Fábio
queria tanto morar em São Paulo que decidiu tirar título
de eleitor para sentir-se um cidadão paulistano
Animado com o sucesso da sua banda de rock, em Goiânia,
Fábio Pertence arriscou duas apostas ao mesmo tempo:
fez a produção independente de seu CD e mudou-se
para São Paulo. "Aos poucos, via meus dois sonhos
virarem pesadelo." Está se salvando graças
à inspiração que teve, durante um congestionamento,
olhando crianças vendendo balas num semáforo,
em frente ao cemitério São Paulo, na região
de Pinheiros.
Depois de vários meses morando em São Paulo
com sua banda, a Laia
VunJe (o nome significa bando esperto, numa mistura de
diferentes línguas), Fábio sentia o gosto do
fracasso. Encalhe total. Naquele momento, o título
do CD soava uma ironia: "Laia VunJe no país das
maravilhas". Até mesmo o dinheiro do aluguel de
sua casa estava ameaçado. Fábio queria tanto
e há tanto tempo morar em São Paulo - "de
madrugada, em Goiânia, parecia que só nós
ficávamos acordados"- que decidiu tirar título
de eleitor para sentir-se um cidadão paulistano. Uma
mulher da Justiça Eleitoral perguntou qual era sua
profissão. "Compositor", respondeu. Ela olhou
a lista de profissões e lamentou que a de compositor
não estava incluída. "Desempregado pode?",
quis saber Fábio. Podia.
Preso no congestionamento, em outubro passado, ele observava
como as crianças dobravam o embrulho das balas no retrovisor
à espera da decisão do motorista que aguardava
o semáforo abrir. "Pensei que aquilo ali podia
dar certo comigo." Comprou alguns saquinhos transparentes
azuis, nos quais, de um lado, colocou o CD e, de outro, fazendo
o contrapeso, balas toffe.
No primeiro dia de testes de marketing musical, conseguiu,
para sua surpresa, vender seis CDs. Era mais do que até
então tinha vendido desde o início da aposta
na produção independente. Chamou a sua mulher,
Carmen Baiochhi, vocalista da banda, para ajudá-lo
na rua. "Também fiquei entusiasmada", conta
ela. Depois veio o resto da banda para o semáforo rua:
o guitarrista Can Kanbay, o baixista Paulo El Khoury, o tecladista
G. Ponce e o baterista Marcello Cabello, além do produtor
Ale Costa.
Todo aquele esforçou resultou, até agora, na
venda de 3.500 cópias, mais da metade de todo o estoque."Descobrimos
um mercado", diz Carmen, advertindo que o CD não
é pirata. Mais do que esse marketing direto inspirado
nas crianças com suas balas, a Laia VunJe imagina ter
encontrado um projeto musical, intitulado "Rock de rua".
Querem levar seus equipamentos para as esquinas e mostrar
suas composições, enquanto o CD é vendido.
" No mínimo, vamos deixar as ruas mais animadas",
diz Fábio, acrescentando, em tom de brincadeira, que,
se não ganharem o "disco de ouro", conferido
aos músicos de sucesso, serão os melhores candidatos
ao "semáforo de ouro".
Faça Dowlond das músicas
da Laia Vunje:
"Sr.
Coelho"
"Canto"
Coluna originalmente publicada na
Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
|