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A risonha versão oficial do país

Publicidade oficial tem sido, quase sempre, uma maneira de gastar rios de dinheiro com regozijo. Agora mesmo está nas telas uma risonha Regina Duarte grata à confiança que a população deposita nos serviços dos Correios. O festival de autocongratulação consumiu boa parte dos 120 milhões de reais que o governo (só a administração direta) gastou no ano passado. Tão caprichosamente minuciosa, a Constituição de 1988 proibiu o culto à sanha empreendedora de prefeitos, governadores e presidentes. Sumiram, é verdade, as placas, estandartes perenes desse gênero de idolatria. No mais, a proibição não pegou. Especialmente na televisão ainda resplandece em horário nobre o júbilo obreiro de governantes. E não apenas nos programas dos partidos, excrescência da nossa democracia cartorial.

As placas, a rigor, são bijuterias na caudalosa massa de propaganda oficial. Seria melhor que a Constituição desse a campanhas de utilidade pública o destino obrigatório dessas verbas formidáveis. Há poucos mas bons antecedentes no Brasil. A Unicef calcula que milhares de crianças brasileiras foram salvas de processos de desidratação fatais pela campanha do soro caseiro. Há muitas comparações que não deixam dúvidas sobre o que produz melhores resultados. O que é melhor: gastar 24 milhões de reais fazendo propaganda do Banespa, um banco quebrado, ou muito menos par anunciar a existência de uma Ouvidoria que acolhe queixas da população contra barbaridades policiais? É mais útil ouvir Paulo Henrique Amorim abrindo os olhos para os sintomas da tuberculose ou Raul Cortez recitando argumentos em favor da privatização da Vale do Rio Doce? Basta dar uma espiada no panorama nacional, em que pululam temas para campanhas, dar iniqüidades do trabalho infantil à contaminação de alimentos, simples questão de higiene.

As tempestades de confetes sobre obras e realizações privatizam a reputação de governantes, ao mesmo tempo em que subtraem informações que seriam mais relevantes para o público. É melhor que a imaginação das agências de publicidade seja posta a serviço da dura tarefa de lidar com um Brasil complexo. Parodiando Dario, o Dadá Maravilha, goleador histrião, que pendurou as chuteiras em 1986, o cotidiano brasileiro está cheio de dores da problemática social, mas a propaganda oficial faz de conta que estamos no país da solucionática.



  • "Veja" - 07/05/97