"No final do mês de julho, chegamos a Lisboa"

A volta

Das naus que voltaram a Lisboa
Atingimos o cabo da Boa Esperança na Páscoa florida (14) e, com bom tempo, atravessamos o dito cabo e viemos dar na primeira terra próxima a Cabo Verde, Beseguiche (15). Aí encontramos três pequenos navios enviados pelo rei de Portugal para descobrir a nova terra (16) e uma nau da nossa armada, que desaparecera quando rumávamos para Calicute. Ficamos a saber que essa nau navegou até a boca do estreito de Meca, detendo-se numa cidade, onde perdeu um batel com quase toda a sua tripulação. Restaram a bordo somente seis homens que, doentes e sem nada para beber, senão a água recolhida da chuva, trouxeram a embarcação até aqui.

No final do mês de julho, chegamos a Lisboa. Um dia depois, entraram no porto a nau que perdêramos quando voltávamos e a caravela capitaneada por Sancho de Tovar, que havia estado em Sofala. Tovar informou que Sofala é uma pequena ilha, situada na embocadura de um rio e habitada por mouros. Há ouro no lugar, ouro que um povo que não é mouro traz das montanhas e troca por mercadorias. Sancho de Tovar encontrou, ao chegar a esse lugar, muitas naus mouras e tomou um mouro como refém, pois enviara à terra um cristão árabe. Tovar esperou por dois ou três dias, mas, como o cristão não voltava, resolveu partir, deixando em terra o cristão e levando consigo o mouro. Desse modo, da armada que partiu para Calicute, seis naus retornaram e as outras todas se perderam.


Dos pesos e das moedas que usam (17)
Este é o preço das especiarias e drogas em Calicute, bem como o sistema de pesos e moedas do lugar.

Um bacar de noz-moscada, que pesa quatro quintais (18), vale 450 favos; 20 favos correspondem a 1 ducado.
Um bacar de canela vale 390 favos.
Uma faracola de gengibre seco vale seis favos; 20 faracolas fazem 1 bacar.
Uma faracola de gengibre em conserva de açúcar vale 28 favos.
Um bacar de tamarindo vale 30 favos.
Um bacar de zerumbete (19) vale 40 favos.
Um bacar de zedoária (20) vale 30 favos.
Um bacar de laca vale 260 favos.
Um bacar de maças (21) vale 430 favos.
Um bacar de pimenta vale 360 favos.
Um bacar de pimenta comprida vale 400 favos.
Um bacar de mirabólano "dal sebuli" em conserva vale 560 favos.
Um bacar de sândalo vermelho vale 80 favos.
Um bacar de pau-brasil vale 160 favos.
Uma faracola de cânfora vale 160 favos.
Uma faracola de incenso vale cinco favos.
Uma faracola de benjoim vale seis favos.
Uma faracola de cássia fístula vale dois favos.
Um bacar de cravo vale 600 favos.
Um bacar de sândalo branco vale 700 favos.
Uma faracola de madeira de aloés (22) vale 400 favos.
Uma faracola de ruibarbo (23) vale 400 favos.
Uma faracola de ópio vale 400 favos
Uma faracola de espicanardo vale 800 favos.
Um peso de almíscar vale 400 favos.
Um mitricale de âmbar (uma onça corresponde a seis mitricales e um quarto) vale 2 favos. Um bacar pesa 20 faracolas, e uma faracola, 24 e três quartos do arrátel (24) de Portugal, sendo que 24 arráteis correspondem, em Veneza, a 32 ou 33 libras, conforme o costume. O ducado vale 20 favos.

Esses são, normalmente, os preços das mercadorias que se levam daqui para Calicute.

Uma faracola de cobre vale 45 favos.
Uma faracola de chumbo vale 18 favos.
Uma faracola de prata vale 54 favos.
Uma faracola de pedra-ume vale 20 favos.
Uma faracola de coral branco vale mil favos.
Uma faracola de coral ramado vale 700 favos.
Uma faracola de coral bastardo vale 300 favos.
Um ameno, outra medida de peso de Calicute, corresponde a 2,5 arráteis portugueses e a cerca de 3 libras e um oitavo de Veneza. Com essa medida pesam o açafrão, que vale 80 favos.

Dos lugares de onde vêm as especiarias

Faz-se abaixo menção aos lugares de onde vêm as especiarias encontradas em Calicute.

A pimenta vem de uma terra chamada Cranganor, situada na costa, a 50 léguas além de Calicute.
A canela vem do Ceilão, a 260 léguas além de Calicute. Não se encontra essa especiaria em outro lugar.
O cravo vem das ilhas Molucas, a 740 léguas além de Calicute.
O gengibre cresce em Calicute, mas um pouco vem de Cananor, 12 léguas distante daquela cidade.
A noz-moscada e a maça vêm das ilhas Molucas, a 740 léguas além de Calicute.
O almíscar vem de uma terra de nome Pegu, a 500 léguas além de Calicute.
As pérolas grandes vêm de Ormuz, cerca de 700 léguas aquém de Calicute.
O espicanardo e o mirabólano vêm de Cambaia, aquém de Calicute 600 léguas.
A cássia fístula nasce em Calicute.
O incenso é encontrado a 800 léguas aquém de Calicute.
A mirra nasce em Fartak, aquém de Calicute 700 léguas.
A madeira de aloés, o ruibarbo, a cânfora e a galanga (25) vêm da China, 2.000 léguas além de Calicute.
O zerumbete nasce em Calicute.
A canela maior vem de Cananor, 12 léguas aquém de Calicute.
A pimenta comprida nasce na Sumatra.
O benjoim vem do Sião, 700 léguas além de Calicute.
O tamarindo nasce em Calicute.
A zedoária nasce em Calicute.
A laca vem de uma terra chamada Samatore, 400 léguas além de Calicute
O pau-brasil vem de Tanasserim, 500 léguas além de Calicute.
O ópio vem de Aden, 700 léguas aquém de Calicute.
Os pesos e o dinheiro utilizados em Calicute o são também nos locais de onde vêm as especiarias.

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