Major chefiou ação na favela do Rio

Três dos policiais presos ganharam gratificação 'faroeste'

Agência Folha/AJB 08/04/97 21h58
Do Rio de Janeiro e de São Paulo

Violencia Três dos seis policiais militares flagrados em filmagem espancando favelados de Cidade de Deus (zona oeste do Rio de Janeiro) receberam do governo estadual, em 1996, o aumento salarial conhecido no Rio como gratificação "faroeste".

Oficialmente, a gratificação "faroeste" é dada a PMs que tenham praticado atos considerados de bravura pelo comando da corporação. Na maioria das vezes, o policial premiado participou de ações que resultaram na morte de supostos criminosos.

Reprodução/Folha Imagem
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Reprodução de cena de violência policial transmitida pela Rede Globo na segunda
Os seis PMs estão presos desde segunda-feira, entre eles o major Álvaro Rodrigues Garcia, chefe da ação na favela. Os outros presos são o sargento João Carlos Barbosa, os cabos Geraldo Antônio Pereira e Sérgio Ricardo Paiva e os soldados Aldair Ferreira Menezes e Marco Aurélio da Silva.

O major e os cabos foram premiados com a gratificação "faroeste", que aumenta os salários em até 150%. Segundo o comandante do 18º BPM, tenente-coronel Maurício Ghedini, a premiação se deveu "ao conjunto de bons serviços prestados à sociedade e à corporação".

O secretário de Estado de Segurança Pública do Rio de Janeiro, general Nilton Cerqueira, disse nesta terça-feira que o diretor no Brasil da Human Rights Watch/Americas, James Cavallaro, é um "alienígena" e não tem representatividade para falar da polícia do país. Cerqueira criticou o teor do relatório produzido pela ONG (organização não-governamental), que tem sede nos Estados Unidos e apontou números da violência de policiais de sete capitais brasileiras. O relatório foi divulgado nesta terça.

Em reunião na tarde desta terça no 18º BPM (Batalhão de Polícia Militar), o governador Marcello Alencar (PSDB) disse ao secretário estadual de Segurança Pública, general da reserva Nilton Cerqueira, e ao comandante da PM, coronel Dorasil Corval, que quer os agressores expulsos do funcionalismo público estadual.

"Vou mandar estudar a expulsão desonrosa de todos os envolvidos. Vão sair sem a farda militar, destituídos dos distintivos e das honrarias que tenham recebido antes, e pagar por esses crimes", disse Alencar, em cerimônia oficial na cidade de Resende. A baixa desonrosa é uma cerimônia em que o policial, além de ser expulso da corporação, sofre um processo de humilhação pública.

A expulsão do sargento, dos cabos e dos soldados é considerada questão de dias na corporação. Os cinco serão submetidos ao Conselho Disciplinar da PM, que tem até 30 dias para apresentar parecer favorável ou não à expulsão.

O governador quer que o conselho decida pela expulsão antes do prazo regulamentar. A questão do major é diferente. Por ser oficial, ele será submetido ao Conselho de Justificação da PM. Se o conselho considerar o major merecedor de expulsão, o caso vai à apreciação da Justiça Comum, em ação penal no TJ (Tribunal de Justiça) do Rio.

Na noite do dia 23 de março, os seis PMs deixaram o 18º BPM para uma incursão de rotina na Cidade de Deus. Conforme mostrou o "Jornal Nacional" (noticiário da Rede Globo) de segunda-feira, pelo menos 11 moradores da favela foram espancados pelos PMs durante a operação. As imagens foram filmadas por um morador da localidade.

Após a reunião, o governador decidiu manter no cargo o comandante do 18º BPM, que estava ameaçado de demissão. Segundo Alencar, Ghedini não sabia que as agressões tinham ocorrido.

O major envolvido nos espancamentos ingressou na PM em 1982. Sua ficha não apresenta maus antecedentes, afirmou o governador.

O comandante da PM disse que as fichas dos demais também não registra transgressões graves. Todos eram policiais experientes. O mais novo está na PM há oito anos. "Não tinha nenhum novato. Todos sabiam o que estavam fazendo", disse Corval.

Segundo o governador, em depoimento à Corregedoria da PM todos os seis PMs confessaram participação nas agressões.

O juiz Marcius Ferreira, da Auditoria Militar, decretou nesta terça a prisão preventiva dos seis PMs por 30 dias. Eles ficarão presos em quartéis diferentes, determinou o governador.

Estado de SP vai
indenizar vítimas de Diadema

As vítimas da violência policial na favela Naval, em Diadema (SP), serão indenizadas pelo governo do Estado. É o que prevê um decreto assinado nesta segunda-feira pelo governador Mário Covas (PSDB). Uma comissão vai definir em dez dias (a partir da indicação dos membros) os critérios para o pagamento das indenizações. No decreto, Covas afirma que a Secretaria da Fazenda vai cobrar ressarcimento dos autores dos crimes assim que eles forem condenados pela Justiça.

A partir das imagens gravadas e exibidas pela TV, seis pessoas já foram identificadas como vítimas da violência policial: Roberto Sanches, Antonio Carlos Dias e Cristiano Kobenik Caires (abuso de autoridade); Sílvio Calixto Lemos e Jefferson Sanches Caputi (abuso de autoridade e tentativa de homicídio) e Mário José Josino (homicídio). Outras seis pessoas, também vítimas dos policiais (casos de abuso de autoridade e extorsão), não foram identificadas.

O secretário estadual da Segurança Pública de São Paulo, José Afonso da Silva, afirmou nesta terça-feira, durante depoimento à CPI que apura os crimes cometidos pela PM de Diadema (Grande São Paulo), que há falhas no comando intermediário da Polícia Militar paulista. Segundo ele, são falhas das pessoas que ocupam cargos de tenentes e capitães, "oficiais que estão diretamente ligados ao policiamento de rua".

Disque-abuso recebe
60 denúncias no 1º dia

Em seu primeiro dia de funcionamento, o Disque-Abuso de Autoridade -lançado na tarde desta terça pela Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Rio, com apoio da Defensoria Pública do Estado- recebeu 60 denúncias contra policiais. Os denunciantes têm à sua disposição dois números de telefone (021/533-6777 e 021/533-4946) e não precisam se identificar.

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SomOuça protestos da população de Diadema (trecho da reportagem de Lúcia Soares, de 02/04/97, da Rede Bandeirantes)
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