A didática conspiratória

do enviado especial

Um brasileiro de 20, um de 40 e outro de 60 anos quase certamente têm opiniões bem diversas sobre a Guerra do Paraguai. O motivo é aquilo que foi ensinado a eles nas escolas.
O de 60 anos se lembrará do sanguinário Solano López, e de que os brasileiros nada demais fizeram em responder a uma agressão.

Afinal, o primeiro ato da guerra, em novembro de 1864, foi a tomada pelo Paraguai do navio a vapor brasileiro Marquês de Olinda em Assunção. O brasileiro de 60 anos poderá também ter opiniões variáveis sobre o Duque de Caxias. Apesar de apresentado a ele como herói, "caxias", como diz o dicionário "Aurélio", também é sinônimo de "pessoa extremamente escrupulosa no cumprimento de suas obrigações".

Já o brasileiro de 20 anos acha que "os ingleses instigaram o conflito", como se lê no livro didático "História do Brasil - 2º Grau", de Antônio Pedro (Ed. FTD).

Esse pós-adolescente aprendeu que "até crianças que lutavam contra os brasileiros foram exterminadas", conforme Osvaldo Rodrigues de Souza, em "História do Brasil - Vol. 2", da Editora Ática (curiosamente, ninguém pára para pensar que quem mandou as crianças lutarem em primeiro lugar foi López, e que, como todo brasileiro sabe, uma arma de fogo nas mãos de um adolescente mata tanto quanto nas mãos de um adulto).

Já o brasileiro de 40 anos pode ter qualquer dessas visões, ou híbrida, pois faz 20 anos que houve o maior impacto das teses revisionistas. E é essa a geração de historiadores que está agora revisando o revisionismo.

"Uma professora chegou para mim com ar sincero, em Ribeirão Preto, e me disse que sentia vergonha de ser brasileira depois de ter lido o livro de Chiavenatto", diz o historiador Marco Antonio Villa, da Universidade Federal de São Carlos. "Eu tive a mesma sensação 20 anos atrás", diz ele.

A última edição do livro de Julio José Chiavenatto alardeia na capa: "O livro que mudou a história oficial". A idéia conspiratória da história que Chiavenatto professa se espalhou como um incêndio pelos livros didáticos.

Mas já há sinais de mudança. O livro "Viagem Pela História do Brasil", de Jorge Caldeira (Ed. Companhia das Letras), também um best seller, não engoliu a tese de que o Reino Unido era "o quarto aliado". (RBN)

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