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20/11/2003 - 03h58

Japoneses acham nova espécie de baleia

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REINALDO JOSÉ LOPES
da Folha de S.Paulo

A família dos maiores animais que já existiram no planeta acaba de ganhar um novo membro --que só foi descoberto, ironicamente, por ter sido caçado. Trata-se da baleia Balaenoptera omurai, uma nova espécie desses mamíferos marinhos identificada por pesquisadores japoneses.

Até agora, só nove exemplares do bicho foram achados --oito deles caçados por navios de pesquisa no Pacífico e no Índico, e o outro encontrado numa ilha do mar do Japão. Mesmo assim, a análise anatômica e de DNA deixa claro que se trata de um novo cetáceo (grupo ao qual pertencem todas as baleias e golfinhos).

Com pouco menos de 12 m de comprimento, a criatura nem chega perto da gigantesca baleia azul (Balaenoptera musculus), que pertence ao mesmo gênero e pode chegar a 33 m. O tamanho do animal, no entanto, faz parecer quase incrível que ninguém tivesse reparado nele antes.

Divulgação


"Muitos pesquisadores imaginam que haja espécies desconhecidas, mas precisamos de vários indivíduos de cada espécie para avaliar as variações entre eles. Os museus tendem a se satisfazer com apenas um ou poucos exemplares por espécie, o que significa que temos de viajar um bocado para fazer boas comparações", explica o anatomista Tadasu Yamada, 53, do Museu Nacional de Ciência de Tóquio, um dos autores do estudo que sai na edição de hoje da revista científica britânica "Nature" (www.nature.com).

Ao lado de seu colega Masayuki Oishi, Yamada analisou o exemplar que acabou aparecendo na ilha de Tsunoshima, enquanto o cetologista Shiro Wada, do Instituto Nacional de Ciência Pesqueira do Japão, examinou os exemplares capturados nos anos 70.

Variação oculta

O próprio aspecto do animal não é dos mais úteis para identificá-lo, mas os pesquisadores tiveram de lidar com outro problema quando moradores de Tsunoshima os avisaram sobre o imenso cadáver na praia. "Encontramos um cadáver em estado avançado de decomposição no porto e ficamos contrariados, porque a identificação da espécie era quase impossível", conta Yamada.

A criatura lembrava uma baleia-fin (B. physalus), mas era bem menor e menos escura. A equipe conseguiu recolher e congelar amostras de músculo, gordura e rim do animal, assim como seu esqueleto, que foi comparado com os de baleias desconhecidas caçadas anteriormente.

Uma das diferenças principais entre a nova espécie e as outras Balaenoptera é o número e a coloração das barbatanas bucais que substituem os dentes nesses cetáceos, usadas para filtrar a água em busca de crustáceos e pequenos peixes. Mas a prova dos noves foi mesmo a análise do mtDNA, ou DNA mitocondrial.

Esse tipo de material genético vem das mitocôndrias (as usinas de energia das células) e dá aos cientistas uma boa idéia do grau de parentesco entre indivíduos ou espécies. A B. omurai mostrou ter o mtDNA mais divergente de todas as Balaenoptera, estabelecendo de forma confiável sua condição de espécie nova.

"O trabalho é ótimo, está muito bem embasado", avalia o biólogo Marcos César de Oliveira Santos, 34, especialista em cetáceos que faz seu doutorado no Departamento de Ecologia do Instituto de Biociências da USP. Para Santos, não é impossível que mais espécies de cetáceo acabem surgindo, graças aos avanços nas análises genéticas e aos novos conhecimentos sobre populações difíceis de observar e espalhadas por grandes áreas.

"Um exemplo é o tucuxi [Sotalia fluviatilis], um boto que vive na Amazônia e em boa parte do litoral da América do Sul e Central", afirma o biólogo da USP. "Ninguém ainda sabe se o tucuxi marinho e o fluvial são duas [espécies] ou apenas uma espécie."

Um dos pontos polêmicos no próprio trabalho da "Nature" é que parte dos dados só foi conseguida com a chamada "caça científica", defendida pelos japoneses mesmo depois da moratória internacional à caça determinada pela Comissão Internacional da Baleia (IWC, em inglês) em 1986.

"Enquanto a caça científica continuar, devemos extrair o máximo de conhecimento científico possível das baleias mortas. Nesse sentido, ela tem méritos", pondera Yamada. Para Santos, no entanto, é possível que a política de caça japonesa tenha até atrasado a divulgação dos dados, já que mais uma espécie significa mais regulamentos de proteção.

"Eles podem até usar isso como pretexto para justificar a caça, mas tudo que se consegue com ela pode ser feito com biópsias. É melhor tirar um pedaço do bicho do que o bicho inteiro", afirma.
 

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