Índios, que vivem em Mato Grosso, instalam em Juquitiba (cidade da Grande SP) casa para receber interessados em conhecer a vida do grupo

(2/4/2000)

Xavantes abrem “embaixada”
em São Paulo

ROGÉRIO EDUARDO ALVES
enviado especial a Juquitiba

Tradicionais habitantes de Mato Grosso, os índios xavantes acabam de construir uma casa típica de sua cultura a 70 km de São Paulo, no município de Juquitiba.

Originários da aldeia Pimentel Barbosa, eles montaram, no sítio São Benedito, a “ri”, uma casa xavante. O objetivo é apresentar a cultura indígena a visitantes que pagam para passar o fim-de-semana numa aldeia.

É uma espécie de “embaixada xavante”, define o sociólogo Laymert Garcia dos Santos, professor livre-docente do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). “Por ser um povo muito guerreiro, uma das maneiras de defender o território, após anos de guerra com os fazendeiros, é a difusão cultural”, diz.

Faz parte dessa estratégia o espetáculo “Rito de Passagem”, um resumo de vários rituais, a ser apresentado em São Paulo e no Rio de Janeiro.

No videodocumentário “A’uwê Uptabi - O Povo Verdadeiro”, um velho índio lembra como foi o primeiro contato pacífico com os brancos, nos anos 40: “Vieram com hipocrisia e presentes para enfeitar o povo. Pensamos que fosse um ato de amizade sincera, uma forma de aproximação. Aceitamos os presentes”.

Os xavantes integram a família linguística jê e são hoje cerca de 10 mil, vivendo em 55 aldeias, distribuídas em sete reservas: São Marcos, Sangradouro, Parabubure, Couto Magalhães, Areões, Rio das Mortes e Culuene. Dentre os grupos indígenas, são o sexto mais populoso. Ficam atrás dos guaranis (41 mil), caingangues (22 mil), ticunas (21 mil), terenas (19 mil) e guajajaras (13 mil).
Para visitar o sítio, que já era utilizado para caminhadas ecológicas, os visitantes precisam agendar a ida com antecedência. A propriedade tem 15 alqueires, cerca de 363 mil m<ht>2<ns>, 80% cobertos pela mata atlântica.

“Ninguém respeita o que não conhece, precisamos dizer quem são os xavantes”, diz Ângela Pappiani, uma das coordenadoras do projeto Warã, nome da iniciativa dos xavantes e que significa o círculo em que se reúnem os homens, ao nascer e ao pôr-do-sol, para discutir assuntos da aldeia.

Durante o período de convivência, os visitantes (até 30) dormem na “ri”. A casa xavante tem 10 m de diâmetro e 8 m de altura. Na aldeia em Mato Grosso, uma habitação dessas serve a uma família.
O material da construção precisou ser adaptado em solo paulista. Toda a cobertura da casa foi feita com fibras de sisal, no lugar do babaçu, normalmente utilizado nas construções xavantes, mas não encontrado em São Paulo.

No interior da “ri”, os visitantes acomodam-se em esteiras de buriti espalhadas por todo o perímetro da casa. No centro, ficam o fogo e o índio mais velho.

Na aldeia Pimentel Barbosa, chamada pelos xavantes de Etenhiritipá, vivem cerca de 400 pessoas, em 25 casas dispostas em semicírculo, em torno do “warã”, voltadas para o rio das Mortes e para a serra do Roncador.

Em Juquitiba, o grupo canta e dança, antes do nascer do sol, ao redor da fogueira, com dois ou três índios vindos especialmente para o fim-de-semana.

Segundo Siridiwê Xavante, um dos coordenadores do projeto, o lago que fica ao lado da casa fornecerá peixes para a alimentação. Na pescaria, os xavantes prometem utilizar arco e flecha.

Além do peixe, o cardápio dos visitantes inclui alimentos à base de abóbora, mandioca, milho e batata. O único mantimento não indígena é o arroz branco.

Fazem parte do programa, ainda, a pintura com urucum e carvão sobre o corpo e caminhadas educativas pelas trilhas do sítio. Há programações de atividades diferentes de acordo com a faixa etária do grupo. O didatismo xavante prevê também a apresentação comparativa de objetos de diversos grupos indígenas. Segundo Siridiwê, isso serve para mostrar que não há um “índio” genérico, mas povos de culturas diferentes.


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