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Maisa Kairalla

Atual momento da pandemia é tragédia anunciada

Após tempos de otimismo, desigualdade na vacinação e abandono de medidas sanitárias trazem de volta medo e incerteza

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Maisa Kairalla

Médica geriatra, coordenadora da Comissão Especial Covid-19 da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) e presidente da Comissão de Imunização da SBGG.

A ideia de que erramos quando nos apressamos antes do tempo, bem como a de que erramos quando usamos da lentidão frente a uma oportunidade, é a retórica dos nossos dias do presente janeiro.

Época de medo e incertezas que nos assolam nas flutuações de esperanças e erros. Fortes eram a esperança e otimismo no final de 2021. Haviam sido trilhados com os passos firmes, na certeza do caminho seguro da imunização, pautados pela ciência. Pareciam nos mostrar uma clara e inequívoca verdade diante da expressiva queda da taxa de infecção e de casos graves entre os vacinados, principalmente após a dose de reforço.

mãos manipulam ampola e seringa de vacina
Vacinação contra a Covid-19 na UBS Santa Cecília, no centro de São Paulo (SP) - Danilo Verpa - 16.nov.2021/Folhapress

Por conta disso, nos sentimos ainda mais fragilizados frente a um novo surto de coronavírus. Atendimentos de saúde superlotados, medo de reviver o cenário sombrio de 2021. Medo do medo.

Vivemos o momento atual de uma tragédia anunciada. Sabíamos que a falta de imunização global poderia semear celeiros para a mutação do vírus. Exatamente o que aconteceu na África com a variante ômicron, uma variante que nos preocupa pela alta taxa de transmissibilidade.

O esquecimento do distanciamento social, o abandono do uso das máscaras, a desigualdade das taxas de imunização entre os povos, a descentralização da coordenação de medidas bem como a desinformação populacional, impulsionaram a aparição de variantes.

Tais erros ainda estão por corrigir. Vivemos novas incertezas com o aumento do número de casos de coronavírus, momento recheado pela contundente explosão de uma variante do vírus Influenza A —a gripe, que sempre nos amedrontou, deixando-nos sua triste marca por tantas vezes. Falta de sorte?

A soma dos nossos sentimentos de angústia e esgotamento mental pela pandemia destes dois anos é abrandada pela energia que vem da vontade de viver novamente e melhor. Pesquisadores nos contam de um alento. Sim, há um alento. Sabemos que o caminho natural de muitos patógenos, principalmente de vírus respiratórios, é sua tendência a enfraquecer.

Neste momento presenciamos a variante ômicron menos letal em um país com taxa de vacinação de quase 70%. Uma verdadeira esperança de que o vírus tenha perdido parte da sua agressividade e cause menos mortes. Teríamos um perfil futuro de doença endêmica, claro, sempre a ser respeitada e compondo o leque de possibilidades diagnósticas.

Erramos quando nos apressamos em ter a liberdade frente a uma situação tão grave, erramos quando não usamos ou tardamos o benefício do uso de uma oportunidade que, no nosso caso, sem dúvida, é a imunização. Nesta fase, a dose do reforço para o maior número possível de pessoas, a nível mundial, e que não tardemos a oportunidade de imunizar as crianças.

Estamos no caminho correto com novas vacinas e medicamentos. No entanto, sem dúvida, cabe a cada soldado entender a guerra que vivemos e blindar-se com os escudos das máscaras e do distanciamento social.

Além disso, é preciso cobrar as autoridades por melhores políticas públicas para um maior alcance de imunizados, cobrar a testagem para diagnóstico, cobrar a informação séria e assim avistar, logo ali, a abertura das fronteiras, o sorriso aberto e a certeza de que com ciência e educação venceremos também essa guerra.

Isso tudo, claro, desde que a desigualdade na cobertura vacinal entre os países não continue a servir de celeiro de novas variantes.

SÉRIE DISCUTE QUESTÕES DA LONGEVIDADE

A seção Como Chegar Bem aos 100 é dedicada à longevidade e integra os projetos ligados ao centenário da Folha, celebrado em 2021. A curadoria da série é do médico gerontólogo Alexandre Kalache, ex-diretor do Programa Global de Envelhecimento e Saúde da OMS (Organização Mundial da Saúde).

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