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REFLEXÃO


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urbanidade
23/08/2006
Feliz aniversário

Não havia na escola clima para rir: muros pichados, janelas quebradas, tráfico. A diretora fora jurada de morte

Do alto de uma colina, a escola tem a vista de um cemitério que poderia entrar numa lista mundial de recordes -muita gente jura que, em nenhum lugar existe, proporcionalmente, tantos adolescentes enterrados. Soa, assim, um tanto estranho que aquela escola municipal tenha sido batizada pela comunidade com o nome de Zacarias, o falecido "Trapalhão". Não havia ali nenhum clima para risadas: muros pichados, banheiros detonados, janelas quebradas, tráfico de drogas, guerra de gangues. Depois de se desentender com alunos do período noturno, uma das diretoras foi jurada de morte e, de fato, tentaram matá-la. Como não a encontraram, tocaram fogo em sua sala.

A Zacarias fica nas fronteiras do Jardim Ângela, apontado pela ONU, no passado, como a região mais violenta do mundo; muitos de seus jovens eram enterrados no cemitério Jardim São Luiz, quase que didaticamente em frente à escola. Foi nesse ambiente que chegou, em 1991, Olgair Gomes Garcia, professora de didática no mestrado e doutorado da PUC, para ser a coordenadora pedagógica da escola. Acabou fazendo dali um laboratório de prevenção à violência. "Tínhamos de trabalhar a auto-estima dos alunos e também a de seus pais", diz. "Na periferia, é comum as pessoas não se sentirem valorizadas. É preciso fazer com que aprendam a gostar de si próprias."

Ela teve a idéia de produzir, na escola, caprichadas festas coletivas de aniversário. "No dia da festa é uma alegria quando os estudantes vêem suas fotos num telão." Os aniversários fizeram com que todos pudessem se conhecer pelo nome. Viu-se que esse detalhe -todos se conhecerem pelo nome- era fundamental.

Nessa mesma busca de auto-estima, agregou-se ao currículo a "Semana das Trapalhadas". Nada de aulas expositivas: apenas oficinas de bijuteria, culinária, arte e mídia. "Isso dá a sensação de que se podem fazer coisas belas", aposta Olgair, uma ex-aluna do educador Paulo Freire, com quem, depois, trabalhou na Secretaria Municipal da Educação.

Enquanto ganhava a confiança de pais e alunos, Olgair conseguia ajuda da comunidade para consertar banheiros, portas e janelas. Com o plantio de árvores, fez-se um parque de recreação, com quiosque e quadras, aberto nos finais de semana. Tiraram pichações e iluminaram os muros brancos -o que, à noite, dá um ar de templo à Zacarias, por estar numa colina. "Conseguimos produzir um clima agradável, o que é importante para o aprendizado."

Mas a iniciativa mais relevante de Olgair só se tornou visível recentemente. Com a sua experiência de didática que ministrava na PUC, ela ajudou a formar professores não só da Zacarias mas de colégios públicos próximos. Saíram-se bem acima da média da cidade de São Paulo, na Prova Brasil, o teste de matemática e língua portuguesa -isso apesar de aquelas unidades terem três turnos diurnos. "A chave está no ânimo do educador e na crença de que todos podem aprender", diz ela, com 75 anos, idade em que muitos professores estão aposentados, há muito tempo sem fazer nada. Muito menos reinventar escolas da periferia.

Coluna originalmente publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.

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