'Estamos à mercê do Estado brasileiro', diz Sonia Guajajara

Para ativista e embaixadora da campanha #AgoraVcSabe, crianças e adolescentes indígenas são duplamente invisibilizados pela violência sexual

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Ivy Farias
São Paulo

A história se repete com frequência: adolescentes indígenas saem de suas comunidades para estudar e acabam em casas de família onde são abusadas sexualmente. Outra ameaça é o avanço desenfreado do garimpo em terras demarcadas, em que crianças acabam expostas à violência, inclusive sexual.

"Somos olhadas com exotismo. O que é nossa identidade acaba se tornando uma cultura de subserviência e inferioridade de nós, mulheres indígenas", diz Sonia Guajajara, liderança indígena eleita uma das pessoas mais influentes do mundo pela revista americana Time.

Sonia Guajajara, liderança indígena eleita uma das pessoas mais influentes do mundo segundo a revista americana Time - Adriano Machado/Reuters

Guajajara é também embaixadora da campanha #AgoraVcSabe. Promovida pelo Instituto Liberta, a conscientização contra o abuso sexual de crianças e adolescentes é a causa do ano da plataforma Folha Social+.

A líder indígena ressalta que o abuso sexual contra crianças e adolescentes indígenas é extremamente velado.

Casos como o da menina de 12 anos, estuprada e morta em Roraima em maio, e das duas garotas indígenas Guarani Kaiowá, de 12 e 14 anos, que foram encontradas neste mês com sinais de abuso sexual e tortura na região de Amambai (MS).

Em novembro de 2020, uma menina de cinco anos foi estuprada e morta por asfixia: Ana Beatriz Sateré-Mawé foi retirada da rede em que dormia na comunidade de Sateré-Mawé no Amazonas por três homens no meio da noite. Seu corpo foi encontrado no meio da mata.

"Casos como estes são comuns, mas é extremamente difícil de denunciar e apurar", afirma Sonia Guajajara.

Após a denúncia da menina Yanomami, a comunidade Araçá foi vítima de um incêndio criminoso. "A falta de informações sobre o tema é uma das nossas dificuldades: estamos à mercê do Estado brasileiro. Não temos qualquer proteção neste sentido."

A ativista ressalta que as autoridades não têm como chegar nas comunidades e fazer as devidas apurações dos casos. Segundo Guajajara, entrar nas aldeias indígenas para trazer informações e conscientização também é um desafio.

Dados do Relatório de Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil (2020) apontam que crianças e adolescentes indígenas são vítimas de abuso dentro do ambiente familiar: dos cinco casos destacados no documento, duas vítimas são adolescentes e uma criança —esta última, no Acre, era recorrentemente abusada pelo pai, segundo denúncia do Conselho Tutelar.

Para Guajajara, a falta de políticas públicas é um entrave para combater a violência sexual contra crianças e adolescentes indígenas tanto quanto o silêncio.

"Ainda é um assunto velado, cheio de tabus. O que sei é o que chega como denúncias, não há números oficiais."

O próprio relatório é obra do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). "O governo alega que o fato de estarmos em territórios urbanos diminui nossa identidade, mas isso é uma inverdade", explica.

"É preciso que tanto a União quanto os estados tenham políticas adequadas para atender estas especificidades, levando em conta a identidade dos povos indígenas. Nossa realidade parece muito distante do Estado."

PASSEATA VIRTUAL

A segunda passeata virtual do movimento #AgoraVcSabe aconteceu em 14 de junho. Outras duas serão realizadas até o final da campanha, em agosto.

Para participar, basta entrar no site e gravar uma mesma frase que será dita por todos os participantes, um convite para romper o silêncio em torno da questão. "A violência sexual contra a criança e o adolescente é uma realidade. Eu fui vítima e agora você sabe!"

COMO GRAVAR SEU VÍDEO PARA O LEVANTE VIRTUAL

  1. Acesse agoravocesabe.com.br pelo celular ou desktop

  2. Clique em 'Gravar', declare ser maior de 18 anos e aceite o termo de uso de imagem

  3. Posicione seu rosto no círculo e leia o texto que aparece na tela. Refaça o vídeo se desejar

  4. Clique em 'Enviar'

  5. Deixe seu email se quiser receber uma notificação sobre quando seu rosto irá aparecer na passeata virtual

A causa de Combate à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes tem o apoio do Instituto Liberta, parceiro da plataforma Social+.

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