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01/03/2007 - 20h07

Economia está blindada pelo sucesso, diz Lula

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ELIANE CANTANHÊDE
Colunista da Folha de S.Paulo

Um dia depois do anúncio de que a economia do Brasil só cresceu 2,9% em 2006, bem abaixo da média global de 5,1% e da média dos emergentes, de 6,5%, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou claro nesta quinta-feira que não vai mudar o comando da economia e elogiou: "A área econômica está blindada pelo sucesso".

Se a manchete dos jornais de ontem foi o baixo crescimento do PIB, que foi de 2,6% no primeiro mandato, equivalente à da primeira gestão de Fernando Henrique Cardoso (98-2002), Lula preferiu comemorar um outro dado da economia: as reservas internacionais superaram US$ 100 bilhões, um recorde.

Em conversa com jornalistas, durante café da manhã no Planalto, Lula contou que, em 2004, durante viagem à Índia, ele soube que aquele país tinha reservas de US$ 100 bilhões e pensou no dia em que o Brasil chegaria lá. Concluiu, então: "Taí. Chegamos".

Um dos jornalistas perguntou se, na viagem de 2004, ele não tinha sonhado também em chegar ao crescimento de quase 10% da Índia.

Lula esquivou-se, dizendo que o Brasil teve pico de crescimento de até 14%, chegou a índices médios de 7% com Juscelino Kubitschek e que isso não reverteu em redistribuição de renda: "O povo ficou mais pobre".

O presidente também descartou pela primeira vez em público a intenção de concorrer ao terceiro mandato, criticou "erros históricos" dos EUA com a América Latina e falou de seu encontro com o presidente George W. Bush, em São Paulo, no próximo dia 9.

O café durou cerca de uma hora e meia, havia onze jornalistas e não foi permitida gravação. As declarações do presidente, portanto, foram anotadas pela Folha.

Superávit primário

O presidente disse que, além de preservar a equipe econômica na reforma ministerial, também não pretende mudar a política do setor. Disse que o país vai crescer "sem que a gente faça loucuras" e acrescentou: "Não me peça para fazer mágica".

Segundo ele, o país vem de décadas de irresponsabilidade e "não custa nada ter uma década responsável".

Assumiu para si a responsabilidade e eventuais críticas pela economia e seu baixo crescimento, ao dizer: "Sou eu que me exponho, que ponho a cara na rua para ser xingado. Se alguém tem que reclamar sou eu". Em seguida, comparou: "Pior é pensar que dá um salto e cair num buraco".

Otimista, Lula disse que o país está indo muito bem, nunca teve condições econômicas tão favoráveis e decretou: "Estamos a um fio de chegar lá". E defendeu a hipótese de o PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) na prática significar uma flexibilização do superávit primário, cuja meta é de 4,25% do PIB, mas pode chegar a 3.75% com investimentos.

"Não vou gastar mais, vou investir", defendeu-se, fazendo uma comparação com o pagamento de aluguel, "que não volta mais", com a compra de uma casa própria, que fica.

E questionou: "O mesmo presidente que tomou a decisão em Paris de que [o superávit primário] seria de 4.75% por que não pode dizer que vai ser de 4, por exemplo?"

Disse, ainda, que está pagando dívidas que não foram feitas pelo seu governo, mas pelos anteriores e, como previsível, usou uma metáfora: "Herdamos a viúva e os filhos. A única coisa que não vem junto é o ex-marido, ou a ex-mulher".

Reforma tributária

Segundo Lula, a reforma tributária continua empacada porque "cada um tem a sua, cada entidade tem a sua, cada um quer uma", como, aliás, disse que já reclamou com os empresários Jorge Gerdau, do grupo Gerdau, e Armando Monteiro Filho, presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria).

Lula disse que o governo vai patrocinar uma proposta de reforma tributária e provocou: "Vamos ver se eles [os empresários] e o Congresso Nacional aceitam". Em seguida, provocou também os governadores: "A parte do governo federal foi feita. E a dos governos estaduais?"

Terceiro mandato

Pela primeira vez publicamente, Lula disse que vai "tentar eleger um companheiro" em 2010 e descartou disputar o terceiro mandato: "É muito improvável e inexequível e não ser poderia brincar com a democracia", disse.

Diante da ponderação de que improvável não significa impossível, foi mais incisivo: "Eu acho impossível. Nada é impossível, mas não há essa hipótese. É brincar com a democracia". Lembrou, em seguida, que foi eleito e reeleito pelas regras da Constituição e irá respeitá-las.

Ele lembrou que é um crítico da reeleição, disse que tentará eleger um "companheiro" e manifestou "um sonho": "Terminar este mandato muito melhor do que terminei o primeiro, porque nada pior do que um presidente terminar um mandato com o seu candidato não querendo ele no palanque".

Um repórter perguntou ser era uma alfinetada no seu antecessor Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que foi praticamente alijado dos palanques dos candidatos tucanos José Serra, em 2002, e Geraldo Alckmin, em 2006. Lula negou, mas insistiu: "Eu quero terminar meu mandato tendo que recusar convites para ir a palanque".

Lula admitiu, indiretamente, que poderia não estar bem preparado para assumir a Presidência na primeira vez que concorreu à Presidência, em 1989, e perdeu para Fernando Collor de Mello.

"Dou graças a Deus [por ter perdido]. Esses doze anos de espera foram uma universidade, um mestrado, um doutorado e... o que se faz depois disso? Ah. Sim. Pós-doutorado".

Depois, insistiu: "Doze anos de espera foram uma bênção de Deus. Estou muito mais preparado para ser presidente".

Reforma política

Um compromisso assumido por ele durante a conversa: "A Presidência da República não vai se meter na reforma política", disse, defendendo que essa é uma questão para os partidos.

Relatou, inclusive, que determinou ao ministro Tarso Genro (Coordenação Política) que, em vez de enviar as sugestões de reforma do Executivo para os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB) e da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT), enviasse aos partidos.

Reforma ministerial

Afora confirmar a permanência da equipe econômica, Lula se negou a dar nomes que entram ou saiam com a reforma ministerial e ironizou os jornalistas: "Eu fico sabendo das coisas por vocês. É fantástico".

Ele disse que só vai conversar com o presidente do PT, Ricardo Berzoini, amanhã ou depois, para saber o que o partido está pretendendo para a reforma. Em seguida, quer ouvir o PV.

Negou, porém, que esteja sob pressão: "Nunca estive numa situação tão favorável como agora para fazer ministério. Não há nenhuma pressão. Os partidos têm me deixado totalmente à vontade".

Ele, porém, admitiu: "Todo mundo sabe que preciso contemplar os partidos aliados. É uma necessidade do país, não dos partidos".

Segundo turno

Nesse momento da conversa, Lula disse que, durante a campanha da reeleição, ele achava ruim a hipótese de disputar o segundo turno, que acabou ocorrendo, mas agora avalia que foi ótimo: "O segundo turno foi uma dádiva de Deus. Não poderia ter acontecido uma coisa melhor".

Explicou que o segundo turno muda a relação com senadores, deputados, partidos e destacou: "Senadores que trabalharam contra mim hoje não têm mais disso". Lula não deu nomes, mas pelo menos os senadores Cristóvam Buarque (PDT-DF) e Jefferson Peres (....) estão nesse caso.

Petrobras e etanol

A Petrobras vai participar ativamente do programa do etanol conforme anunciou ontem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que considera prioritários os esforços para substituir o petróleo por biocombustíveis a médio e longo prazos.

Segundo Lula, em conversa com jornalistas, a participação da Petrobras será ambiciosa, "como garantidora de suprimento, inclusive no mundo".

Ao defender o etanol e os carros flex (movidos a gasolina e a álcool), o presidente disse que não basta querer, é preciso também garantir que o combustível chegue aos postos e às bombas.

Lembrou que a entressafra de cana de açúcar é de quatro meses ao ano e que a petrobrás será fundamental para garantir um estoque regulador: "A Petrobras vai entrar nisso", disse, então.

Lula recomendou que os jornalistas que conversavam com ele testassem carros flex, pois estão cada vez melhores, e disse que tinha "uma vírgula de parte nesse programa do carro a álcool", desde a época de militância no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo (SP).

Conversa com Bush

Ele confirmou diretamente que o etanol será um dos eixos de sua conversa com o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, que virá a São Paulo nos próximos dias 8 e 9, a caminho do Uruguai.

"Para mim, o mais importante [na conversa] será o etanol. Vou discutir isso com o presidente Bush, porque o biocombustível não pode ser um programa de um único país, mas uma responsabilidade do mundo."

Lula previu que esta será uma nova matriz mundial na área de combustíveis e pregou: "Não precisamos ficar eternamente dependentes do petróleo. Estamos provando que é possível ter alternativas".

Em outro momento da conversa, ele disse que pretende dizer aos norte-americanos: "Por que fazer etanol de milho? Por que não dar o milho para as galinhas?"

Estados Unidos

O presidente desmentiu a acusação de "antiamericanismo": "Não. Veja. Os EUA são um parceiro estratégico para o Brasil. Nós temos muito a aprender e a ensinar a eles".

Para Lula, os EUA "cometeram um erro histórico contra a América Latina, com uma relação truncada de preconceitos e cismas".

Ele opinou que "as relações estão maduras" e fez uma ressalva: que não se deve confundir suas "posições pessoais" com suas "posições de chefe de Estado".

E criticou: "Durante décadas, o Brasil agiu como subserviente aos EUA. Nenhum interlocutor aceita subserviência. Nem o marido da mulher, nem a mulher do marido. Se não, ninguém te respeita".

Ele também deve falar com Bush sobre meio ambiente e antecipou indiretamente o tom: "Sempre digo que a gente tem que tomar muito cuidado com o discurso dos países ricos, que querem nos dar lição de que não podemos desmatar, enquanto eles são responsáveis por 70% dos gases poluentes". Segundo o presidente, o Brasil preserva 69% de suas matas, os EUA, apenas 0,5%, e a América do Norte, 0,69%, "por causa do Canadá".

FMI

O presidente lembrou que, "diferentemente das décadas passadas, quase não se fala mais em FMI [Fundo Monetário Internacional]" e comparou: se, antes, a instituição só falava em contenção de despesas, ajuste fiscal e arrocho, "agora tem que falar em crescimento econômico, em desenvolvimento, o que é uma mudança extraordinária". Ele acha que o alvo deve ser os países mais pobres, como os africanos e o Haiti.

Jovens e violência

Lula se encontra hoje com o ministro da Educação, Fernando Haddad --que ele se negou a confirmar no cargo--, para discutir 42 projetos de médio e longo prazos, especialmente na área do ensino fundamental.

Ele anunciou que, a partir de agora, aproveitará todas as suas viagens para visitar duas escolas de cada lugar, a pior e a melhor, "para entender por que um aluno aprende e outro não".

Ao recriminar a redução da maioridade penal, disse que "não se pode reagir emocionalmente a cada tragédia" e disse que "o Estado não pode colocar a juventude a mercê da repressão" por causa da minoria que comete crimes bárbaros e perguntou: "Esse menino não é resultado de todos esses governantes que não foram punidos? Vamos culpá-lo por não ter dado oportunidade a ele?"

Lula admitiu que "o programa Jovem Aprendiz não deu certo até agora", mas que pretende procurar os empresários para cobrar responsabilidade social. Segundo ele, há 6 milhões de comércios no país e, se cada uma empregar um jovem ao menos, o problema do desemprego e do desajuste poderia ser resolvido rapidamente. Citou especificamente a siderúrgica Gerdau e a fábrica Volks de automóveis.

Defendeu, também, que as universidades federais passem a ter aulas à noite, que suas dívidas com a União possam ser transformadas em bolsas de estudo e, por fim, ironizou: "Se a gente esperar o socialismo chegar, vai demorar muito tempo".

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