"Foi mais vergonhoso do que a final da Copa de 50." Foi assim que o aposentado Gabriel Ferreira da Silva, 89, descreveu a goleada que o Brasil levou da Alemanha.

Ele, que testemunhou o Maracanazo, em 1950, quando o Brasil perdeu do Uruguai, assistia ao jogo ao lado de sua mulher, Marylia Borba da Silva, 82, e dizia não acreditar a cada vez que o goleiro Júlio César ia buscar a bola no fundo da rede.

"Falaram tanto do Barbosa [goleiro brasileiro na derrota de 50], que levou dois, e esse aí [Júlio César] levou sete", lamentava nesta terça (8).

Gabriel e Marylia se conheceram nas arquibancadas do Maracanã na final da Copa de 50. Ele, com 27 anos na época, foi ao estádio com 15 amigos e já estava lá quando Marylia chegou com a família.

	Luciana Whitaker/Folhapress
	O casal Gabriel e Marylia da Silva, que se conheceu na final da Copa de 1950, no Rio

Calhou de Marylia se sentar ao lado dele e nasceu ali um amor que já dura 64 anos. Diferentemente do que acontecia com as quase 200 mil pessoas no estádio, tinham motivos para comemorar.

"Quando o jogo acabou, eu disse: tenho uma festa para ir, mas estou sem clima. Posso passar na sua casa para conversarmos de noite?". Dali a seis meses, estavam noivos e, após dois anos, casados.

A simpatia do casal permaneceu mesmo diante da derrocada brasileira na semifinal contra a Alemanha. A reportagem assistiu ao jogo na casa dos dois no Lins de Vasconcelos, zona norte do Rio.

Quando o Brasil levou o primeiro gol, Marylia lançou mão de sua superstição: foi para o fogão fazer pipoca. Quando voltou, a Alemanha já tinha marcado mais um.

Uma equipe de TV que também acompanhava o casal e duas vizinhas comiam pipoca incrédulos com os gols em sequência. A Alemanha marcou mais um e lá foi novamente Marylia ao fogão, dessa vez para fazer pipoca doce. Na volta, o marcador, implacável: 5 a 0 Alemanha. "Não acredito", disse ela.

Eles estavam chateados, mas não deprimidos. Gabriel ainda fazia piadas.

"Ai, meu coração. Eu vou jogar água no rosto para fingir que estou chorando", disse ele, brincando, para as câmeras. "Mentira, só choraria pelo Botafogo."

A Fifa deu dois ingressos para Marylia e Gabriel reviverem o dia especial em que se conheceram, numa final de Copa do Mundo. Gabriel já não parecia mais tão empolgado. "Eu tenho chance de ver a final no domingo, mas perdi a vontade. Vou torcer pra quem? Só iria torcer se fosse mesmo pelo Botafogo."