Se
você quer se enganar, paciência
Os oito
distritos mais ricos da cidade de São Paulo, onde mora
quase toda a sua elite econômica e intelectual -Alto
de Pinheiros, Moema, Perdizes, Itaim Bibi, Morumbi, Vila Mariana,
Jardim Paulista e Pinheiros-, registraram, no primeiro semestre
no ano passado, 32 assassinatos.
Esse número
equivale a cerca de 1% de todos os assassinatos cometidos
em São Paulo durante aquele período. Apenas
em dois distritos -Grajaú e Jardim Ângela- matou-se
dez vezes mais do que nas oito regiões de elite.
A leitura
dos dados, bairro por bairro, mostra que, dos 96 distritos
em que moram 10 milhões de pessoas, dez deles concentram
40% dos assassinatos.
As vítimas
estão na faixa dos 15 aos 29 anos, e a imensa maioria
delas são homens.
Esse mapa
da violência pode ser encontrado em todas as regiões
metropolitanas brasileiras: quem morre é, principalmente,
o jovem habitante das áreas mais pobres. E é
também quem mata, rouba e sequestra.
O tema
da segurança vai estar no topo das promessas dos candidatos
a governador e a presidente. Foi o assunto, por exemplo, que
ocupou mais tempo do programa eleitoral de Roseana Sarney
na quinta-feira passada, ela própria apresentando-se
como uma governante exemplar no combate contra a criminalidade.
Dificilmente
a verdade será dita com clareza pelos candidatos, que,
na busca dos votos, acenam mais com soluções
de efeito mercadológico. Candidato que não vende
ilusão não ganha eleição. Goste-se
ou não, essa é a regra.
A verdade
é que, além da ineficiência policial,
o problema de segurança nas cidades é basicamente
o problema dos milhões de jovens que não conseguem
se inserir na sociedade.
Quem quiser
a prova veja duas estatísticas: a evolução
do desemprego e dos níveis de criminalidade na capital
paulista a partir da década de 70. O desemprego juvenil
cresceu oito vezes -taxa semelhante à da criminalidade.
Seria
leviandade estabelecer, num tema tão complexo, uma
relação tão direta de causa e efeito.
Mas ninguém duvida de que o jovem, sem emprego, sem
escolaridade, vivendo em famílias desestruturadas e
em bairros violentos, tenda a cair na marginalidade.
Os bons
resultados no combate à criminalidade, especialmente
nos Estados Unidos, decorreram de um trabalho executado ao
mesmo tempo em duas frentes: melhoria da polícia e
desmontagem dos guetos.
Desmontar
os guetos significa transformar as escolas em centros comunitários;
estão em fase inicial de operação, no
Rio e em São Paulo, escolas que ficam abertas nos fins
de semana, oferecendo atividades culturais e esportivas. Programas
como o favela-bairro, no Rio, servem de orientação
de entrada do poder público em áreas deterioradas.
Percebeu-se
nas áreas violentas dos Estados Unidos que tanto o
estímulo ao esporte como a criação de
áreas de lazer reduzem a taxa de criminalidade. Exatamente
como se vê no morro da Mangueira, no Rio, com um modelar
programa de esportes.
Por reunir
vários desses elementos de enriquecimento do capital
social, a favela Monte Azul, em São Paulo, apresenta
índices baixíssimos de delinquência juvenil.
Ali está talvez a melhor experiência brasileira
para medir a relação entre a melhoria da comunidade
e a queda da violência.
A desmontagem
só se torna, de fato, eficaz quando se oferecem programas
de renda combinados com avanço na escolaridade. Se
fosse bem aplicada, uma lei que acabou de ser sancionada no
Brasil já ajudaria a atacar o desolamento nos guetos.
As empresas
devem contratar uma cota de aprendizes, obrigadas a oferecer-lhes
formação profissional, enquanto o jovem conclui
seus estudos regulares. Se aplicada como deveria, a lei produziria
até 2 milhões de vagas.
Não
é fácil. Não conseguimos nem sequer fazer
cumprir ainda a lei que obriga as empresas a manter uma cota
de portadores de deficiência, por falta, entre outros
motivos, de fiscalização.
A grande
solução -cara, diga-se- é um gigantesco
programa de renda mínima orientado para os jovens dos
guetos urbanos. Já está em andamento um teste,
batizado de "Agente Jovem", desenvolvido pela Secretaria
de Assistência Social do Ministério da Previdência.
A idéia é orientar o adolescente a contribuir
para a melhoria de sua comunidade.
Começa
neste mês, em São Paulo, mais uma experiência,
desenvolvida pela Secretaria Estadual da Juventude com o apoio
de empresas e de entidades como a Unesco e o Instituto Ayrton
Senna, em parceria com a prefeitura: o agente comunitário
de artes. A idéia é escolher jovens e dar-lhes
treinamento em artes plásticas, jardinagem e paisagismo,
para que melhorem seus bairros, criando praças, jardins,
quadras esportivas. Os jovens receberiam um salário
e, ao mesmo tempo, como complementação escolar,
frequentariam, sempre orientados, museus, teatros, bibliotecas,
exposições e ateliês de artistas.
Se alguém
quiser se enganar com as ilusões dos candidatos, paciência.
Apenas com o crescimento econômico, com uma melhor polícia
e com a universalização, bem executada, de programas
de inclusão dos jovens haverá segurança.
Do contrário, a polícia, por mais competente
que seja, sempre será incompetente.
PS - Para
quem, em São Paulo, quiser saber como está a
situação de violência em seu bairro, coloquei
a lista completa na página do Aprendiz:
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