|
|
Sem-terra são recebidos a bala no Pontal
No confronto oito sem-terra ficaram feridos
Agência Folha 23/02/97 21h33
De Presidente Prudente e de Sumaré (SP)
Oito trabalhadores rurais sem-terra, seis deles feridos a bala, deram entrada na
tarde deste domingo no hospital regional Teodoro Sampaio, em Teodoro Sampaio
(710 km a oeste de São Paulo), região do Pontal do Paranapanema. Entre os
feridos, estava um garoto de 13 anos.
Segundo a direção do hospital, a primeira
pessoa a procurar atendimento no local, às 15h30, foi Miriam Farias Oliveira, 45.
Ela foi atingida por um tiro no lado esquerdo do peito. Os demais sem-terra foram
chegando ao hospital até as 16h30. O trabalhador Antonio Levino, que não
portava documentos, recebeu um tiro no tórax.
Levino e Miriam Oliveira, por estarem em estado considerado grave pelo hospital
regional, foram encaminhados para a Santa Casa de Presidente Prudente, hospital
mais equipado para tratar de feridos com gravidade. Eles sofreram intervenções cirúrgicas. O garoto Eder Rodrigues
Delgado, 13, foi ferido por um tiro de raspão na face estava e no final da tarde em
observação. João Maria Rodrigues, 26, que levou um tiro nas nádegas,
permanecia internado no hospital regional.
Durante o confronto entre os sem-terra e os seguranças da fazenda São
Domingos, em Sandovalina, Wesley Mauth, dirigente do MST (Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra), foi atropelado por uma Pampa, tendo sofrido
uma contusão na perna. O outro ferido não atingido por tiros foi Carlos Roberto
Silva, que quebrou a clavícula ao cair por uma ribanceira enquanto tentava fugir
dos tiros. Ele continuava internado no hospital no início da noite deste domingo.
Outros dois sem-terra foram medicados e liberados pelo hospital -Arnaldo
Francisco de Souza, 35, atingido por um tiro no lado esquerdo das nádegas, e
Jessé Gonçalves da Silva, ferido a bala no braço esquerdo.
A Polícia Civil prendeu na noite de domingo Manoel Domingos Paes Neto, 19,
filho do proprietário da fazenda São Domingos, e mais quatro seguranças da propriedade. A prisão foi feita na fazenda, em Sandovalina, no Pontal do Paranapanema.
Eles foram indiciados na delegacia de Sandovalina por tentativa de homicídio. A operação policial foi comandada pelo delegado seccional de Presidente Prudente, Odircio Canheti, e acompanhada pelos promotores Mário Coimbra e André Tufi Felício -integrantes de uma comissão nomeada pela Procuradoria do Estado para acompanhar os conflitos fundiários no Pontal.
Os seguranças detidos são Ricardo Impoleto Neto, 32, Sérgio Moreira Santos,
22, Manoel Leal Araújo, 23, Lúcio Ferreira, 58. A polícia acusa os cinco de terem atirado contra os sem-terra durante o conflito acontecido na tarde deste domingo. Às 21h, eles estavam sendo ouvidos pelo delegado Canhete na delegacia de Sandovalina.
A invasão dos sem-terra da fazenda neste domingo teve a participação dos
principais líderes do MST no Pontal do Paranapanema, incluindo José Rainha. Segundo Walter Gomes, 32, um dos líderes do MST, os sem-terra faziam um protesto contra a violência dos fazendeiros no acampamento de Taquaruçu, que fica em frente à fazenda invadida.
"Doze jagunços da fazenda resolveram nos provocar e, com colheitadeiras,
tentaram iniciar a colheita do milho que plantamos na ocupação que fizemos há três meses. Nós reagimos e tentamos impedir esta ação, quando fomos recebidos a bala", disse.
Gomes afirmou que os sem-terra consideram que o milho é seu. Por isto, quando as colheitadeiras dirigiram-se para o campo de 200 alqueires de milho, os sem-terra invadiram para bloquear a ação das máquinas. Após o conflito, os seguranças e as colheitadeiras foram embora do local. Não houve a colheita.
A fazenda São Domingos foi invadida pela primeira vez em agosto de 1995. De lá para cá, o MST manteve um acampamento ao lado da propriedade que chegou a ter mais de 1.500 famílias e voltou a invadir mais duas vezes.
Ato ecumênico pede "reforma agrária já"
O bispo-auxiliar de Campinas d. Luiz Antonio Guedes pediu neste domingo
"Reforma Agrária já" durante ato ecumênico em homenagem aos integrantes da
Marcha Nacional pela Reforma Agrária, Emprego e Justiça realizada na igreja
matriz de Nova Veneza, distrito de Sumaré (130 km a noroeste de São Paulo).
O religioso leu texto do arcebispo com críticas ao presidente Fernando Henrique
Cardoso: "Não conseguimos entender como um governo que se diz voltado para o
social deixe de tomar medidas pela reforma agrária". Neste sábado, no sétimo dia
da caminhada, os sem-terra comeram churrasco, oferecido por sindicatos e grupos
católicos da região, e descansaram. A marcha saiu dia 17 de São Paulo e deve
chegar em dois meses a Brasília. Nesta segunda, eles deixam Sumaré e seguem
para Americana (SP).
Além do bispo, participaram da celebração representantes da Central Única dos
Trabalhadores, o prefeito de Sumaré, Dirceu Dalben (PPS), e o deputado federal
José Zico (PT-SP). Durante toda o ato, os sem-terra do MST foram comparados
aos hebreus que, segundo a Bíblia, deixaram o Egito conduzidos por Moisés.
"A marcha remonta à saída do povo de Deus da escravidão do Egito em busca da
terra prometida", disse d. Guedes. "Eles vão para Brasília se encontrar com o
faraó e gritar para que ele devolva as terras griladas e roubadas", completou o
padre Nelson Ferreira, da Pastoral Rural de Campinas.
Guedes ainda afirmou que o papa João Paulo 2º "deu um puxão de orelha bem
dado" em FHC, se referindo ao recente encontro dos dois chefes de Estado no
Vaticano. "O FHC teve o displante de reclamar da atuação dos padres do Brasil a
favor da reforma agrária e ouviu, como resposta do papa, que, se ele não quer
invasões, deveria repartir a terra com justiça", afirmou.
Leia também
|