Daniela Mercury vira febre portuguesa
do enviado especial a Lisboa
"Não
há nada que se compare ao sucesso atual de Daniela
Mercury em Portugal, vá ao show e você verá",
avisa o crítico João Gobern, da revista "Visão",
que mantém um programa de música brasileira
na rádio portuguesa.
Ele tinha razão. No Pavilhão Atlântico
-uma espécie de ginásio do Ibirapuera novo em
folha, com excelente acústica e arquitetura moderna-,
a cantora baiana reuniu, na sexta-feira, dia 9, 16 mil pessoas,
mais de três vezes o público que, dois dias antes,
fora ali assistir o lendário Bob Dylan.
Adultos, famílias, jovens e crianças apertaram-se
para ver de perto a artista brasileira que Portugal premiou
com um histórico recorde de venda -mais de 270 mil
cópias do CD "Feijão com Arroz".
"Eu prefiro a Daniela ao Bob Dylan", atesta Pedro
Marques, 23, vendedor de uma loja de CDs.
Marques era um dos incontáveis jovens portugueses que
tentavam, no show, requebrar os bem comportados quadris aos
comandos de "Vamos mexer a cintura!" ou "Vamos
sair do chão, Portugal!", lançados pela
cantora.
"Eles conhecem todas as canções, fico impressionada",
diz Daniela abrindo as janelas de sua suíte, no 23º
andar do hotel Sheraton, o edifício mais alto de Lisboa.
"Eles cantam do começo ao fim, sabem detalhes
dos arranjos e das melodias", orgulha-se.
O sucesso de Daniela é, em parte, resultado de uma
conhecida e diabólica fórmula: música
e telenovela. Da mesma forma que no Brasil as trilhas das
novelas quase que fatalmente vão aos topos das paradas,
uma coisa semelhante acontece em Portugal.
Daniela começou o seu "estrondo", como dizem
por lá, com a grande audiência da novela "Renascer".
A explicação é parcial porque isso ajuda,
mas não basta. "Ela teve uma ótima estratégia
de marketing em Portugal", diz a fã Rita Souza,
21, daquelas que vão pedir autógrafos na portaria
do hotel. "Mas aqui em Portugal não tem jabá",
sublinha Daniela. "Meu sucesso não é por
acaso, é resultado de um trabalho sério que
venho fazendo há anos na Europa."
De fato, a aeróbica baiana é um nome bastante
conhecido no Velho Continente, provavelmente (não há
números fechados) a maior vendedora, hoje, de música
brasileira no exterior.
Em Portugal, Daniela foi contemplada com uma capa da revista
"Visão", ligada ao Grupo Abril, o mesmo da
semanal "Veja", da qual ela guarda uma mágoa.
"Eles iam fazer uma capa comigo e acabaram trocando pela
Madonna. Será que a Madonna vende mais disco no Brasil
do que eu? Será que vende mais revista?"
Daniela está em lua-de-mel com os portugueses. Vive
um daqueles momentos únicos, quando um artista transforma-se
em mania nacional. "Ela já chegou a reunir 30
mil pessoas num estádio de futebol", diz Paulo
Bismark, 33, da produtora Remédio Santo, que trabalha
com a cantora em Portugal. "Nunca vi nada igual em termos
de música brasileira."
Por que então, na pesquisa feita pelo Datafolha, Fafá
de Belém é citada à frente da artista
baiana? "A Fafá tornou-se quase portuguesa, ela
morou aqui, fez campanha para o Mário Soares, tem uma
imagem mais antiga e enraizada", explica Bismark.
É a mesma explicação de João Gobern,
que vê em Daniela (e nos grupos de axé e pagode)
o maior fenômeno de mercado da música brasileira
em Portugal. "Muitos são conhecidos e cultuados,
como Chico Buarque, Caetano Veloso, Milton Nascimento e Gilberto
Gil, mas uma música que fosse capaz de atravessar todas
as classes com tanto sucesso, eu nunca vi."
Gobern diz que o estouro de Daniela e do axé acabou
suplantando a própria música para dançar
anglo-americana. "Os DJs se viram obrigados a colocar
música brasileira nas discotecas. No meu tempo de jovem,
a única que tocava -e de vez em quando- era "Lança
Perfume", da Rita Lee."
Para Daniela, seu sucesso é uma comprovação
de que está em curso "uma nova aproximação,
definitiva, entre os dois países". Ela vê
Portugal como uma espécie de "continuidade"
do Brasil na Europa. "Eles sabem que somos parte deles,
e o fato de que tenham descoberto o Brasil os fortalece e
engrandece", afirma. (MAG)
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