Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
15/02/2001 - 03h37

Eleito era peça que FHC movia no tabuleiro

Publicidade

RAYMUNDO COSTA, da Folha de S.Paulo, em Brasília

Antes de viajar para o Timor Leste, Fernando Henrique Cardoso convidou líderes tucanos ao Palácio da Alvorada para discutir as eleições do Congresso.

Aécio Neves (MG), líder do PSDB na Câmara, chamou Teotonio Vilela Filho (AL), presidente da legenda, e pediu: "Diga a ele que eu não vou e que ele vai entender por quê".

Neto e filho de tradicionais políticos mineiros, desde cedo Aécio se iniciou nos códigos da política.

Se fosse à reunião -imaginava- deixaria a impressão de que FHC apoiava sua candidatura à Câmara, o que era verdade, mas não podia ser dito, ou que fora chamado para ser retirado da disputa, suspeita que permeou todos os lances da eleição. Recado dado, FHC respondeu a Teo Vilela: "Já entendi. Fez muito bem".

No jogo eleitoral da Câmara, havia uma certeza: Aécio era uma peça que FHC moveu no tabuleiro para sacrificar mais adiante, quando fosse necessário compor os interesses de PFL e PMDB, seus eventuais aliados para 2002.

Aécio também supunha que essa era uma opção nos cálculos políticos de FHC. Mas tinha certeza de uma coisa: o presidente não seria o engenheiro de sua saída. Afinal, entrara no jogo com o aval e a promessa FHC de enfrentar as consequências que adviriam dele.

Aécio virou um peão no xadrez eleitoral da Câmara no Alvorada, em reunião de FHC com a cúpula do PSDB que atravessou uma madrugada da primeira semana de setembro de 1999.

Eleitos em maio para comandar a legenda, os dirigentes tucanos exibiram um quadro dramático do PSDB. Pesquisas internas revelavam que a sigla era vista pela população como à direita do PFL.

O PSDB sentia-se espezinhado pelos aliados, especialmente o PFL, temia vir se transformar numa força média no Congresso e chegar a 2002 sem condições de se impor na aliança que vai indicar o sucessor de FHC. O rosário de queixas era imenso.

Nas eleições de 98, tiveram de abrir mão de candidatos próprios em oito Estados em favor da aliança com os aliados. Por imposição do Planalto.
Nos dois Estados em que se rebelaram, Espírito Santo e Goiás, se deram bem, elegendo o senador Paulo Hartung (ES) contra Elcio Álvares( ES) e o governador Marconi Perillo (GO) derrotando o ex-ministro da Justiça Iris Resende (PMDB).

FHC ouvia pacientemente.

Em setembro, a popularidade do presidente estava em baixa e o senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) em franca ofensiva pelo salário mínimo de US$ 100. O clima político no Congresso era tenso.

Poderia estar muito pior -lembrou Teo Viela- se os três líderes do governo fossem Luís Eduardo Magalhães, Benito Gama e Elcio Álvares, todos pefelistas, como fora até recentemente, em vez dos atuais tucanos Arthur Virgílio, Arnaldo Madeira (SP) e José Roberto Arruda (DF).

Coube a Aécio Neves o lance final: o PSDB era o único partido que não tinha outro candidato que não fosse tucano. Ou o governo privilegiava a aliança, deixando-o isolado e sem forças para defender FHC no Congresso e se impor na eleição de 2002, ou conquistava uma das Casas, desmontando o tripé pelo qual PMDB e PFL se revezavam nos comandos do Senado e da Câmara e o PSDB tinha a Presidência da República.

Estava claro que a vítima seria o PFL. Mas também que o jogo se restringiria às eleições no Congresso. A eleição de 2002 será outro jogo, no qual o PMDB larga em vantagem, mas não sozinho.

-Temos a chance de disputar a presidência da Câmara - arriscou Aécio.
FHC arbitrou:

- Isso vai provocar fraturas, mas estou disposto a enfrentá-las!
Aécio não perdeu tempo:

- Posso avançar?

- Vá adiante.

Na reunião do Alvorada estavam os parlamentares que viriam constituir o núcleo da campanha de Aécio (Teo, Sérgio Machado, Arthur Virgílio, Nelson Marchezan e Arnaldo Madeira), e três ministros (José Serra, Pimenta da Veiga e Aloysio Nunes Ferreira).

Alguns parlamentares, mas sobretudo os ministros, achavam que Aécio era uma peça a ser removida adiante em nome do tripé. Mas, também, que, viabilizado o PSDB na Câmara, outro nome seria chamado para o lugar: Pimenta da Veiga (Comunicações), Alberto Goldman (SP) ou Aloysio Nunes Ferreira (Secretaria Geral).

Cabia a Aécio ser o engenheiro e o mestre-de-obras da própria candidatura. A geração tucana mais antiga o achava imaturo. De fato, quando Tancredo Neves morreu, em 1985, esse mineiro de 40 anos, economista, divorciado, pai de uma uma menina de 9 anos, não sabia o que fazer.

Aceitou um cargo na Caixa Econômica Federal e candidatou-se a deputado federal em 1986. "Teve atuação tímida nos dois primeiros mandatos (em 14 anos, apresentou 21 projetos, nenhum deles vingou). Eleito líder, revelou-se bom articulador, ativo na defesa do governo e do partido", diz o perfil de Aécio traçado pelo o Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar).

Na opinião de FHC, Aécio é um político que "sabe perceber as oportunidades". De imediato, o mineiro percebeu que precisava vencer o descrédito e as resistências do PSDB. Em junho passado foi a São Paulo conversar com Mário Covas:

- Você conta com a unidade da bancada?

- Conto.

- Se for preciso, terá coragem de enfrentar o governo?

- Terei

- Então, conte comigo.

Mais difícil era Tasso Jereissati. Pré-candidato a presidente, o governador cearense não via e não vê com bons olhos o acordo do PSDB com o PMDB, necessário para eleger Aécio, mas que trazia embutia a eleição de Jader no Senado, inimigo do principal aliado do cearense no PFL, ACM.

Aécio foi a Fortaleza. Conversaram um pouco no Palácio do Cambeba e depois Tasso o levou até sua casa, dirigindo o próprio carro. Aécio argumentou que ele, Tasso, era o candidato de ACM, mas antes precisava ser candidato do PSDB e não podia jogar contra sua candidatura à Câmara.

Tasso foi reticente. Não garantiu votos a Jader, mas mandou que os dois senadores tucanos do Ceará assinassem a lista que referendava o acordo entre as duas legendas.

Auxiliado pelo tio Francisco Dornelles, ministro do Trabalho, Aécio acertou um acordo com Severino Cavalcanti (PE), o candidato do PPB. Se FHC não o retirasse da disputa, o que Severino sinceramente acreditava, o PPB o apoiaria, como de fato apoiou.

Aécio viria cumprir a promessa de "enfrentar o governo" feita a Covas quando uma reunião de ministros com Jorge Bornhausen (PFL) tentou "zerar" o jogo no Congresso. Partiu para o ataque, junto com os outros parlamentares tucanos presentes na reunião de setembro no Alvorada.

Foi um dos momentos de maior perigo para Aécio, mas a articulação acabou abortada por quem os tucanos menos esperavam: Michel Temer (PMDB), que até ali vivia pedindo para FHC intervir para pacificar a base aliada.

Difícil foi convencer o PMDB de que FHC não o retiraria do jogo. As desconfianças só acabaram quando Jader Barbalho percebeu que ACM não deixaria o PFL fazer um acordo, o que era desejo do peemedebista, que o elegesse presidente do Senado.

FHC parece ter abandonado de vez a hipótese de sacrificar Aécio quando ACM disse que ele tolerava a corrupção. O presidente sempre absorvera (mal) os questionamentos de sua autoridade feitos pelo pefelista. Mas, a partir do momento em que ele duvidou de sua moral, sentiu-se descompromissado de fazer qualquer acordo com o líder baiano.
 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página