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REFLEXÃO


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urbanidade
19/05/2004
A menina do largo do Arouche

O francês Roger Henri vestia o terno, colocava a gravata, ajeitava o lenço no bolso do paletó e levava, nos domingos, sua filha Marie para passear pelas praças do centro da cidade. Uma daquelas paisagens, de tão familiar e íntima, era como se fosse a extensão da casa deles: o largo do Arouche, com suas bancas de flores.

Para não perder a intimidade com essa paisagem, Marie deu, há 17 anos, uma reviravolta em seu projeto de vida. Ela tinha estudado administração de empresas, com especialização em recursos humanos, depois fez uma pós-graduação em filosofia da educação. Pouco a ver com o negócio de seus pais, o restaurante La Casserole, que, para os paulistanos, é uma espécie de extensão do largo do Arouche, tão integrante da paisagem como a banca de flores.

Um dia, o pai lhe perguntou: "Você vai assumir o restaurante?". O primeiro reflexo foi o de dizer "não", lembra-se Marie. Roger disse-lhe, então, que estava cansado e que iria vender seu negócio, quem sabe ajudasse seus fiéis garçons a formarem uma cooperativa para substituí-lo. "Não consegui conviver com a idéia de que iria passar por ali e me sentir uma estranha."

Como cresceu ouvindo em casa segredos de receitas culinárias francesas, Marie topou. Mas o largo do Arouche, acompanhando o movimento do centro, perdeu charme e entrou em processo de degradação, de abandono. "Uma tristeza", lamenta. O crack e os mendigos espalhavam-se pela região.

Tradicionais restaurantes mudaram-se, com suas clientelas, para os Jardins. "Não sabia se conseguiríamos sobreviver. Até pensamos em fechar, mas nunca fizemos nada para isso." Resistiram e mantiveram uma parte da freguesia.

Valeu a pena resistir. Ao completar agora 50 anos, o La Casserole não apenas assiste à recuperação do centro -e, com ela, à chegada de novos comensais- mas, especialmente, aposta no projeto de melhorias do largo do Arouche. Uma empresa se dispôs a reurbanizar a área, consertando piso, cuidando dos jardins, trocando a iluminação, reformando a banca de flores -toques que vão devolver as imagens da elegância perdida de São Paulo, mantida na memória de Marie graças às lembranças de crianças pedalando bicicletas -mas, sobretudo, ao impecável terno de seu pai.

   
 
 
 

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