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Morre o pianista Michel Petrucciani

AJB 06/01/99 20h28
Do Rio

O pianista Michel Petrucciani, 36 anos, morreu nesta quarta (6) no hospital Beth Israel, de Nova Iorque, vitimado por uma infecção pulmonar fulminante. Com menos de um metro de altura e pesando apenas 20 quilos em virtude de uma doença degenerativa conhecida como osteogenesis imperfeita (popularmente chamada ossos de vidro), o pequeno Petrucciani venceu todas as dificuldades causadas pela enfermidade - tinha que ser carregado até o palco e seu piano era especial para permitir que alcançasse os pedais - e se tornou um dos maiores pianistas do panorama mundial do jazz contemporâneo. Dono de um estilo único, ao mesmo tempo intimista, lírico e impetuoso, Petrucciani foi um dos raros músicos europeus de jazz que fez sucesso nos Estados Unidos e no Canadá. Ele tocou com todos os grandes nomes do jazz atual e esteve uma vez no Brasil, em 1987, se apresentando no Free Jazz.

Menino prodígio, nasceu em Orange, no sul da França, em 28 de dezembro de 1962, mas cresceu em Montelimar, no âmbito de um família de músicos. O pai e o irmão mais velho são guitarristas e o mais novo toca contrabaixo. Começou aos quatro anos tocando bateria, mas logo se apaixonou pelo piano ao ver um especial sobre Duke Ellington na televisão francesa. Gostava de contar que pediu aos pais um piano igual ao de Ellington, mas ganhou um de brinquedo. Teve um ataque de raiva e destruiu o presente. Tanto insistiu que acabou vencendo e ganhou um velho piano encontrado abandonado nas instalações de uma antiga base militar. O som era horroroso, mas nele Petrucciani descobriu sua vocação.

Aos sete anos, ao se apresentar em clubes imitando perfeitamente o estilo de pianistas famosos como Bill Evans, Art Tatum, Keith Jarret e Oscar Peterson, começou a atrair a atenção dos apaixonados pelo jazz. O sul da França acabou ficando pequeno para o tamanho de seu talento e decidiu então ir para Paris. Em 1978 gravou seu primeiro disco, Flash. Seu segundo disco, chamado Darn that dream, foi um grande sucesso. Participaram seus irmão Philippe (guitarra) e Louis (contrabaixo). Neste disco, Petrucciani gravou pela primeira vez uma música brasileira, Corcovado, de Tom Jobim. Foi o início de uma grande paixão.

Os três discos seguintes, gravados para a Owl, consolidaram sua fama: Michel Petrucciani trio (com Aldo Romano e J.F. Jenny Clark), Oracles destiny (solo) e Toot sweet (com Lee Konitz). Durante uma turnê pela Califórnia, em 1981, encontrou o sax-tenor Charles Lloyd, então aposentado. Petrucciani conseguiu convencê-lo a voltar a ativa. Os dois fizeram uma apresentação consagradora no Festival de Montreux de 82 (foi gravado um disco). Neste ano, Petrucciani ganhou o prêmio Django Reinhardt de melhor músico do ano na França. 83 foi o ano em que conquistou definitivamente o público e abriu seu espaço no mercado americano. Gravou um disco ao vivo no lendário Village Vanguard, em Nova Iorque, começou a percorrer regularmente o circuito dos festivais internacionais e manteve uma produtiva relação de trabalho com o baixista Charles Haden, o trompetista Freddie Hubbard e o guitarrista Jim Hall. Sua apresentação no Festival de Montreux de 86 resultou num disco antológico, talvez o melhor de sua carreira, Power of tree. Em dezembro do ano passado, a EMI lançou no mercado americano sete discos que Petrucciani gravou entre 86 e 94 para o famoso selo Blue Note.

Gostava de se vestir com roupas espalhafatosas. Sua ruidosa gargalhada era famosa entre o pessoal do jazz. Tocava com estivesse em transe e costumava afirmar que "é preciso ser forte para fazer com que o piano se sinta pequeno. Conseguir isto exige muito trabalho". Muitos definem seu estilo como "romântico com músculos". A música brasileira foi parte importante na arte de Petrucciani. Foi através da pianista Tania Maria, mulher de Eric Kresmann, empresário de Petrucciani, que ele conheceu músicos brasileiros como Milton Nascimento, Laurindo de Almeida (com quem tocou), João Gilberto, Johnny Alf e Hermeto Pascoal. Ficou encantado quando ouviu Elis Regina e para homenageá-la compôs Regina.

Petrucciani achava que o jazz atual está vivendo uma crise de identidade e que ainda não encontrou totalmente seu espaço. Já o bebop é um estilo clássico de música e que deveria ser considerado como uma obra de arte, "como um quadro de Van Gogh ou de Picasso". O grande sonho que o pequeno Michel não conseguiu realizar foi criar uma escola internacional de jazz na França.




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