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REFLEXÃO


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folha de s.paulo
16/10/2006
A vacina antiviolência

Os casos de Bogotá e Medellín mostram que ela já foi inventada e não depende de pôr fim à miséria


OS ataques do PCC combinados às eleições tiraram o foco de um dos fatos sociais mais interessantes do país: a veloz e consistente redução do número de homicídios em São Paulo. Nos últimos cinco anos, a queda foi de 51%, devido, em boa parte, à evolução da segurança da região metropolitana e, especialmente, da capital, onde houve avanços nas áreas mais violentas.

Embora fundamental, só o aprimoramento do policiamento não explica o fenômeno. Olhando mais de perto os bairros em que mais caiu a violência, vemos uma teia de ações que envolvem a mobilização comunitária, a atuação de entidades não-governamentais, o apoio de empresas, o trabalho com grupos de risco -os jovens-, as campanhas de desarmamento, a reforma de espaços públicos e a oferta de programas de complementação de renda.

Se o PSDB e seu candidato à Presidência, Geraldo Alckmin, têm motivos para apresentar os números da segurança como uma vitória, o PT também pode lembrar que programas seus na periferia de São Paulo, como a ampliação da renda mínima e a criação de áreas de convivência, exerceram impacto nos índices de homicídio. Uma das melhores experiências de segurança, no país, é Diadema, comandada por um petista.

Saber quem deve faturar ou não com um avanço social é compreensível num ano eleitoral. Mas, convenhamos, é uma visão medíocre. Digo isso pois acabo de voltar da Colômbia, onde fui conhecer experiências em Bogotá e Medellín, apontadas como as cidades mais violentas do mundo, hoje convertidas em laboratórios de paz. Apenas em Medellín, por exemplo, a taxa de assassinatos caiu em 90%; boa parte dessa queda ocorreu nos últimos três anos.

As duas cidades mostram que a vacina para reduzir níveis de violência, mesmo em lugares pobres, já foi inventada e não depende de acabar a miséria. Isso significa que, apesar dos avanços em São Paulo, eles poderiam ser ainda mais profundos e rápidos. Significa ainda que o Brasil não precisa reinventar a roda para reduzir sua insegurança nas ruas.

Para nós, brasileiros, Bogotá e Medellín, com sua pobreza de Terceiro Mundo, são casos ainda mais interessantes que Nova York, onde a renda e o emprego são os de uma nação rica. Mais do que isso, a violência na Colômbia é extraordinariamente complexa, por misturar diversos grupos de guerrilheiros, narcotraficantes, paramilitares, gangues juvenis e assaltantes comuns.

A primeira lição que tiramos dali é: os três níveis de governo -nacional, estadual e municipal- trabalham articuladamente. O prefeito, o chefe da polícia, exerce forte papel na execução de planos de segurança. Essa é a prerrogativa dos prefeitos das regiões metropolitanas. Mas a polícia continua sendo nacional.

A cidade cobra o desempenho do prefeito em questões como roubo e furtos assim como sobre a limpeza das ruas e a qualidade de ensino.

Eles mexeram na polícia e no sistema prisional. Deram, por exemplo, cursos para carcereiros em universidades. Investiram em policiamento comunitário, mais próximo da população. Junto com a repressão, implementaram-se ações sociais que, mais uma vez, envolvem múltiplas frentes, como reformar espaços públicos, melhorar as escolas, criar centros de convivência comunitária, introduzir mecanismos de resolução de conflitos, focar em programas de inserção dos jovens.

Em Bogotá, melhorou-se o transporte público nos bairros mais pobres, abriram ciclovias, reservaram, em fins de semanas, as principais vias para pedestres, implantou-se uma gigantesca rede de bibliotecas. Parques foram feitos em áreas deterioradas. Usou-se das artes para gerar um senso de pertencimento entre jovens e como mecanismo para retomar as ruas. Os centros de recuperação de jovens infratores são tidos como exemplo mundial de eficiência, geridos, em contrato de gestão, por uma entidade privada.

Novamente acharemos, nessa rede, a articulação de vários níveis de poder, indo do bairro à Presidência.

Os habitantes de Bogotá e Medellín, apesar das conquistas, não estão satisfeitos, convencidos de que podem ir além, afinal a violência segue alta para padrões civilizados. E, aqui, outra lição: tornar a cidade habitável e segura não era e não é discurso de político em campanha, mas prioridade de todos, avaliada todo mês. A pressão não pára e faz do prefeito um educador da paz. O problema é menos de dinheiro que de competência administrativa e articulação local. Sem exagero, nenhum presidente, governador ou prefeito brasileiro pode se dar o direito de não conhecer como os colombianos desenvolvem essa vacina contra a violência. É uma questão de salvar vidas.


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Coluna originalmente publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.

   
 
 
 

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