê com bons olhos a participação dos mesmos atletas em competições amadoras e profissionais. Seu presidente, Mauricio Sulaiman, já se manifestou contra, como em entrevista ao UOL pouco antes da Rio-2016.

Em seu site, porém, a entidade publicou nota afirmando que a liberação dos atletas da ilha marca o "início histórico do renascimento do boxe profissional cubano".

Já a Associação Mundial de Boxe, por exemplo, permitiu a Hassan N'dam, que já como profissional participara da Rio-2016 (a Associação Internacional de Boxe permite a participação de profissionais em Jogos Olímpicos), pouco tempo depois entrar em seu ranking e lutar por um título mundial profissional.

Como o aval do governo de Cuba para a participação dos cubanos no circuito profissional acaba de ser dado, não está fora de cogitação que alguns boxeadores cubanos famosos poderiam abandonar de vez o amadorismo para se dedicar exclusivamente ao profissionalismo, segundo a reportagem apurou.

Ou seja, na teoria, poderiam fazer um rodízio entre os circuitos amador e profissional na parte inicial da carreira e, mais tarde, abandonando de vez o amadorismo, poderiam disputar um cinturão profissional, driblando quaisquer proibições.

No ano passado, houve um card, que serviu como evento-teste, também promovido pela Golden Ring, no qual cubanos enfrentaram profissionais, no México, mas não foram divulgados resultados oficiais. Embora fossem apontados internamente os vencedores dos combates, os duelos terminaram com o status de "exibições". "Esse evento foi importante para Cuba ver como trabalhamos e fechar o contrato", diz Saldivar. "Mas no card desta sexta serão lutas profissionais."

Há poucos anos, os boxeadores cubanos participaram, em forma de equipe denominada "Domadores de Cuba", da World Series of Boxing, extinta liga da AIB que mesclava regras amadoras e profissionais.

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