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25/09/2006 - 12h50

Papa deve manter diálogo sobre 'fé e violência'

ASSIMINA VLAHOU
da BBC Brasil, em Roma

O encontro do papa Bento 16 nesta segunda-feira com embaixadores de países muçulmanos junto à Santa Sé e representantes de comunidades islâmicas na Itália, tem sido apontado como uma etapa importante na ofensiva diplomática do Vaticano depois dos protestos que seguiram as palavras do papa durante sua viagem à Alemanha.

Mas para analistas, as declarações do papa na Alemanha, longe de terem representado um 'erro' ou uma gafe diplomática do principal dirigente da religião católica no mundo, fariam parte de uma estratégia do Vaticano.

O analista de assuntos vaticanos, Sandro Magister, diz acreditar que o papa sabia que aquela frase poderia provocar reações e correu este risco voluntariamente.

Magister afirmou à BBC Brasil que este seria o 'estilo' de Bento 16, que quer impor uma nova direção política no Vaticano.

Estilo

"O papa vai seguir por este caminho, que é um exemplo de como se compõe a prudência diplomática com uma linha muito mais corajosa e determinada, que é a linha prevalente de Bento 16", avalia o analista. "A política fica em segundo plano e não condiciona as escolhas do pontificado."

Segundo Magister, o papa conseguiu trazer o foco das atenções para um tema que considera fundamental.

"A importância de separar a fé da violência e uni-la à razão. Com isso, espera que venham à tona as vozes mais disponíveis e abertas ao diálogo dentro do Islã", acrescentou Magister.

O vaticanista Marco Politi também diz acreditar que Ratzinger não vai mudar sua atitude depois do incidente, mas vai completá-la.

"Seu modo de ser veio à tona, mas ele deve considerar as questões concretas, não apenas o que pensa. Precisa entrar mais no papel de papa", disse Politi, em entrevista à BBC Brasil.

Na opinião do vaticanista, é importante para o Vaticano manter o relacionamento com os muçulmanos, que representam 1,3 bilhão de pessoas, a maioria na região entre a África e a Ásia.

Por outro lado, acrescenta Politi, o mundo islâmico precisa ter um interlocutor no Ocidente. "O papa entendeu as exigências geopolíticas do diálogo", afirma.

Diferenças

O analista Magdi Allam vê na mudança de política do Vaticano a base correta para o diálogo com o mundo muçulmano.

De acordo com Allam, João Paulo 2° apontava as semelhanças entre as duas religiões. Já Bento 16 indica as diferenças.

"Cada religião deve dizer claramente o que pensa da outra, não só um aperto de mãos, sem abrir o jogo, sem dizer o que se pensa, mas um diálogo que deve se basear na adesão ou não a valores comuns", comenta.

Os analistas concordam em dizer que existe um problema de comunicação no Vaticano, que tem como novo porta-voz o padre Federico Lombardi, ex-diretor da Rádio Vaticana.

Bento 16 dá grande importância ao texto escrito, mas seus discursos nem sempre são fáceis de entender. Difícil será mudar isso.

Na opinião de Marco Politi, com esta crise, Bento 16 "entendeu que não pode escrever apenas como teólogo ou filósofo".

Para Magister, no entanto, "o papa e o teólogo são uma coisa só".

Mundo islâmico

Mohamed Dour Dachan, membro da Consulta Islâmica Italiana, disse já considerar o caso encerrado e que o importante a partir de agora seria "continuar o diálogo, e não para falar do passado".

No discurso que fez na universidade de Regensburg, Bento 16 citou um texto do século 14 que definia Maomé como portador de "coisas más e desumanas como a difusao da fé por meio da espada".

Estas palavras provocaram violentas reações em vários países muçulmanos e o assassinato de uma freira católica na Somália. O caso chegou a ser definido como o pior incidente diplomático da história do Vaticano.

Por duas vezes, o papa Bento 16 explicou que suas palavras foram mal interpretadas e que a frase não refletia seu pensamento.

A Secretaria de Estado do Vaticano, chefiada pelo novo "primeiro ministro", o cardeal Tarcisio Bertone, pediu aos núncios (embaixadores da Santa Sé) nos países muçulmanos que explicassem a posição do pontífice e entregassem aos governos cópia integral do discurso.

Mas o pedido de desculpas, exigido por diversos líderes muçulmanos, entre eles o principal chefe religioso da Turquia, destino da próxima viagem do papa, não chegou.

O fato de embaixadores de países muçulmanos terem participado do encontro com o papa significa que a frente moderada do mundo islâmico deseja encerrar o caso, segundo Magdi Allam, vice-diretor do jornal Corriere della Sera e principal analista italiano de questões islâmicas.

Na opinião de Magdi Allam, o incidente, contudo, deve ser visto como uma derrota para todos.

"O papa precisou se justificar por ter exercitado o legítimo direito à liberdade de expressão. Isso criou um precedente e agora há o 'islamicamente correto'", avalia Allam. "Antes de dizer algo é preciso pensar se aquilo pode provocar violências e extremismos."
 

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