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28/10/2002 - 19h19

Campanha do PT pagou R$ 1,27 mi a Zezé di Camargo & Luciano

MARCELO RUBENS PAIVA
articulista da Folha de S. Paulo

Foi-se o tempo em que Fafá de Belém e Milton Nascimento, movidos por um ideal, apareciam em comícios das Diretas Já!, entre 1983 e 85, com apenas um microfone improvisado e o gogó.

A campanha para a presidência da República indica que existe uma nova e esquisita maneira de fazer política: os caros showmícios de militantes profissionais [cantores populares], organizados por marqueteiros.

Quase não há transparência no negócio. Poucos apontam os valores dessa militância. Perguntar sobre cachê aos artistas e seus empresários é inútil. Mas um número dá a dimensão da transação: a campanha de Lula pagou à empresa da dupla Zezé Di Camargo & Luciano, até o fechamento desta edição, R$ 1.275.000.

Esse valor refere-se à infra-estrutura de onze comícios no primeiro turno e seis no segundo, num contrato que estabelecia R$ 75 mil por aparição. Detalhe. A dupla, que fez campanha também para o PSDB de MG, não cobrava cachê, mas só subia no palco vizinho ao palanque se o dinheiro fosse depositado três dias antes.

A Folha apurou que o cachê cobrado por shows da dupla é, em média, R$ 150 mil.

Ricardo Kotscho, da campanha de Lula, não estranha esse profissionalismo da militância. "O Zezé Di Camargo e o Luciano se encaixam nesse perfil.
Eles já fizeram campanha para todo mundo, de vários partidos. Normalmente, o artista dá o show e vai embora. Mas, já no segundo comício, o Lula conversou no palco da dupla, e virou um diálogo político", diz.

"Em 1994, o Lula conheceu o Duda Mendonça e queria que ele fizesse sua campanha, mas o PT vetou. Para 2002, Lula aceitou ser candidato, mas impôs condições: fazer campanha com o Duda e contratar bom profissionais, não mais fazer aquela campanha romântica", conta Kotscho.

Segundo ele, que afirma que é importante ter artistas populares, a campanha de Lula tinha de mudar, depois de perder três vezes.
"Comício só com discursos é muito chato. Antes, havia alguns artistas fracos, e o comício ficava para baixo. E diziam que o PT sempre tinha que ser pobrezinho, amador", completa.

"É um negócio profissional, todos querem o dinheiro. Quem pagar mais, leva", resume Adilson Laranjeiras, assessor de Paulo Maluf, que, na última campanha, para o governo de São Paulo, não contratou artistas para comícios.

Capital Inicial, banda que foi disputada pelos candidatos Ciro, Serra e Lula, cobra aproximadamente R$ 100 mil por show. Ela decidiu não participar da campanha, apesar de já ter animado gratuitamente um comício na campanha da prefeita Marta Suplicy. O custo de seu show aproxima-se de R$ 35 mil. "No caso do Ciro e do PSDB, nos ofereceram bastante dinheiro. Às vezes, duas ou três vezes mais do que o cachê normal. Mas a banda não quer misturar as coisas", diz Haroldo Tzirulnik, empresário do Capital.

Os comícios de Ciro Gomes foram animados pelo grupo de pagode Os Travessos. Garotinho fechou com bandas de estilo gospel.
Chitãozinho & Xororó, dupla símbolo da era Collor, desta vez tucanou. Outra atração musical constante nos comícios de José Serra e Geraldo Alckmin, além de Leonardo, era a banda KLB, empresariada pelo pai dos meninos, Francesco "Franco" Scornavacca.

Curiosamente, o mesmo Scornavacca empresaria a dupla Zezé Di Camargo & Luciano, que animou os showmícios de Lula. Uma neblina se forma em torno dos valores dessa militância. Scornavacca, procurado pela Folha, não retornou as ligações.

Rogério Schlegel, da campanha de Serra, afirma que seus artistas ganhavam cachês, mas que a campanha está proibida por contrato de divulgar os valores.

"A turma do marketing que pensa, faz contratos. Leonardo é um bom exemplo desse profissionalismo na militância: uma música cantada por ele aparecia na propaganda do Lula, mas ele fez comícios do Serra", diz Schlegel.

"O Zezé não cobrava cachê, mas tivemos que pagar para a turma dele. Fizemos um pacote que cobria despesas de infra-estrutura. Mas virou uma relação legal", diz Delúbio Soares, que cuidou das finanças da campanha de Lula.

Paulo Viana, advogado da dupla Zezé Di Camargo & Luciano, afirma que a relação com o PT começou quando ele ouviu a música da dupla "Meu País" sendo gravada num estúdio, e há três anos fez a aproximação com Lula.

"Percebi que a música tinha a cara do Lula, insisti para ele escutar. Ele adorou. Em 2001, o Duda Mendonça negociou a cessão dos direitos da música, disse que ia usá-la no horário político. Como teve uma repercussão grande, o Lula quis conhecer o Zezé e agradecer a cessão", diz Viana.

"Fizemos a coisa formalmente, para não parecer interesse, e acabamos cedendo a música de graça. O Zezé ficou maravilhado com o Lula, disse que ele estava preparado mesmo para governar."

Viana diz que os R$ 75 mil por show, a metade do que a dupla cobra normalmente, era uma média calculada entre showmícios fora de São Paulo (R$ 100 mil) e perto (R$ 50 mil), e que a maioria deles era marcada nos dias em que a dupla faz poucos shows [de segunda a quarta-feira].

"Se o custo fosse maior, ficávamos no prejuízo; se fosse menor, o lucro ficava para nós. O Zezé achava que ia enganar o público se tocasse meia dúzia de músicas no violão. O PT pagou as despesas de produção de um show completo. Mas os artistas não cobraram cachê."

Leia mais no especial Eleições 2002

Veja também o especial Governo Lula
 

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