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Ataques ao jornalismo submetem democracia a estresse, diz Sérgio Dávila

Diretor de Redação da Folha lembrou que cabe ao jornal fiscalizar o poder com espírito crítico

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São Paulo

Os ataques que o jornalismo profissional tem sofrido no Brasil submetem as instituições democráticas do país a um dos mais duros testes de estresse de sua história, afirmou nesta quarta-feira (19) o jornalista Sérgio Dávila, diretor de Redação da Folha.

Ele classificou como “campanha covarde” os ataques à jornalista Patrícia Campos Mello, repórter da Folha. Na terça (18), o presidente Jair Bolsonaro insultou a repórter, ao reproduzir insinuações de natureza sexual com origem num testemunho mentiroso feito a uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito criada pelo Congresso para investigar fake news.

Sérgio Dávila discursa para auditório de arena cheio
Sérgio Dávila faz discurso de abertura do 3º Encontro Folha de Jornalismo, 99 anos, no Centro Cultural São Paulo, dando início às celebrações do centenário do jornal - Reinaldo Canato / Folhapress

Ex-funcionário de uma agência de disparos de mensagens em massa por WhatsApp, Hans River do Rio Nascimento afirmou à CPMI na semana passada que a jornalista ofereceu sexo em troca de informações para uma reportagem. No mesmo dia, a Folha publicou diálogos que ele manteve com a repórter e documentos que desmentem a versão sustentada na CPMI.

“Jornalistas profissionais, como Patrícia, as mulheres que fazem do jornalismo esta força vibrante de defesa da democracia e vigilância das instituições, elas trocam informação, sim”, disse Dávila. “Trocam por horas extenuantes de apuração em que poderiam estar com a família ou com os amigos; por viagens em que arriscam a sua vida; por sanidade física e mental.”

“Nós temos uma Redação antes de tudo com coragem, entrega, dedicação, determinação e seriedade. E as mulheres são parte fundamental dela”, acrescentou o diretor de Redação.

Ao mencionar levantamento recente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) que registrou 208 agressões físicas ou verbais dirigidas a veículos de comunicação e jornalistas no ano passado, Dávila observou que Bolsonaro foi responsável por metade dos ataques.

"Este ataque é amplificado como nunca pela câmara de eco das redes sociais e dos aplicativos de mensagens, onde gabinetes de ódio e milícias digitais dominam e não há regras nem responsabilização pelo conteúdo ali disseminado”, afirmou.

O diretor de Redação observou que o jornalismo praticado pela Folha incomodou outros presidentes antes de Bolsonaro e disse que cabe ao jornal fiscalizar o poder com espírito crítico. “Desagradando o poder constituído não por boniteza, mas por precisão, como tão bem definiu [o escritor] Guimarães Rosa, se referindo ao pulo do sapo”, disse.

Dávila lembrou frase do jornalista Otavio Frias Filho, que dirigiu a Redação da Folha até sua morte em 2018, para quem o jornal deveria representar “um farol a iluminar as fronteiras, sempre fluidas, entre o falso e o verdadeiro”, e acrescentou: “Este farol ofusca e irrita o poderoso”.

O diretor de Redação observou que a Folha chegou ao fim do ano passado como líder do mercado, resultado de um aumento significativo das assinaturas digitais, e disse que parte do crescimento foi causada por “uma campanha espontânea de pessoas que afirmaram estar assinando o jornal pela defesa da democracia, da liberdade de expressão e do fluxo livre de informações”.

Dávila disse esperar crescimento maior nos próximos anos, com atração de leitores mais jovens. “As novas gerações começam a enxergar a importância do jornal como praça pública, um ambiente aberto a opiniões diversas e contraditórias, de questionamento e dúvida saudável, diferente das certezas estridentes dos condomínios fechados de ideias preconcebidas.”

“A descoberta da Folha pelos novos leitores dá saúde financeira ao jornal. Saúde financeira é sinônimo de independência, garantida também por um leque amplo de anunciantes”, acrescentou Dávila. “Se seguir fazendo o jornalismo que defende, a Folha perseverará por mais 100 anos.”

O jornalista encerrou o discurso lendo trecho de um artigo escrito por Otavio Frias Filho em abril 1991, no governo do ex-presidente Fernando Collor, período em que a Folha chegou a ser invadida por agentes da Polícia Federal.

“Seu governo será tragado pelo turbilhão do tempo até que dele só reste uma pálida reminiscência, mas este jornal –desde que cultive seu compromisso com o direito dos leitores à verdade —continuará em pé”, escreveu Otavio.

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