É preciso combater preconceito contra idosos na mobilidade urbana

Belo Horizonte tentou restringir gratuidade no transporte coletivo para idosos

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Marcos Fontoura de Oliveira

Engenheiro civil e doutor em ciências sociais, é coautor do livro “Mobilidade Urbana em Ouro Preto” (2021). Coordenador da área de mobilidade urbana do Centro Internacional de Longevidade (ILC) no Brasil

Em 2020, logo no início da pandemia do coronavírus, importantes medidas foram tomadas em todo o mundo.

Em Belo Horizonte, juntamente com a instituição de regras para o uso de máscaras, restringiu-se por decreto um direito que as pessoas idosas já usufruíam há quase 40 anos. Em nome de protegê-las do contágio do vírus, houve tentativa de limitar a gratuidade no transporte coletivo.

mulher idosa sentada na janela de vagão de metrô em movimento
A aposentada Maria do Socorro Alves, moradora de Itaquera, no lugar reservado para idosos no metrô de São Paulo - Juca Varella - 22.jun.2011/Folhapress

Foi, sem dúvida, uma medida clássica de idadismo na mobilidade urbana, tomada sem qualquer consulta ao Conselho Municipal da Pessoa Idosa (CMI-BH) ou a especialistas no assunto. Em resposta à pressão da sociedade civil, a medida foi revogada posteriormente por decisão judicial.

Idadismo e sinônimos, como ageísmo e etarismo, são palavras relativamente novas e cada vez mais usadas. Designam o preconceito baseado na idade, que levam a diferentes formas de discriminação das pessoas idosas. Aplicado na mobilidade urbana, o idadismo é uma opressão que restringe o direito ao espaço urbano, impedindo que vivamos com plenitude.

O idadismo remete a preconceitos que conhecemos há tempos, como o racismo, sexismo, LGBTfobia. Daí a necessidade de redobrar a atenção quanto a qualquer forma de violência contra todas as pessoas, seja qual for sua idade: mulheres, negros, indígenas, pobres, pessoas com deficiência, pessoas LGBTQIA+, imigrantes.

Lembremo-nos: a ira do rei de Corinto contra Medeia deveu-se ao fato de ela não ser mais jovem, de ser mulher e ser estrangeira.

Em nossa vigília contra o idadismo, precisamos fazer valer a máxima do “nada sobre nós sem nós”. As pessoas idosas precisam dizer aos tomadores de decisão: “Nada façam decidindo por nós”.

Destaque-se uma frase do briefing para elaboração das campanhas promovidas pelo CMI-BH no último junho violeta, o mês de combate à violência contra as pessoas idosas: "Porque eu tenho direito a uma mobilidade urbana com autonomia e segurança".

As manifestações idadistas são muitas vezes dissimuladas, o que as tornam ainda mais perigosas que as declaradamente preconceituosas. Apresentam-se travestidas de soluções inteligentes e inventivas.

Não precisamos de medidas tópicas quando o assunto é mobilidade urbana. Precisamos, isso sim, de ações estruturais, além de uma melhoria radical da gestão e da operação de todos os modos de transporte público, de forma participativa e democrática.

Impõe-se a necessidade de instaurar uma cultura cidadã. Ela se dará, como ensinou Antanas Mockus, ex-prefeito de Bogotá, pela convivência como harmonização de lei, moral e cultura.

Nessas horas, o controle social promovido por conselhos de políticas públicas, organizações não governamentais, pesquisadores e jornalistas são defesa certa contra o autoritarismo.

Essas pessoas e entidades são como os furões belgas de Etterbeek na luta contra os ratos, como alertou a correspondente da Folha na Europa, Ana Estela de Sousa Pinto: “Ratos não faltam no mundo, de várias espécies, incluindo camundongos malandros e ratazanas famintas”.

SEÇÃO DISCUTE QUESTÕES DA LONGEVIDADE

A seção Como Chegar Bem aos 100 é dedicada à longevidade e integra os projetos ligados ao centenário da Folha, celebrado neste ano de 2021. A curadoria da série é do médico gerontólogo Alexandre Kalache, ex-diretor do Programa Global de Envelhecimento e Saúde da OMS (Organização Mundial da Saúde).

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