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O
SUPERPADRE
A
voz do trovão
da enviada especial a Portugal
Aos
33 anos, em 1641, Antônio Vieira voltou a Portugal, numa comissão
que levava o apoio da colônia ao novo soberano, d. João
4º. O brilho do autor do "Sermão da Sexagésima"
conquistou o rei, que o escolheu para pregador régio e embaixador
político.
Era a época das guerras da Restauração, que
Portugal teve de sustentar contra os espanhóis para restaurar
a independência de seu território continental, e contra
os holandeses, para recuperar as colônias da África
Ocidental (Angola e São Tomé e Príncipe) e
parte do Nordeste do Brasil.
Designado pelo rei, em 1643, para negociar junto à França
e à Holanda a reconquista das colônias, Vieira propôs
primeiro conciliar Portugal e Holanda contra os interesses britânicos,
entregando aos holandeses a província de Pernambuco como
indenização.
À proposta mal aceita, juntou-se outra, ainda mais esdrúxula
para a conjuntura religiosa de então. O padre propôs
regressarem a Portugal os judeus mercadores que andavam por diversas
partes da Europa, os chamados cristãos-novos, com a garantia
de não serem molestados pela Inquisição, de
modo que pudessem colocar sua riqueza a serviço da arrasada
economia do Reino.
O dinheiro dos judeus serviria também, no plano do jesuíta,
para consolidar uma Companhia de Comércio do Brasil, à
semelhança das companhias holandesas, com o objetivo de defender
a navegação entre metrópole e colônia
e valorizar a economia brasileira.
A aproximação de Vieira com os judeus valeu-lhe a
acusação de herege pelo Santo Ofício. As idéias
do padre chocaram-se com a doutrina e as atribuições
da Inquisição, que só não tratou de
condená-lo de imediato por ser ele um protegido do rei.
Fracassado seu esforço diplomático, voltou para o
Brasil, estabelecendo-se no norte (Maranhão e Pará),
defendendo os índios até 1661, de onde saiu meio banido
pelos senhores de escravos.
Decidiu partir novamente para Lisboa, onde, tendo já morrido
d. João 4º, Vieira não escapou da Inquisição.
O Santo Ofício condenou-o como herege por seu envolvimento
com os judeus e também por suspeitas contra as idéias
contidas em manuscritos -que constituiriam suas obras "heréticas"-,
especialmente "Quinto Império", "História
do Futuro" e "Chave dos Profetas".
Os três textos encerram as frustradas profecias de Vieira
quanto à consolidação de Portugal como o Império
do mundo católico, centrado no rei, na nobreza e no clero
-em outras palavras, na interpretação fantasiosa dos
textos bíblicos em função do sebastianismo
popular, da crença na volta do mito de d. Sebastião
(1554-1578), rei de Portugal que desapareceu na África, numa
batalha contra os árabes.
Antônio Vieira ficou cerca de dois anos (1665-1667) preso
nos cárceres da Inquisição de Coimbra. Em 1669,
anistiado, foi para Roma, onde passou seis anos sob a proteção
da rainha Cristina da Suécia. Servindo-se do apoio de poderosos,
renovou a luta contra o Santo Ofício, cuja atuação
considerava nefasta para o equilíbrio da sociedade portuguesa.
Em 1681 voltou ao Brasil, depois de mais de dez anos pela Europa.
Passou os últimos anos de sua vida na Bahia, dedicado à
revisão de seus sermões e cartas e à redação
de a "Chave dos Profetas". Assistiu ainda à publicação
do primeiro volume dos "Sermões". Morreu aos 89
anos.
Conta-se que, em 1720, ao ser exumado seu cadáver, a parte
côncava do crânio era semeada de partículas semelhantes
a metal, que reluziam ao contato da luz solar. Era a cabeça
do superpadre, o raio, o trovão que abalou o mundo luso-brasileiro
do século 17, como ele mesmo disse, no "Sermão
da Sexagésima", que devia ser o papel do pregador:
"E todos com tal valentia no dizer que cada palavra era um
trovão, cada cláusula um raio, e cada razão
um triunfo. (...) Assim há de ser a voz do pregador: -um
trovão do céu, que assombre e faça tremer o
mundo".
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mais: Vieira
no original
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