Para honrar dívidas cobradas na Justiça, os precatórios, os governos estaduais e municipais emitem títulos. A Constituição estabelece que os papéis só poderiam cobrir precatórios expedidos até 1988.
O governador de Santa Catarina, Paulo Afonso Vieira, e o de Alagoas, Divaldo Suruagy, usaram expedientes marotos. Em Santa Catarina, precatórios posteriores a 1988 foram a justificativa para a emissão de títulos. Em alagoas, chegou-se a falsificar documentos de dívidas com usineiros, apresentados à guisa de precatórios.
O pedido de demissão de títulos é feito pelos Estados e municípios e enviado ao Banco Central, que analisa cada caso. O BC manda ao Senado um parecer recomentando ou não a emissão. A Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, composta de 27 senadores, aprova ou rejeita o pedido e o envia ao plenário, que é a instância decisiva.
O Banco Central desaconselhou as operações de Alagoas e Santa Catarina. Mesmo assim, o Senado aprovou as duas. No caso de Santa Catarina, houve uma tramitação relâmpago: menos de uma semana entre a entrada do pedido e a autorização para a emissão.
Com a operação aprovada, o Estado ou a prefeitura emite os títulos. Depois, tem de lançá-los no mercado. Pode fazê-lo por meio de um leilção público -que nem sempre atrai compradores- ou procurar no mercado corretoras que se interessem pelos papéis. É quando os títulos passam a ser negociados no mercado financeiro.
O coordenador da dívida pública da prefeitura de São Paulo, Wagner Batista Ramos, que em algumas operações pôde escolher as corretoras, tem um contrato para atuar como consultor de uma delas -a Perfil. Um conflito de interesses criminoso.
É normal que Estados e prefeituras vendam seus títulos a um preço mais baixo do que o valor nominal do papel. É assim que os investidores ganham e os governos captam recursos.
Prefeituras e Estados vendiam seus títulos a um preço escandalosamente menor do que o valor de mercado, possibilitando lucros abusivos das corretoras. No caso de São Paulo, quando Celso Pitta era secretário das Finanças, num único dia, a prefeitura vendeu lotes de títulos por R$ 51,2 milhões para a distribuidora de valores Contrato e os recomprou a R$ 53,5 milhões.
Os lucros auferidos em operações financeiras têm de ser declarados à Receita Federal, que cobra até 43% em impostos e contribuições.
Para se esquivar do Fisco, e despistar a fiscalização do Banco Central, as corretoras que lideravam essas operações envolviam uma série de empresas fantasmas, uma repassando parte do lucro para a outra. A IBF, uma dessas empresas de fachada, lavou R$ 90 milhões de títulos de Santa Catarina, Pernambuco, Osasco, Campinas e Guarulhos. Esse dinheiro passou por contas frias nos bancos Rural, Banestado e Maxi-Divisa.
As corretoras podem aplicar os dividendos das operações novamente no mercado financeiro ou em outras atividades econômicas no país.
Usando o laranja, as corretoras mandam o dinheiro para doleiros ou para fora do país. O Banco Central já descobriu depósitos em bancos do Paraguai, Uruguai e até dos Estados Unidos. Também descobriu uma penca de doleiros que fazia a remessa do dinheiro para o exterior por meio de Foz do Iguaçu e Ponta Porã na fronteira com o Paraguai.