Caetano Veloso, entre outros, fez uma geração inteira refletir sobre regras, dogmas, imposições e liberdades. Ao mesmo tempo que essa geração envelhece, ainda é questionável se as pessoas têm de fato a liberdade de envelhecer ou mesmo de parecerem velhas.
Somos um dos países campeões em gastos com o mercado cosmético antienvelhecimento, que, em 2019, movimentou US$ 29,6 bilhões (R$153 bilhões), segundo dados da Euromonitor, atrás apenas dos EUA, China e Japão.
Há muitos fatores responsáveis por esse cenário, mas o principal deles não é citado pelas pesquisas: o medo de envelhecer. Apesar de todo esse investimento nessa busca inglória, uma reflexão que fica é se as pessoas estão se tornando mais felizes ou se tudo isso não está trazendo, sobretudo, angústias e sofrimentos.
Será que as marcas dos anos vividos devem ser apagadas ou preenchidas com alguma substância? Nós achamos que não! Não há nada de errado em envelhecer.
Não é, no entanto, o que se observa. As sociedades têm sido reconhecidas ao longo dos séculos pela valorização da juventude. Hoje, mais que nunca.
A disseminação de imagens nas mídias de corpos perfeitos, sem rugas e cabelos brancos, independentemente da sua idade cronológica, alimentam essa busca fútil e inatingível de parecer para sempre jovem. Não se trata de uma proibição da estética, e sim uma reflexão contra a tirania da juventude eterna. E, também, sobre a celebração do envelhecimento e a aceitação de todas as idades.
Esse debate também é marcado por questões de raça e gênero. As mulheres são as maiores vítimas do preconceito pela idade, o idadismo. Ao envelhecerem, elas deixam de ser percebidas como atraentes sexualmente e passam ao ostracismo e à desonra reservada às “bruxas”.
Sem falar nas intersecções relacionadas à cor da pele. Como disse em seu discurso "Aprendendo com os Anos 1960", a ativista, escritora e poeta norte-americana Audre Lorde: “Não temos lutas de um só tema porque não vivemos vidas monotemáticas.”
Em oposição ao que os rótulos antienvelhecimento querem vender, o envelhecimento ativo e saudável preconiza orientações e medidas de promoção da saúde, como atividade física, alimentação saudável, proteção à saúde mental, higiene do sono, moderação do consumo de álcool (ser tiver que beber) e nada de tabagismo.
No que está ligado à pele, muita exposição ao sol traz mesmo rugas e causa câncer. Portanto, nada de ficar sem protetor solar.
É claro que, em um país tão desigual, o envelhecimento não se mede pelo número de anos vividos. Envelhece-se precocemente e mal. As mazelas reveladas tão vivamente pela pandemia condenam a "serem velhos" milhões a quem são negadas as mínimas condições de chegar bem aos 50, que dirá aos 60 ou 70 anos, se é que lá chegarão.
Que bom se pudéssemos sentir a liberdade e o privilégio de estarmos vivos, envelhecendo. Caetano está hoje beirando os 80 anos. Não seria fantástico aprender a dizer também não ao não, e dizer em alta voz: É proibido proibir o envelhecimento!
SEÇÃO DISCUTE QUESTÕES DA LONGEVIDADE
A seção Como Chegar Bem aos 100 é dedicada à longevidade e integra os projetos ligados ao centenário da Folha, celebrado neste ano de 2021. A curadoria da série é do médico gerontólogo Alexandre Kalache, ex-diretor do Programa Global de Envelhecimento e Saúde da OMS (Organização Mundial da Saúde).
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