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15/03/2006 - 09h12

Mulher de assessor de Serra ganha contrato

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ALENCAR IZIDORO
da Folha de S.Paulo

A Secretaria Municipal do Trabalho do governo José Serra (PSDB) firmou um contrato de R$ 948.750, sem licitação, com um instituto presidido pela mulher do secretário dos Transportes, Frederico Bussinger.

O Idelt (Instituto de Desenvolvimento, Logística, Transporte e Meio Ambiente) vai receber essa quantia para dar cursos de capacitação de calceteiros --referente à construção de calçadas--, auxiliar de serviços gerais, auxiliar de escritórios e reciclagem de lixo como parte de um programa social da Prefeitura de São Paulo.

Fundada em 1996 por Frederico Bussinger e outros 14 profissionais, a entidade presidida pela filósofa e pedagoga Vera Bussinger foi selecionada pela gestão Serra no final de 2005. Não houve concorrência pública --que seria obrigatória se esse serviço, num valor contratual que beira R$ 1 milhão, fosse realizado por uma empresa, e não por um instituto.

A secretaria utilizou como base jurídica a possibilidade prevista no artigo 24, inciso 13º, da lei 8.666/93, que permite a dispensa de licitação "na contratação de instituição nacional sem fins lucrativos, incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, científico ou tecnológico, desde que a pretensa contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional".

Advogados ouvidos pela Folha reconhecem essa previsão legal, mas temem a subjetividade na forma de controle e que não haja conveniência ao poder público.

O contrato, assinado pela Secretaria Municipal do Trabalho e por Vera Bussinger, prevê que 850 pessoas em situação de vulnerabilidade social, como albergados e moradores de rua, recebam 120 horas de aula do Idelt. O treinamento deve durar nove meses e elas receberão ainda uma bolsa-auxílio no valor de R$ 363,45.

A decisão do governo Serra pela contratação do Idelt ocorreu após breve consulta a outras duas instituições, a partir de cartas enviadas em 16 de novembro de 2005.

No dia 21, a Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo respondeu não ter interesse, "em função de compromissos assumidos anteriormente". No dia 28 houve a resposta do Idelt, cobrando R$ 948.750, e do Instituto Metrópolis, presidido por Eduardo Fontes Hotz, ex-presidente da Emplasa (Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano) no governo Covas/Alckmin, que apresentou um plano de trabalho que custaria R$ 1,15 milhão.

A prefeitura, no mês seguinte, fez a contratação do Idelt, por considerá-lo com melhor preço e capacitação, por já ter dado treinamento semelhante. As aulas de construção de calçadas --destinadas a 485 do total de 850 alunos-- começaram neste mês.

Esse projeto é intersecretarial --envolve também a Secretaria das Subprefeituras e da Assistência Social--, embora os contratos sejam da pasta do Trabalho.

Afastamento

O Idelt teve entre seus fundadores, além de Bussinger e de sua mulher, Alberto Goldman (deputado federal pelo PSDB de São Paulo) e outros integrantes da gestão Serra, que ocupam hoje em dia cargos na CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) e na SPTrans (São Paulo Transporte).

Um dia depois da data do convite da Secretaria do Trabalho para que a instituição apresentasse a proposta de trabalho, houve uma reunião do Idelt --convocada no final de outubro-- que definiu mudanças na sua composição.
Na ocasião, segundo cópia da ata, houve a formalização do "afastamento de diversos associados, todos em virtude de estarem ocupando cargos públicos".

A presidente do Idelt, Vera Bussinger, diz que a saída deles já havia ocorrido no começo do governo Serra e que, em novembro de 2005, houve só a "formalização". Ou seja, diz que eles não estavam atuando na prefeitura paulistana e no instituto ao mesmo tempo.

O advogado Paulo Boselli, que é especialista em licitações, contesta a "conveniência" desse tipo de contratação pela prefeitura.

"O conceito básico é: licitação sempre. A exceção é só quando pode haver algum prejuízo ao poder público. Mas, nesse caso, existem diversas empresas que podem fazer a mesma coisa, talvez com um valor mais vantajoso."

"A lei tem uma válvula que precisaria ser ajustada. Há um risco enorme para contratações inadequadas", diz Carlos Ari Sundfeld, advogado especialista na área

Outro lado

O Idelt e a Prefeitura de São Paulo defendem a legalidade do contrato firmado sem licitação e dizem não ver impedimento ético no fato de não ter havido concorrência e de a entidade escolhida ser ligada a um integrante da administração José Serra (PSDB).

Eles destacam que a instituição já teve contratos com outras prefeituras --como Carapicuíba (Grande SP), Vitória (ES) e até São Paulo, em anos anteriores-- e com secretarias do Estado.

Valmir Dantas, secretário-adjunto do Trabalho, afirma que a pasta chegou a "ponderar" a ligação do Idelt com Frederico Bussinger, secretário dos Transportes do governo tucano, mas que optou por escolher uma instituição com bom preço e técnica.

"Não vemos problema ético. Nossa preocupação é com qualidade e preço. O Idelt nos pareceu mais preparado, apesar da peculiaridade de ser presidido pela Vera Bussinger. Nossa decisão foi pela experiência", disse.

Segundo ele, não houve concorrência pública devido à preocupação de selecionar entidades que já tivessem experiência com pessoas em situação de vulnerabilidade social --alvo do projeto social.

"É um trabalho específico. Precisa de gente que domine esse público", afirmou, citando um trabalho do Idelt que se tornou referência no centro de Carapicuíba.

De 2002 a 2004, a entidade deu aulas a egressos do sistema penitenciário que construíram calçadas no município, num projeto que teve a participação do Estado.

A presidente do Idelt, Vera Bussinger, afirmou que, sem serviços do tipo, a entidade não sobrevive.

"Não há nenhum favorecimento. Não é porque ele [Frederico Bussinger] está nesse cargo que vai interferir em outra secretaria. O instituto não sobrevive se não tivermos contratos", afirmou.

Vera disse que, por questão ética, a instituição decidiu não trabalhar para a pasta de seu marido, mas não para o restante da prefeitura. "Enquanto houver esse vínculo, não prestaremos serviços à Secretaria dos Transportes."

Frederico Bussinger informou que não se manifestaria por não ter ligação com esse contrato.

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