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19/04/2007 - 09h55

"Isso não é a cura para diabetes", diz médico paulista sobre pesquisa

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FABRÍCIO FREIRE GOMES
da Folha Ribeirão

Na semana passada, o médico paulista Julio Cesar Voltarelli, 58, recebeu cerca de 200 e-mails por dia de pessoas que buscam a "cura" para o diabetes tipo 1.

Apesar do sucesso da pesquisa, Voltarelli (que descobriu há um ano ter diabetes tipo 2) se nega a falar em "cura" e diz não acreditar que sua técnica será implantada em larga escala.

O pesquisador passa a maior parte de seu dia em uma sala do Hemocentro, em Ribeirão. O computador, livros e pastas de documentos se misturam com os desenhos e fotos das filhas --Lisa, 18, e Clara, 12. De lá ele concedeu a seguinte entrevista:

FOLHA - Como surgiu a técnica de usar o autotransplante de células-tronco para barrar o diabetes?

JULIO CESAR VOLTARELLI - A técnica é a mesma usada para outras situações como a leucemia. Ela foi desenvolvida fora. Em 1997, já era utilizada nos Estados Unidos e na Europa. Em 2000, com a participação do norte-americano Richard Burt, decidimos tentar fazer no Brasil. Inicialmente focava três doenças: lúpus, esclerose múltipla e esclerose sistêmica. Em 2001 fizemos o primeiro transplante auto-imune para lúpus no HC. O paciente está sem usar medicação há seis anos.

FOLHA - Quando sua equipe começou os primeiros testes para adaptar a técnica para o diabetes tipo 1?

VOLTARELLI - Final de 2003. O primeiro paciente estava cumprindo pena na Penitenciária de Serra Azul. Depois de várias discussões éticas e morais, decidimos fazer o transplante nele. Foi feito em janeiro de 2004. Só que não funcionou.

FOLHA - O fato de o primeiro não ter funcionado não desanimou o grupo de pesquisadores?

VOLTARELLI - Não. Quando uma coisa não dá certo, você tenta analisar o que aconteceu. No caso dele tem duas possibilidades. A primeira é que ele tomou corticóides [substância utilizada para prevenir alergias durante o tratamento]. Isso é ruim para o diabetes. A segunda é que ele entrou no hospital já num estágio muito grave. Foi aí que substituímos o corticóide e escolhemos um grupo que nunca teve o coma diabético.

FOLHA - Qual é o risco envolvido no transplante?

VOLTARELLI - O risco de morte é muito baixo, mas pode ocorrer. A quimioterapia é muito forte. O risco principal, no entanto, é uma infecção porque a terapia bloqueia o sistema de imunidade do paciente. Teve um paciente nosso que teve uma infecção grave e quase morreu, mas foi recuperado.

FOLHA - E agora, quais são as próximas etapas do experimento?

VOLTARELLI - Esse número de 15 é pequeno. O ideal era fazer com uns 50. Foi o que nós pudemos fazer, apesar de mais de cem terem sido entrevistados.

FOLHA - O limite para a técnica funcionar tem que ser mesmo seis semanas da descoberta do diabetes 1?

VOLTARELLI - É um limite arbitrário. A questão é a seguinte: quando você desenvolve os sintomas do diabetes, significa que você tem uma quantidade de insulina muito baixa. Quando você está lá na frente, você não tem mais nenhuma célula que produz insulina. A partir do zero, precisa injetar uma célula para refazer o pâncreas. As células-tronco que eu coloco lá não refazem. Isso é um mito.

FOLHA - Quando o procedimento poderá ser feito em larga escala?

VOLTARELLI - O paciente fica três meses aqui. É longo, é caro, é tóxico, é complicado. Não vai servir para tratar todos diabéticos do mundo. Não pode fazer em qualquer hospital. Primeiro, precisa ter um transplante de medula óssea funcionando. Na região de Ribeirão, o único é o do HC. São dez leitos para a região inteira. Como eu vou tratar mil diabéticos? É impossível. Não é um tratamento de massa. Fizemos 15 em três anos. Se eu usar todos os meus leitos eu posso fazer, no máximo, 30 por ano. É pouco. Em massa é difícil fazer. Nós estamos tentando fazer a mesma coisa sem precisar de quimioterapia. Nós estamos tentando usar algum tipo de célula-tronco que faça a imunossupressão por si só. O paciente não precisaria ser internado. Estamos desenvolvendo essa técnica com uma célula mesenquimal [que origina os vasos e alguns tipos de tecido] . É um novo projeto. É a nossa aposta.

FOLHA - Qual é o custo médio do tratamento?

VOLTARELLI - O SUS paga R$ 14 mil por paciente. O custo fica entre R$ 20 mil e R$ 30 mil.

FOLHA - Já dá para usar o termo cura para o diabetes tipo 1?

VOLTARELLI - De jeito nenhum. Eu nego peremptoriamente que esteja falando de cura. Cura significaria o indivíduo nunca mais ter chance de desenvolver a doença. Na realidade, tivemos um paciente que voltou [a tomar insulina]. Depois de um ano, ele teve uma infecção viral e a doença voltou.

FOLHA - Se não é cura, como pode ser definida a técnica?

VOLTARELLI - Resposta clínica. Se esta resposta vai ser permanente ou transitória é que vai se definir. Se o paciente ficar sem insulina o resto da vida, é cura. Eu controlo a diabetes com dieta e comprimido. Não tomo insulina porque o tipo 2 só toma na fase final da doença.

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