Caso de racismo contra Vinicius Junior vira incidente diplomático entre Brasil e Espanha

Lula e ministros cobram medidas duras, enquanto governo espanhol condena racismo sem propor soluções

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São Paulo

A recorrência de casos de insultos racistas contra o brasileiro Vinicius Junior, do Real Madrid, durante jogos pelo Campeonato Espanhol, abriu uma ferida na relação entre os governos do Brasil e da Espanha. O caso mais recente, ocorrido neste domingo (21), tomou ares de incidente diplomático.

Um dia após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) cobrar providências para "não permitir que o fascismo e o racismo tomem os estádios de futebol" pelo mundo, o ministro da Justiça, Flávio Dino, disse que estuda recorrer ao princípio da "extraterritorialidade", que, segundo ele, permite acionar um dispositivo da lei brasileira para casos "excepcionais" de crimes cometidos contra cidadãos do país no exterior.

O ministro afirmou, ainda, que trata-se de uma medida "extrema" e que, por ora, estaria apenas em análise. Dino reafirmou sua crença de que as autoridades espanholas vão tomar as devidas medidas sobre o caso.

Vinicius Junior aponta para torcedor, após ser alvo de ataques racistas em partida contra o Valencia - Pablo Morano - 21.mai.23/Reuters

"Esse é um remédio extremo, claro, mas pode funcionar, pode ser necessário", disse o ministro. A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, repudiou o crime e também ecoou a fala de Flávio Dino ao defender o "combate na raiz" do problema.

"Enquanto tiver sangue correndo nas minhas veias, enquanto estiver à frente desta pasta da Igualdade Racial, que o governo federal, do presidente Lula, a gente vai estar cuidando do povo brasileiro preto, seja aqui, seja fora do país, porque se tem uma coisa que assola a nossa comunidade preta é o racismo. E esse mal é um caso que a gente precisa combater na raiz", afirmou Anielle.

Mais cedo, o presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados, Paulo Alexandre Barbosa (PSDB-SP), enviou ofícios às presidentes da Câmara espanhola, Meritxell Batet, e do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, cobrando ações práticas para combater os casos de racismo.

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Barbosa teme que, em caso de inação das autoridades, os responsáveis pelas ofensas racistas passem a atacar outros representantes da comunidade brasileira na Espanha.

Conforme noticiado pela coluna Painel, a secretária no Itamaraty para a Europa e os Estados Unidos, Maria Luísa Escorel, conversou por telefone com a embaixadora da Espanha, Mar Fernández-Palacio, para transmitir a mensagem de desagrado do governo brasileiro frente a recorrência dos episódios de racismo.

Na Espanha, diante da repercussão mundial que o caso tomou, quase todos os partidos políticos, além do presidente Pedro Sánchez, vieram a público para condenar os atos e dizer que a nação não é racista. Ainda no domingo, Vinicius Junior afirmou que, "hoje, no Brasil, a Espanha é conhecida como um país de racistas".

Órgãos ligados ao governo espanhol, como o Conselho Superior de Esportes, a Secretaria de Estado para o Esporte e o Ministério da Cultura e do Esporte, divulgaram comunicado repudiando a violência.

O texto foi endossado por Pedro Sánchez no Twitter. Nem o comunicado nem o político, porém, citaram o atacante pelo nome.

O comunicado conjunto também não apresentou uma solução concreta para combater o racismo, a não ser promover, junto com a Federação Espanhola e a LaLiga (entidade que organiza o torneio nacional), uma campanha de conscientização direcionada aos torcedores.

As entidades têm sido bastante criticadas, inclusive por Vinicius Junior, pela atuação no combate a atos de racismo.

O presidente da LaLiga, Javier Tebas, no entanto, não gostou da reação do atacante brasileiro após ele ter sido novamente vítima de ofensas raciais. O cartola, que está à frente da entidade desde 2013, disse que o jogador deveria "se informar adequadamente".

"Antes de criticar e insultar a LaLiga, é preciso que você se informe bem, Vini Jr. Não se deixe manipular e certifique-se de compreender plenamente as competências de cada um e o trabalho que temos feito", ele afirmou.

Além de presidir o órgão que organiza o Campeonato Espanhol, Tebas é conhecido por ser um declarado apoiador do grupo de extrema-direita da Espanha. Em 2019, ele afirmou que votaria em representantes do Vox, formado por apoiadores do ditador Francisco Franco, nas próximas eleições espanholas.

Diante da repercussão, o cartola voltou a carga e afirmou ser "injusto" chamar LaLiga de racista.

O presidente da Real Federação Espanhola, Luis Rubiales, tomou caminho diferente, e chamou Tebas de "irresponsável".

"Temos um problema de comportamento, educação e racismo no nosso país. A primeira coisa é reconhecê-lo", ele afirmou. "Quero pedir que ignorem o comportamento irresponsável do presidente de LaLiga, que entra nas redes sociais se envolvendo com um jogador que algumas horas antes havia recebido graves insultos racistas. Os gestores não estão aqui para se envolver em redes sociais, estamos aqui para resolver problemas. Não era a hora."

Ao desabafar nas redes sociais, Vinicius Junior disse que o "racismo o normal na LaLiga". Na noite desta segunda-feira (22), o jogador subiu o tom e criticou os que emitem comunicados repudiando o racismo, mas nada fazem. "Quantos racistas tiveram nomes e fotos expostos em sites? Eu respondo para facilitar: zero."

O que falta para criminalizarem essas pessoas? E punirem esportivamente os clubes? Por que os patrocinadores não cobram a La Liga? As televisões não se incomodam de transmitir essa barbárie a cada fim de semana?

Vinicius Junior

jogador brasileiro

O brasileiro disse que é forte e vai lutar contra os racistas, mesmo que faça isso longe da Espanha. Após a declaração, o presidente do Real Madrid, Florentino Perez, teve uma reunião com o jogador para dar apoio a ele e dizer que o clube "irá até às últimas consequências face a situação repugnante de ódio".

Em nota, o Real informou, ainda, que "dada a gravidade dos fatos ocorridos, recorreu à Procuradoria-Geral do Estado, sem prejuízo de seu caráter de ação penal privada", por entender que as agressões sofridas por Vinícius configuram crime de ódio.

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