Denúncias de violência sexual contra crianças no Disque 100 crescem 48%

Dados inéditos dos primeiros 4 meses de 2023 mostram crescimento em relação ao mesmo período de 2022

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São Paulo

O número de denúncias de estupros, abusos, exploração e outras violências sexuais contra crianças e adolescentes cresceu 48% nos quatro primeiros meses deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado, revelam dados inéditos do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

Entre janeiro de junho de 2023, o Disque 100 —canal de denúncias anônimas de casos de violações de direitos humanos— registrou 9.500 denúncias de crimes desse tipo, em comparação com 6.400 no primeiro quadrimestre de 2022. Em todo o ano passado, foram feitas 11 mil denúncias com esse perfil.

Assédio violência doméstica abuso sexual estupro
Catarina Pignato

Houve também um aumento expressivo —de 68%--- no número de violações de direitos relacionadas a essas denúncias: foram 17 mil neste ano, contra 10.400 em 2023.

O Disque 100 recebe, analisa e encaminha denúncias de violações de direitos de grupos vulneráveis, como crianças, mulheres, idosos e a população LGBT. É descrito pelo governo como um "pronto-socorro" dos direitos humanos, por atender, 24 horas por dia, situações que acabaram de acontecer ou que estão em curso, acionando órgãos competentes.

Os dados foram consolidados pelo governo para o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, promovido todo 18 de maio.

Creches, instituições de ensino, estabelecimentos de saúde, transportes públicos e carros de aplicativos foram alguns cenários das violências denunciadas. Mas, em consonância com as evidências de outros estudos, é a residência da vítima o local onde mais acontecem os abusos: 60% das denúncias foram de crimes ocorridos dentro de casa.

A casa de familiares, do suspeito da agressão ou de um terceiro é o segundo local mais comum, citada em 18% dos casos; outros 8% ocorreram no ambiente virtual, ou seja, foram praticados pela internet.

Organizações que lidam com essa temática, como o Instituto Liberta, acreditam que os números podem refletir um crescimento das denúncias, não necessariamente dos casos. Sabe-se que se trata de um crime muito subnotificado –de acordo com estimativas, apenas 10% dos casos são denunciados.

"Essa é uma violência que sempre existiu. Acreditamos que o aumento no número de registros pode significar uma coisa positiva, porque é a sociedade desnaturalizando e reagindo a essa prática. Só com a quebra do silêncio é que essa violência pode ser enfrentada", diz Luciana Temer, diretora presidente da organização.

Segundo ela, a denúncia é o primeiro passo, mas só vai haver uma melhora efetiva do problema com ações de educação e informação para que crianças e adolescentes aprendam a se defender. "Basta olhar para o fato de que se trata de uma violência preponderantemente intrafamiliar para entender que o caminho da prevenção é o mais eficaz", afirma.

Para Lucas José, secretário-executivo da Coalizão Brasileira pelo Fim da Violência Contra Crianças e Adolescentes, de fato não é possível afirmar que o aumento do número de denúncias represente um crescimento da prevalência dessa violência, já que falta uma integração dos registros com outras bases de dados sobre violência.

"A subnotificação mascara o número real de violência sexual. Mas ao reconhecer que, em tese, o aumento ocorre pelo maior reconhecimento dessa violência e melhor acesso aos canais de denúncias, é fundamental que o governo faça incrementos no Disque 100", afirma.

Ele também ressalta que a maior procura por canais de denúncia gera aumento da demanda e que é preciso responder adequadamente. "Se a demanda não é atendida, há risco de o canal perder credibilidade. O famoso 'denunciar não resolve'", alerta.

O governo federal promete lançar, em um evento no Palácio do Planalto nesta quinta-feira (18), um pacote de ações de conscientização e enfrentamento do abuso e da exploração sexual contra crianças e adolescentes.

Entre as medidas previstas, estão o investimento nos Centros Integrados de Escuta Protegida, o lançamento de um programa que mapeia pontos vulneráveis à exploração sexual de crianças e adolescentes em rodovias e um programa de parceria com empresas.


Como denunciar

- O Disque 100, canal de denúncia anônima do governo federal, funciona 24 horas, todos os dias da semana. Basta ligar gratuitamente para o número 100. Também é possível denunciar pelo aplicativo Direitos Humanos Brasil ou pelo número de WhatsApp (61) 99611-0100.

- A denúncia pode ser feita presencialmente em uma delegacia de polícia, de preferência uma delegacia de proteção à mulher ou de crianças e adolescentes, se houver na sua cidade.

- Os Conselhos Tutelares podem ser procurados para ajudar a tirar uma criança de uma situação de violência, ainda que seja uma suspeita.


A dimensão do problema

61,3% dos estupros registrados no Brasil são contra menores de 13 anos

4 meninas de menos de 13 anos são estupradas por hora no Brasil

82% dos abusadores são conhecidos da vítima

76,5% dos casos acontecem dentro de casa; 1%, na escola

85,5% das vítimas são do sexo feminino

4 a 8 anos é a faixa etária da maioria dos meninos vítimas de violência sexual

10 a 14 anos é a faixa etária da maioria das meninas vítimas dessa violência

10% dos casos são denunciados, segundo estimativas

3.651 pontos de exploração sexual infantil foram mapeados no Brasil em 2020

Fontes: Anuário Brasileiro de Segurança Pública; Childhood; Instituto Liberta

A causa 'Da Repressão à Prevenção da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes' tem o apoio do Instituto Liberta, parceiro da plataforma Social+.

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