Morre o senador Darcy Ribeiro, 74

Pedetista estava internado em Brasília

Agência Folha 17/02/97 22h05
De Brasília

Sergio Lima - 23.jul.96/Folha Imagem
Darcy
O senador Darcy Ribeiro
O senador Darcy Ribeiro (PDT-RJ), 74, morreu às 18h50 desta segunda-feira (17), de câncer generalizado (falência múltipla de orgãos devido a metásteses disseminadas) no hospital Sarah Kubitschek, em Brasília. Ele foi internado na quinta-feira passada, com anemia, problemas respiratórios e dores. O boletim oficial do hospital afirmou que o senador teve "uma morte tranquila e sem sofrimento".

O corpo do senador vai ser velado até as 17h desta terça no Senado e, depois, transportado para o Rio de Janeiro. Será sepultado no mausoléu dos imortais da ABL (Academia Brasileira de Letras).

Sua última aparição no plenário do Senado, em cadeira de rodas, foi no dia 4 de fevereiro, para votar na eleição que decidiu, entre os candidatos Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) e Iris Rezende (PMDB-GO), quem seria o presidente do Senado e do Congresso.

ACM foi eleito, mas o voto do senador foi para Iris Rezende. Na hora de votar, a direção do Senado mandou levar a urna até Darcy Ribeiro. Sempre bem-humorado, Darcy deixou que os fotógrafos registrassem, e, assim, revelassem o seu voto.

Pelos menos quatro propostas, votadas, ou em tramitação no Congresso, tiveram a participação ativa do senador: defendeu a lei que transforma qualquer cidadão em um doador presumível de orgãos e foi o autor da nova LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação), que tramitou por oito anos no Congresso.

Ultimamente, já na cadeira de rodas, vivia dizendo pelos corredores do Senado que esperava "a hora em que o presidente Fernando Henrique vai dizer que não privatizará a Vale do Rio Doce".

FHC chegou ao hospital às 19h40, acompanhado do ministro Paulo Renato Souza (Educação). "O Darcy tinha um talento que conheci em muito poucos, uma imaginação extraordinária. Foi um lutador. A começar, lutou contra a própria moléstia", disse o presidente.

"Perdemos o mais culto dos senadores", disse hoje o presidente do Congresso, Antonio Carlos Magalhães, quando se dirigia para o hospital. "Era uma doçura ouvi-lo, quando falava no plenário", acrescentou outro colega do Senado, Eduardo Suplicy (PT-SP).

Segundo o boletim oficial do hospital Sarah Kubitschek, a "falência múltipla de orgãos" do senador foi provocada por uma neoplasia maligna da próstata, que gerou metástases ósseas.

Na quinta, quando foi internado, estava tão enfraquecido que, depois de todos os exames, os médicos decidiram mantê-lo sob vigilância total. No sábado, num comportamento atípico, ele mandou chamar Vera Brandt, diretora administrativa da Fundação Darcy Ribeiro

Fez uma série de recomendações, como cuidar de livros, direitos autorais, e, principalmente, a sua última grande preocupação, o Projeto Caboclo.

Na madrugada desta segunda, Darcy acordou às 2h, quis fazer a barba e pediu para se vestir e estar pronto para participar do seminário sobre o Projeto Caboclo em um hotel de Brasília. Os médicos não atenderam o pedido. Às 6h foi levado para a UTI. Há 24 anos ele tirou um pulmão atingido por um câncer.

Na quarta, seria assinado um convênio na UnB (Universidade de Brasília) para construir a sede da Fundação Darcy RIbeiro no campus da universidade.

Duas vezes ministro e
assessor de quatro presidentes

Darcy Ribeiro foi duas vezes ministro -Gabinete Civil e Educação- e assessor direto de quatro presidentes da República -Juscelino Kubitschek, João Goulart, Salvador Allende (Chile) e Juan Velasco Alvarado (Peru).

Como antropólogo, historiador, cientista político, romancista e membro da Academia Brasileira de Letras teve reconhecimento internacional. Recebeu oito títulos de doutor ''honoris causa'', incluindo um da Sorbonne, e teve obras traduzidas nos principais países do mundo.

Em 1982, foi eleito vice-governador do Rio, em chapa encabeçada por Leonel Brizola. Em 1990, assumiu uma vaga no Senado, sempre pelo PDT-RJ. Foi candidato derrotado a governador em 1986 e a vice-presidente em 1994, outra vez em dupla com Brizola.

Darcy Ribeiro nasceu em Montes Claros (MG) em 26 de novembro de 1922. Em 1939, mudou-se para Belo Horizonte, onde ingressou na Faculdade de Medicina. Abandonou o curso três anos depois e se transferiu para São Paulo, onde passou a estudar ciências sociais. Formou-se em 1946. No ano seguinte, ingressou no Serviço de Proteção ao Índio (SPI), onde passou a trabalhar como etnólogo. Viveu cerca de dez anos junto a comunidades tribais da Amazônia.

Em dezembro de 1974, quando passava férias em Portugal, descobriu que sofria de câncer pulmonar. Exilado pelo movimento militar desde 1968, Darcy teve autorizado seu retorno ao país. ''Eles imaginavam que eu voltaria para morrer'', afirmou.

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