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13/08/2003 - 08h55

Braço político das Farc quer esclarecer seu "extermínio"

VARQUÍRIA REY
da BBC, em Bogotá

A União Patriótica (UP), braço político das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), está buscando uma solução amigável com o governo do país para esclarecer o que chama de "extermínio de seus integrantes" e garantir proteção aos sobreviventes.

A história do grupo, que surgiu em 1985, em uma das fases processo de paz com o governo, envolve ameaças, perseguições e um saldo calculado em mais de 3.000 integrantes mortos.

Jahel Quiroga, advogada e dirigente nacional da UP, explica que a solução negociada não representaria perdão ou esquecimento.

"Esperamos que o Estado reconheça sua responsabilidade no extermínio da UP. Queremos também que indenize integralmente as vítimas", diz ele.

Perseguição

Os diálogos atuais seguem orientações da Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

O órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA) aceitou analisar o caso por considerar graves violações de direitos e liberdades humanas que envolvem membros da UP.

Segundo Jahel, o movimento foi perseguido desde o momento da sua criação por representantes da "política tradicional, criadores de gado, comerciantes e membros da igreja".

Desde então, ela argumenta que a organização tem sido submetida a um processo de aniquilação sistemática, com assassinatos, desaparecimentos e exílios forçados.

Na longa lista de membros assassinados apresentada pela UP figuram dois candidatos à Presidência, sete congressistas, 13 deputados estaduais, 11 prefeitos, 69 vereadores e outros 3.000 militantes.

Jahel acredita que o êxito da UP em sua primeira disputa eleitoral, em 1986, quando obteve a mais alta votação na história dos partidos de esquerda colombianos, com cinco senadores, 14 deputados, 351 vereadores e 23 prefeitos, estimulou ainda mais as mortes.

"Caso a UP seguisse com esse desempenho, se converteria em pouco tempo numa alternativa real de poder", afirmou.

Paramilitares

Jahel diz que o Estado é responsável por ação ou omissão nesse processo.

De acordo com ela, muitos dos assassinatos foram cometidos por paramilitares, em lugares em que há a presença de integrantes do Exército ou da polícia.

Nos primeiros dez meses do governo do presidente Álvaro Uribe, foram registrados 18 assassinatos de dirigentes e militantes, conforme números divulgados pela UP.

Também, no último ano, aumentou o número de membros do partido presos pelas autoridades militares sob a acusação de serem cúmplices da guerrilha e do terrorismo.

"Em áreas onde a UP tem influência, as capturas de líderes políticos e comunitários são frequentes", afirma Rodolfo Rios Lozano, advogado da organização.

"Em algumas ocasiões, são presas 30, 40 pessoas no mesmo dia, acusadas de pertencerem às Farc, quando são apenas integrantes da UP. Meses depois, acabam liberados, por falta de provas."

Foi o que ocorreu com a costureira Odília León, militante da UP há 18 anos, que viu o marido e dois irmãos serem assassinados apenas por fazer parte do partido.

Odília, que já foi vereadora pela UP em Villavicencio, no Estado de Meta, acabou presa no ano passado.

"Fizeram uma montagem contra mim. Eles diziam que eu era terrorista. Mas, em seis meses me liberaram porque não tinham nenhuma prova."

O senador Antonio Navarro Wolf, ex-guerrilheiro do Movimento 19 de Abril (M-19), reintegrado à sociedade numa negociação de paz com o governo em 1989, diz que seu grupo não passou por perseguição semelhante à UP porque abandonou todos os vínculos com a luta armada.

"Nós assinamos um acordo de paz com o governo, enquanto a UP nasceu da vontade das Farc, que nunca se desmobilizou", disse.

"Seus integrantes foram assassinados sob o argumento de que pertenciam ao braço político de um grupo armado. Mas, na verdade, os membros da UP são pessoas desarmadas, longe das ações militares, que não podiam ser alvos das agressões que aconteceram."

Hoje, os poucos sobreviventes usam coletes à prova de balas, têm guarda-costas e se movimentam em carros blindados.

Já não podem participar do processo eleitoral, porque a UP não figura mais na lista dos partidos politicos colombianos.

Nas últimas eleições, o movimento não conseguiu os 50 mil votos necessários e o mínimo de uma vaga no Congresso.

Governo

Segundo Jaime Girón, vice-ministro de Assuntos Multilaterais do Ministério de Relações Exteriores, o Estado colombiano está disposto a encontrar a solução amigável para esse caso.

"É um trabalho longo. Não podemos dizer que acabará em um ou dois anos, mas estamos com a melhor vontade de chegar a um esclarecimento", disse o representante do governo.

"Desde a campanha eleitoral, o presidente Uribe ressaltou que uma de suas intenções era de não deixar ocorrer novamente na Colômbia casos como o da UP."

Girón diz que é impossível saber o número exato de mortos, porque muitos dos casos estão sendo investigados.

De acordo com ele, a responsabilidade do Estado no assassinato massivo de membros da UP ainda está por ser esclarecida.

O vice-ministro também assegura que, casos em que eventualmente forem comprovados vínculos de militares com paramilitares, devem ser considerados como isolados.

Segundo Girón, essa não é nem nunca foi a política do Estado.


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