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REFLEXÃO


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urbanidade
03/05/2006
Escola do riso

Hugo Possolo levou a sério o que viviam lhe dizendo carinhosamente quando estava na adolescência. "Você é um palhaço", repetiam. O que deixava as pessoas intrigadas era como ele conseguia, no palco, esquecer a timidez, tornar-se subitamente extrovertido e provocar gargalhadas. Cursou jornalismo, mas logo notou que não daria certo. Seu talento residia no circo. Agora, aos 43 anos, está criando uma escola para os que, profissionalmente ou não, gostam de fazer de rir.

O prazer do palco já tinha se manifestado nele na infância -isso para o incômodo de muitos de seus primos. Hugo os obrigava a encenar peças que ele criava para as crianças de um orfanato. "Os primos iam de cara amarrada, mas iam."

Ele nunca deixou de ser tímido -em ambientes públicos prefere ficar de lado, longe do burburinho-, mas, no palco ou no picadeiro, é tomado pelo palhaço. Há 16 anos, fundou o grupo Parlapatões, com a proposta de misturar a cultura popular à erudita. A linguagem circense se presta para encenar Shakespeare, falar sobre Alexandre Magno ou dos mitos gregos. Na semana passada, o grupo levou para um palco a céu aberto, em frente da favela de Heliópolis, uma peça sobre Hércules. As famosas tarefas de Hércules foram trocadas por problemas bem mais concretos para o paulistano: a violência e o tráfico de drogas, por exemplo. "É só assim que conseguimos nos fazer entender se quisermos mexer com a cultura clássica."

Para a realização desse espetáculo, realizaram-se as mais diversas oficinas com pessoas dispostas a aprender sobre teatro. As oficinas iam desde a escrita de texto teatral, encenação, música e cenografia até o figurino. "A experiência apenas reforçou nosso prazer em ensinar."

O Parlapatões prepara-se para ter seu próprio teatro e formar pessoas que queiram ser comediantes. Já conseguiu um espaço na sombria e deteriorada praça Roosevelt, cujos arredores estão se transformando em reduto do teatro alternativo paulistano; por isso, a reforma da praça prevê áreas para encenações. Lá, está o Satyros, um grupo experimental que faz circular de madrugada pela praça, antes só habitada por travestis, drogados, mendigos e traficantes, gente interessada em arte contemporânea.

Hugo quer diversificar ainda mais essa paisagem humana. Um dos objetivos de seu teatro, além de ensinar, é atrair estudantes para aprender pelo riso.

Coluna originalmente publicada na Folha de S.Paulo, na editoria Cotidiano.

   
 
 
 

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