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19/02/2007 - 01h51

Colunista do "NYT" vê busca de bode expiatório e defende pilotos do Legacy

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da Folha Online

O colunista do "The New York Times" Joe Sharkey, que estava no Legacy da empresa americana ExcelAire que colidiu com o Boeing da Gol em setembro do ano passado, comentou neste domingo a reportagem da colunista Eliane Cantanhêde, da Folha de S.Paulo, sobre os diálogos gravados na caixa-preta do avião. Em seu blog, Sharkey diz que a imprensa brasileira tenta "pegar como bodes expiatórios dois pilotos americanos enquanto acobertam as falhas evidentes do controle de tráfego aéreo brasileiro"

Cantanhêde teve acesso às 290 páginas de transcrições das conversas dos pilotos do Legacy e dos controladores de tráfego aéreo brasileiros e concluiu que "uma sucessão de erros, mal-entendidos e uma certa inexperiência ou incompetência" causaram o acidente. Para ela, as transcrições "deixam claro" que a dificuldade de comunicação entre os pilotos do Legacy e o controlador responsável pelo vôo impediu a dupla --por três vezes-- de esclarecer se deveria seguir a 37 mil pés de altitude. O plano de vôo previa uma mudança para 36 mil pés, exatamente na região onde o acidente ocorreu.

Sharkey não contradiz os dados da reportagem, mas defende os pilotos americanos --Joe Lepore and Jan Paladino--, ao afirmar que o controle de tráfego aéreo do Brasil "é uma bagunça" e que os controladores de tráfego aéreo têm um inglês "pobre".

Sharkey insistiu que os pilotos não souberam no que colidiram até pousarem e que especularam até que pudesse ser uma aeronave que tivesse explodido sobre eles e que pudessem ter passado pelos destroços. Para ele, "ninguém sobrevive a uma colisão em vôo entre duas grandes aeronaves". "Essa possibilidade passou a ser considerada remota quando aterrissamos", disse.

O acidente é o maior da história da aviação brasileira e resultou na morte dos 154 ocupantes do Boeing. Nenhum dos ocupantes do Legacy ficou ferido. Além do piloto, do co-piloto e do colunista do "NYT", estavam na aeronave no momento da colisão dois executivos da ExcelAire --empresa que comprara o avião-- e um funcionário da Embrear --fabricante do Legacy--, todos americanos. O sétimo ocupante, também funcionário da Embraer, era o único brasileiro no avião.

Blog

Leia a íntegra do texto (traduzido) de Joe Sharkey, publicado em seu blog na internet:

Oh, não! De volta à toca do coelho!

Talvez seja a aflição da ressaca de Carnaval, mas no Brasil eles voltaram ao assunto, com os jornais hoje afobadamente trazendo trechos das transcrições das gravações nas cabines de comando (que eles sequer deveriam ter enquanto as investigações prosseguem), na interminável missão de pegar como bodes expiatórios dois pilotos americanos enquanto acobertam as falhas evidentes do controle de tráfego aéreo brasileiro e os controladores de vôo mal pagos e mal treinados que estavam de plantão em 29 de setembro, quando eles estavam tranqüilamente desavisados de que duas aeronaves voavam em uma rota de colisão na Amazônia que acabou matando 154 pessoas.

Eis uma amostra, com alguns comentários meus, da edição de hoje do jornal "Folha de S.Paulo". Obrigado, como sempre, ao correspondente Richard Pedicini pela tradução:

por Eliane Cantanhêde, colunista da Folha

As 290 páginas com as transcrições das conversas dos pilotos do jato Legacy e dos controladores brasileiros reforçam que uma sucessão de erros, mal-entendidos e uma certa inexperiência ou incompetência causaram o maior acidente da história da aviação brasileira: a queda do Boeing da Gol, em 29 de setembro do ano passado, com 154 pessoas a bordo.

As transcrições confirmam a informação publicada pela Folha em 2 de novembro de que o controlador de São José, de onde decolou o jato, liberou o vôo citando 37 mil pés, sem detalhar as três altitudes previstas no plano de vôo original.

Meu comentário: em inglês, isso significa que o controle de tráfego aéreo disse ao Legacy na decolagem para permanecer a 37 mil pés durante todo o percurso até Manaus, sobrepondo-se ao plano de vôo original, como os pilotos têm dito desde então

Os pilotos americanos do Legacy, Joe Lepore e Jan Paladino, tiveram dificuldades com o novo aparelho, o plano aeronáutico e com o inglês falado pelos controladores. Ainda assim, o sistema anticolisão estava desligado.

Meu comentário: Essa declaração poderia ser engraçada se não fosse simplesmente triste. Os pilotos americanos tiveram "dificuldades" porque o controle de tráfego aéreo brasileiro é uma bagunça, e há consideráveis áreas sobre a Amazônia onde o contato por rádio e radar não é confiável. Veja meu post de 13 de fevereiro com a declaração da [Associação Internacional de Pilotos de Linhas Aéreas] (Alpa) para a conseqüência exata.

Digo ainda que conheci Joe e Jan justamente durante nossa detenção na selva e durante uma noite inteira de interrogatório policial na noite seguinte e mais tarde também.

Eles são bons caras, pilotos muito experientes, de Long Island [Nova York]. Estou aqui para dizer a vocês: eles falam inglês muito bem! Se tiveram "dificuldades" com o "inglês dos controladores", é porque, como todo piloto internacional que voa no Brasil sabe, os conhecimentos de inglês dos controladores brasileiros são notoriamente pobres. Muitos deles só sabem meia dúzia de frases, aprendidas foneticamente. O recente comunicado da Alpa alertando os pilotos internacionais sobre os vôos no Brasil também cita isso."

De volta à Folha:

Quando o centro de Brasília chama o de Manaus para perguntar por que o Boeing não tinha entrado nos radares do Cindacta-1, apesar de previsto e de ter sido anunciado pelo Cindacta-4, a resposta do controlador de Manaus é: "Ué! Que Gol 1907 é esse?"

Meu comentário: Eles (controladores) não sabiam que o vôo comercial da Gol com 154 pessoas a bordo estava no céu, deixado sozinho na mesma altitude? O 737 naquele momento deveria estar voando sobre a Amazônia em uma das "zonas cegas" de rádio e radar, que o Brasil inicialmente negou existir.

Mais da Folha, Sra. Cantanhêde:

As 290 páginas com as transcrições das conversas dos pilotos do jato Legacy e dos controladores brasileiros reforçam que uma sucessão de erros, mal-entendidos e uma certa inexperiência ou incompetência causaram o maior acidente da história da aviação brasileira: a queda do Boeing da Gol, em 29 de setembro do ano passado, com 154 pessoas a bordo.

Vistas no conjunto, as transcrições deixam evidente que os pilotos e o controlador de São José, suboficial João Batista da Silva, cujo nome não é citado, tiveram dificuldades de comunicação. Ele falou em 37 mil pés e os pilotos tentaram três vezes esclarecer, sem sucesso.

Em depoimento à Polícia Federal, Silva disse que sabia que o plano de vôo previa três altitudes, mas se limitou a orientar o Legacy "nos exatos termos" que recebeu do centro de Brasília: "Autorizado o nível 370 na proa de Poços de Caldas".

Esse foi o primeiro de uma série de erros, como a displicência dos controladores de Brasília e o desconforto dos pilotos norte-americanos Joe Lepore e Jan Paladino com o novo jato e com as condições de vôo no Brasil. Num trecho da caixa-preta, um dos pilotos assume: "Eu preciso aprender essa porra internacional. Merda".

Meu comentário: Ei, caras, o caso, na verdade, não seria que talvez os controladores de tráfego aéreo do Brasil "precisem aprender essa porra internacional"?

Folha: Em um dos trechos das gravações entre os centros de Brasília e de Manaus fica evidente que o Cindacta-1 estava convencido de que o Legacy voava em 36 mil pés, não em 37 mil, como de fato estava.

Depois do impacto, que foi exatamente às 16:56:54 (hora de Brasília), um piloto do Legacy pergunta ao outro: "Que diabos foi isso?" Só 26 minutos depois, Lepore e Paladino admitiram um para o outro a possibilidade --na verdade, a única-- de terem batido num outro avião. "Nós batemos em outro avião. Eu não sei de onde essa porra veio." Em entrevista à Folha em Nova York, em dezembro, eles declararam que só tiveram essa certeza depois do pouso de emergência.

Para os controladores, a descoberta foi lenta. "O piloto falou que ele colidiu com alguma coisa que não sabe o que foi", diz o controlador de Manaus. "Ih. Carai", reage o de Brasília. A tragédia ficava evidente.

Meu comentário: Após nosso pouso de emergência na selva, especulamos por quase três horas sobre com o que colidimos antes de sabermos que era um 737. Até então, ninguém levou a sério a idéia de que tínhamos colidido com um avião de carreira. Ninguém o viu no momento do impacto, por exemplo. A teoria predominante em nossa especulação --e a em que os pilotos mais acreditavam-- era de que outro avião em uma altitude maior havia explodido por alguma razão desconhecida e havíamos batido em algum dos destroços.

O comentário transcrito "Batemos em outro avião" tem um significado bem diferente se é pontuado como "Batemos em outro avião?". Obviamente, uma reação inicial dos pilotos Joe e Jan foi achar que poderíamos ter colidido com outra aeronave. Mas aquele cenário era tão improvável --ninguém sobrevive a uma colisão em vôo entre duas grandes aeronaves-- que essa possibilidade passou a ser considerada remota quando aterrissamos.

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  • Confira a íntegra da reportagem da colunista Eliane Cantanhêde (Só assinantes)
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