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15/03/2006 - 09h10

Exército negocia com tráfico e retoma armas

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RAPHAEL GOMIDE
da Folha de S.Paulo, no Rio

Integrantes do Exército negociaram sigilosamente com a facção criminosa Comando Vermelho a recuperação de dez fuzis e uma pistola roubados de um quartel do Rio, em São Cristóvão (zona norte), no dia 3 de março, segundo relatos feitos à Folha por pessoas envolvidas. As armas já estavam em posse do Exército desde domingo à noite.

Elas estão com a numeração raspada em três diferentes lugares. Um comboio de 12 carros descaracterizados, com homens fortemente armados do Exército transportou, no domingo à noite, os fuzis e a pistola até uma unidade da instituição. Militares celebraram o sucesso da operação no mesmo dia.

Às 19h40 de ontem, o Exército anunciou oficialmente a recuperação das armas. Informou que foram encontradas em um local em São Conrado, bairro vizinho à Rocinha.

Apesar de já estar com o armamento desde domingo, o Exército realizou uma megaoperação ontem na Rocinha. Havia feito o mesmo anteontem na favela do Dendê, na Ilha do Governador, e na Vila dos Pinheiros, na Maré, ambas na zona norte.

A operação sigilosa para recuperar as armas, cuja negociação ocorreu entre a sexta-feira, dia 10, e o domingo, 12, envolveu um líder da facção criminosa Comando Vermelho que não está preso.

Ele negociou a devolução do material a fim de livrar favelas da facção da operação de asfixia do Exército, que reduziu drasticamente o lucro da venda de drogas nas áreas ocupadas. O negociante da facção assumiu que o Comando Vermelho fez o assalto e manteve as armas escondidas até o fim de semana em uma favela plana (o que não é o caso da Rocinha), na qual a venda de droga está sob seu controle, como a Folha informou no dia 9.

O acordo

Para devolver as armas ao Exército, o negociador apresentou três pré-condições:
1) fim das operações de asfixia das tropas do Exército nas favelas do Rio --o que aconteceu entre domingo e segunda-feira;
2) apresentação pública das armas como se tivessem sido apreendidas em uma favela na qual a venda de drogas estivesse sob domínio da facção inimiga, a ADA (Amigos dos Amigos);
3) transferência de um líder do CV do presídio Bangu 1 para Bangu 3 ou essa transferência pode demorar algum tempo para acontecer, para não aparentar ligação com a operação e por depender da Secretaria de Administração Penitenciária do Estado do Rio.

Rocinha

Ontem, às 10h07 --depois de iniciada no domingo uma fase que o Exército classificou de "seletiva e pontual", sem operações "massivas"--, cerca de 400 soldados ocuparam a favela da Rocinha, a maior do Rio, onde a venda de droga é comandada pela facção criminosa ADA.

A Folha soube da operação na noite de anteontem. Às 9h de ontem, quando a reportagem chegou à entrada da Rocinha, era normal o movimento de moradores. Com um radiotransmissor, o jornal acompanhou os diálogos travados por traficantes.

A chegada das tropas à Rocinha os surpreendeu. "Olha o comboio do Exército! Tá vindo comboio do Exército, lá na estrada da Gávea! É muito caminhão, tem tanque de guerra! Os caras estão vindo para cá!", começou a gritar muito nervoso, pelo rádio, um vigia do tráfico na favela, que antes fazia brincadeiras com outros colegas.

Os traficantes negaram estar com os fuzis. "As armas não estão com a gente, não! Aqui não tem [fuzil] 7.62!", gritou um rapaz, pelo rádio. ""Vai lá buscar no Complexo do Alemão. Está tudo lá. Aqui é o bonde do tesouro. Temos dinheiro para comprar armas, não precisamos roubar", disse outro.

Abacate

Após o desespero inicial, em que descreviam freneticamente o poderio militar da Força, os traficantes da Rocinha passaram a fazer ameaças por rádio e a negar estar com as armas.

"Vai entrar na bala geral. Barulha os caras!", disse outro. "Vagabundagem, fica na atividade, subiu o maior bondão de abacate [Exército]!", disse um traficante.

Com um potente aparelho de som instalado em um jipe militar estacionado em frente a um dos pontos mais movimentados da favela, o Exército pedia ajuda à população da favela. ""Atenção moradores da comunidade. O Exército brasileiro vai recuperar as armas desviadas. Denuncie os assaltantes. Sua identidade será preservada. Exército brasileiro. Braço forte e mão amiga."

Pelos radiotransmissores, os traficantes falavam sobre a conduta surpreendente dos militares. "O periquito [como os traficantes chamam os militares do Exército] em vez de ficar na atividade, fica de costa para vagabundo", disse um deles.

Colaboraram SERGIO TORRES e MARIO HUGO MONKEN, da Sucursal do Rio

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