Capitães prometem protestar contra homofobia na Copa do Mundo

Atletas e Fifa discutem o que pode ser feito no conservador Qatar

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Josh Noble
Financial Times

Harry Kane e outros capitães usarão braçadeiras com tema de arco-íris na Copa do Mundo do próximo mês no Qatar, para apoiar a mensagem antidiscriminação "One Love" ("Um Amor"), que promove a diversidade e a inclusão social.

O atacante da Inglaterra disse que vai "enviar uma mensagem clara quando o mundo estiver assistindo", enquanto um país profundamente conservador do Golfo recebe o torneio mais prestigiado do futebol internacional.

A campanha para destacar questões sociais no Qatar já se mostrou divisiva. A Fifa ainda não esclareceu se as federações envolvidas serão punidas por quebrar suas regras que proíbem estritamente atos políticos em campo.

Liam Cooper, capitão do Leeds, da Inglaterra, usa braçadeira com as cores da campanha criada pela inclusão LGBT
Liam Cooper, capitão do Leeds, da Inglaterra, usa braçadeira com as cores da campanha criada pela inclusão LGBT - Molly Darlington - 23.out.22/Reuters

A disputa simboliza o desafio mais amplo enfrentado por jogadores, equipes e patrocinadores, que buscam lidar com questões como direitos humanos e condições para trabalhadores migrantes que ofuscaram a preparação para a Copa.

Em um vídeo divulgado nesta semana para marcar um mês até o pontapé inicial, o presidente da Fifa, Gianni Infantino, disse: "Quero repetir claramente: todos serão bem-vindos ao torneio, independentemente de sua origem, cultura, religião, gênero, orientação sexual ou nacionalidade".

Mas minutos depois o diretor de operações da Copa do Mundo, Colin Smith, acrescentou: "Tudo o que pedimos é que as pessoas respeitem as normas culturais do Qatar".

Com frequência, há controvérsia em torno de grandes eventos esportivos, e o foco geralmente muda quando a competição começa. Diplomatas ocidentais boicotaram os Jogos Olímpicos de Inverno em Pequim deste ano devido a preocupações com o tratamento dado pela China à população uigur em Xinjiang. A Copa do Mundo anterior foi realizada na Rússia quatro anos após a anexação da Crimeia por Moscou.

Mas o nível de atenção dedicado ao Qatar é incomum. Paul Michael Brannagan, autor de "Qatar and the Fifa World Cup: Politics, Controversy, Change" ("Qatar e a Copa do Mundo da Fifa: Política, Controvérsia, Mudança"), disse que foi "indiscutivelmente o megaevento esportivo mais polêmico de todos os tempos", acrescentando que era "muito mais fácil criticar o Qatar porque é um país muito mais novo".

A enorme interrupção no calendário do futebol europeu causada pela mudança da competição mundial do verão para o inverno também causou irritação –e destacou o que muitos veem como a decisão ridícula de sediar um dos eventos esportivos de verão mais populares do mundo na pequena nação desértica.

A monarquia rica em gás foi premiada com a Copa do Mundo de 2022 no mesmo dia em que a Rússia garantiu os direitos de sediar o evento de 2018, permitindo anos de escrutínio adicional. O processo foi tão marcado por alegações de corrupção e impropriedade que derrubou muitos dos executivos mais poderosos da Fifa e provocou uma reformulação na escolha dos anfitriões da Copa.

Grupos de direitos humanos pressionaram a Fifa e o Qatar a indenizar as famílias dos trabalhadores migrantes que morreram ou sofreram ferimentos durante a construção das instalações do torneio. A medida recebeu apoio de várias federações de futebol, de legisladores franceses e americanos e de um punhado de patrocinadores da Copa do Mundo –embora a maioria não tenha dito nada sobre o assunto.

A Fifa disse que permanece em "diálogo positivo contínuo" com grupos trabalhistas e as autoridades de Doha sobre "iniciativas que beneficiarão os trabalhadores migrantes no Qatar muito depois da final da Copa do Mundo".

Quando questionado sobre um fundo de indenização, o comitê organizador do Qatar orientou o Financial Times a consultar os programas criados para lidar com lesões e mortes de trabalhadores e falta de pagamento de salários.

Ricardo Fort, consultor de negócios esportivos que administrou o patrocínio global da Coca-Cola e da Visa, disse que qualquer grande evento esportivo "dá uma grande oportunidade para a sociedade exigir mudanças em algo que não está certo". Mas, segundo ele, também cria uma "expectativa irreal de que os patrocinadores tenham algum grau de influência" sobre o que acontece. "Este absolutamente não é o caso."

O ex-jogador francês Eric Cantona e o ex-jogador alemão Philipp Lahm estão entre aqueles que se comprometeram a ficar afastados, mas o movimento de boicote não conseguiu ganhar força. Em vez disso, pequenos passos estão sendo dados para mostrar desagrado.

Várias cidades francesas, incluindo Paris e Marselha, optaram por não exibir as partidas em locais públicos durante o torneio. O prefeito de Marselha, Benoît Payan, chamou a Copa do Mundo do Qatar de "desastre humano e ambiental", o que é "incompatível com os valores que queremos ver transmitidos através do esporte".

No entanto, o Qatar já está envolvido com a capital francesa e seu principal time de futebol, o Paris Saint-Germain, que pertence ao Estado do Qatar há mais de uma década. O fundo soberano da vizinha Arábia Saudita também assumiu o controle do inglês Newcastle United no ano passado, enquanto um membro da família real de Abu Dhabi é dono do campeão inglês, Manchester City.

A Hummel, que faz o uniforme da seleção dinamarquesa, criou novas camisas com uma faixa preta, em sinal de luto. "Desejamos fazer uma declaração sobre o histórico de direitos humanos do Qatar e seu tratamento aos trabalhadores migrantes", disse a empresa.

No entanto, alguns viram isso como uma jogada de marketing inteligente de uma marca menor tentando causar impacto. "Eles não têm nada a perder e muito a ganhar protestando", disse Fort.

Muitos no futebol também apontam que há limites para o que pode ser alcançado no Qatar, especialmente quando o espetáculo da Copa do Mundo terminar, um mês depois.

"Não há muito mais que os jogadores em particular possam fazer do que falar sobre essas questões", disse o técnico da Inglaterra, Gareth Southgate. "Afinal, estamos pedindo mudanças em um país que respeitamos, que fez muito progresso, mas também não temos controle."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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