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educação
15/12/2004
Escola vira galeria modernista

SÃO PAULO (SP) - Com os olhos úmidos e a voz embargada, Ercília da Silva Fernandes de Oliveira, de 46 anos, se sente muito orgulhosa ao falar da Escola Estadual Estela Borges Morato, em São Miguel Paulista. Ex-aluna, hoje atua no local como voluntária, participando entre outras atividades do projeto Tarsila do Amaral. "Nunca ouvi falar da artista nem sequer das obras dela", diz, ao mostrar a proposta de pintura apresentada aos estudantes. "Mas o melhor de tudo é ver as crianças aprendendo sobre a arte."

Quem chega ao colégio, logo nota os muros com desenhos infantis. Mas o melhor está nas dependências. No pátio, onde as crianças passam o intervalo, as paredes escuras e feias deram espaço para reproduções de quadros de Tarsila do Amaral e de Pablo Picasso. Tudo começou há seis anos, com a professora Rosana Padilha. "Adoro arte e uma aluna me incentivou a fazer pesquisas e mais pesquisas. Com o apoio da diretoria e da comunidade, começamos a transformar a área."

E agora outro espaço recebeu "a segunda fase da iniciativa". Na semana passada, foi inaugurado um pátio cultural, só com obras de Tarsila do Amaral. Foram meses de dedicação para a professora, com apoio de alunos, pais e funcionários. Nas paredes, podem ser vistas reproduções de Abaporu, A Lua, Auto-Retrato, Detalhe de Família, Central do Brasil, A Negra e Urutu. "O meu objetivo é mostrar a importância da arte brasileira. Por meio das reproduções nas paredes, todos conhecem um pouco de arte. Além de embelezar a escola, as crianças têm a oportunidade de descobrir e valorizar o artista brasileiro. O meu prêmio é vê-las entusiasmadas e somando vários conhecimentos."

Na opinião de Rosana, todas as escolas deveriam ter um pátio cultural e a preocupação de vivenciar um pouco da arte. "Despertar o interesse nos alunos é fundamental. Eles acabam contagiando os pais e a comunidade."

Exemplo
Um exemplo disso é o que ocorreu com Gustavo Lopes da Silva, de 10 anos. "Eu não sabia quem tinha sido a Tarsila. Hoje sei tudo sobre a vida e a obra dela. Comecei a comentar em casa e o meu pai, que também não a conhecia, se interessou tanto que comprou um livro sobre ela. A professora me estimulou e, nos fins de semana, também ajudei a restaurar as reproduções na paredes."

A iniciativa tornou-se motivo de orgulho entre todos os professores e estudantes. Indagados sobre qualquer tema, tanto da vida pessoal quanto da vida profissional de Tarsila, eles têm as respostas na ponta da língua. É uma verdadeira aula de arte. Sabem datas, obras, prêmios, tudo sobre a modernista. Rosana até levou um grupo de alunos para conhecer o túmulo onde a artista está enterrada, no Cemitério da Consolação. "Levamos trabalhos, atividades, redações e colocamos em cima do túmulo. Foi uma maneira de homenageá-la."

Ela conta ainda que a emoção tomou conta da garotada. "Foi emocionante para os alunos conhecerem o local onde está enterrada uma pessoa que eles aprenderam a admirar", diz a professora. "A oportunidade de conhecer a arte da Tarsila me incentivou a pesquisar mais. É importante termos conhecimentos culturais", diz Caique Dias Caluete, de 10 anos. "Foi um enorme prazer homenageá-la por tudo o que ela deixou para nós", completa Felipe dos Santos Monteiro, também de 10 anos.
Kenya Tayná Libanio Martins, de 11, faz coro. "A professora incentiva, motiva todos os alunos a adquirirem conhecimentos. Tenho prazer de estudar aqui e me sinto orgulhosa. Agora, todos os alunos têm de se dedicar e preservar o colégio limpo e bonito."

Alegria
A coordenadora pedagógica Vilma de Souza Barros está na escola há três anos. Ela observa que um ambiente mais alegre proporciona maior aprendizagem. "A arte abre os caminhos para a criatividade. Estudantes felizes ficam mais aptos e interessados para aprender."

Para a diretora, Rosana da Silva, o sucesso da ação se deve ainda à parceria de escola, funcionários e comunidade. "O projeto é do colégio, mas sem a dedicação e o amor dos professores, dos alunos e da comunidade, seria inviável. Estou orgulhosa de ser a diretora aqui."

Ela ressalta que o trabalho não é fácil, uma vez que dos 1.800 alunos apenas 10% têm pais que participam. "Conseguimos o respeito e a colaboração de alguns. Já imaginou se este número aumenta?"

Ela considera a proposta da professora Rosana Padilha algo valioso, a ser preservado. "As crianças contagiam a escola com os conhecimentos adquiridos. Até os maiores, que estudam à noite no ensino médio, ficaram interessados pelas pinturas. Eles respeitam e preservam o pátio limpo e até questionam a razão de não terem aulas de Arte. A professora abraçou o projeto e acreditou. Se em cada escola tivéssemos uma Rosana, tudo seria diferente."

Questionada sobre qual a "fórmula mágica" do sucesso, a diretora responde rápido. "É resultado de muito trabalho, amor e dedicação de todos."

CRISTINA RIBEIRO
do O Estado de São Paulo

 
 
 

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