Descrição de chapéu sustentabilidade

Festival ODS mostra potência do Brasil em sustentabilidade se superar desafios internos

Economia de baixo carbono é factível, mas dimensão social, racial e de gênero é parte da mudança; assista ao primeiro dia do evento

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Maria Carolina Trevisan
São Paulo

O primeiro dia do Festival ODS 2022, nesta quarta (25), mostrou que o Brasil tem condições de promover uma transição justa em direção ao desenvolvimento sustentável. Mas há entraves. Um dos principais obstáculos para alcançar um modelo econômico ecológico, que considere as demandas sociais e territoriais, é que esse esforço precisa ser coletivo e diverso.

Especialistas concordaram, no evento, que poder público, setor privado, mercado financeiro, indústrias e a sociedade civil organizada precisam atuar juntos para evoluir a um sistema que proteja o meio ambiente e fomente a equidade social.

homem de óculos branco à esquerda conversa pela tela com mulher branca à direita
Sergio Andrade, diretor da Agenda Pública, recebe a senadora Simone Tebet (MDB-MS) em evento sobre economia de baixo carbono - Festival ODS

Não é uma questão de escolha: não há outra saída para preservar a vida no planeta e o tempo é curto, como mostram os fenômenos decorrentes da mudança climática. Nesse contexto, o Brasil seria uma potência cada vez mais pressionada por outros países para implementar ajustes.

"As empresas estão percebendo o valor da sustentabilidade. Precisamos de lideranças para fazer essa agenda avançar e que seja prioridade de quem tem a caneta", afirmou Sonia Consiglio, reconhecida pelas Nações Unidas como profissional que promove os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Mudanças estruturais

Uma mudança estrutural como essa exige investimentos, adaptações fiscais, tributárias e produtivas.

"Vamos precisar mudar o perfil de toda a matriz energética e retomar o crescimento da nossa indústria", afirma Nelson Marconi, coordenador executivo do Centro de Estudos do Novo Desenvolvimento da FGV. "Qualquer país sem indústria não consegue crescer de forma consistente."

Marconi indica que a retomada da indústria precisa se direcionar para a energia limpa e renovável e desenvolver tecnologias que cuidem da questão ambiental e sejam inclusivas.

Essa nova etapa que envolve inovação e tecnologia não pode ser feita sem envolver governos, setor privado associado e indústria.

"É uma oportunidade de investimentos para o país", disse, defendendo que a taxação de produtos pode ser um instrumento estímulo ao consumo, segundo o tipo de produto comercializado e seu impacto ambiental.

Inclusão social

Marcelo Bonfim, presidente do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), sustentou a importância da capacitação da mão de obra para que trabalhadores façam parte da transição para o novo modelo e participem da economia verde, do crédito verde e da descarbonização.

"A inclusão social é um grande desafio e o banco de desenvolvimento é um vetor que pode intervir nessas realidades regionais."

Com todas essas dimensões a tratar para migrar a uma economia sustentável, o país precisaria também reformar seu sistema tributário, como defende Pablo Cesário, coordenador executivo de advocacy do Conselho Nacional da Indústria (CNI).

"Temos um sistema tributário injusto, que tributa mais os pobres porque se dirige principalmente ao consumo. Esse sistema diz que o suor do rosto de algumas pessoas é melhor e deve ser mais incentivado do que o de outro trabalhador. Isso precisa mudar, é uma questão central. É preciso tirar do consumo e transferir para a renda", afirmou.

Transição justa

Pablo Cesário também defendeu o investimento em novas tecnologias e pesquisas. "É preciso discutir o investimento em inovação, que está mal direcionado e pouco intenso, e não há política de inovação no mundo que não envolva o Estado."

Ao longo do evento, o público conheceu iniciativas em curso que são exemplos da participação do Estado na transição justa.

A prefeita de Abaetetuba (PA), Francineti Carvalho (PSDB), apresentou o programa de renda mínima que favorece o comércio local. "Fortalece o empreendedorismo e o comércio local ao mesmo tempo em que combate a fome."

Apresentou também políticas de incentivo à agricultura familiar, inclusão do pequeno produtor para produção da merenda escolar e capacitação de mulheres e jovens. "As mulheres são as gerentes de suas famílias", afirmou.

Rafael Figueiredo, secretário executivo de transformação digital do Recife (PE), compartilhou a experiência de parceria com grandes empresas, em que o eixo central é a sustentabilidade e, em especial, o manuseio do lixo e a economia circular.

Um dos exemplos foi a adaptação na comunicação com os cidadãos por meio do WhatsApp. "O aplicativo avisa, com a antecedência definida pelo cidadão, quando a coleta seletiva vai passar para que o consumidor possa separar seu lixo", explica.

Uma das sessões mais importantes do festival tratou dos investimentos para fomentar a transição justa no sentido de uma economia de baixo carbono que seja inclusiva.

"O setor financeiro também precisa ser transformado. Não basta irrigar as boas ideias com recursos. O setor precisa ser trabalhado para que entregue recursos àquilo que a gente precisa", afirma o ambientalista Marcelo Furtado, diretor na Finance for Biodiversity Initiative e sócio da BlockC.

Furtado cita como exemplos a "Bolsa Verde", implementada pela Prefeitura do Rio de Janeiro, e o projeto de crédito de carbono indígena criado por Almir Suruí.

"​​Não é apenas gerar o ativo, mas garantir que há capilaridade para que o recurso chegue até aqueles que estão mantendo esse ativo presente, a floresta em pé, que são os indígenas. É uma discussão de sobrevivência", afirmou Furtado.

BR22+8

O evento paralelo BR22+8 apresentou entrevistas com lideranças políticas. Na tarde desta quarta (25), a bióloga e ex-ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira (que ocupou o cargo entre 2010 e 2016, nos governos petistas de Lula e Dilma Rousseff), falou sobre as perspectivas brasileiras em relação a uma transição justa no novo modelo econômico.

"O Brasil tem se deslocado para o passado. Hoje o país tem a ambição de ser um líder dos anos 1990. O governo atual faz uma entrega sucessiva de desmatamento, é um absoluto fracasso das políticas públicas", afirmou.

Ainda assim, a ex-ministra considera o país como potencial líder nessa mudança. "O Brasil tem a capacidade de liderar e ajudar o mundo a ser mais justo e a ser melhor. É o país que mais produz vida no planeta, mas está optando, no curto prazo, pela morte."

O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE), pré-candidato ao governo de Sergipe, destacou a função dos fundos de desenvolvimento regional e dos bancos de fomento na adequação dos estados brasileiros às demandas do mundo.

Entre elas, treinar trabalhadores para novas habilidades e incidir sobre a geração de empregos e a infraestrutura. "Estamos bem distantes desse cenário", afirmou.

"Temos um problema mais de gestão e de agenda do que de financiamento. A agenda foi sequestrada por debates menores, de cunho ideológico, comportamental, de baixa relevância e o orçamento público sofreu um ataque dramático chamado orçamento sequestro. Estamos desperdiçando oportunidades fundamentais", disse Vieira.

A senadora Simone Tebet (MDB-MS), pré-candidata à Presidência da República, também esteve no festival. Ela falou sobre a necessidade de incorporar as tecnologias à gestão dos governos e que estejam ao alcance dos cidadãos.

"Precisamos mostrar não só para a sociedade mas também para a classe política que a digitalização dos serviços públicos ajuda a alavancar a economia do país, torna o governo mais eficiente e transparente. É preciso regulamentar esse processo, por meio do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação", afirmou.

A TV Folha transmitiu entrevista com Denise Hills, diretora global de sustentabilidade da Natura. Ela tratou dos desafios para a agenda socioambiental na adaptação para novos modelos econômicos sustentáveis.

"Cada vez mais as empresas serão escolhidas por sua capacidade de gerar essa mudança para todos e serem reconhecidas como líderes por isso", afirmou.

Os debates do primeiro dia do Festival ODS estão disponíveis no canal da Agenda Pública no YouTube. Para acompanhar as discussões desta quinta, é preciso se inscrever no site do Festival ODS.

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