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Ciro
Gomes e os "babacas"
Em minha
coluna na Folha Online, classifiquei de manipulação
o fato de Ciro Gomes apresentar-se como o dono do prêmio
do Unicef em reconhecimento ao esforço de combate à
mortalidade infantil no Ceará. Ciro recebeu o troféu,
mas era somente coadjuvante do programa lançado por
Tasso Jereissati, seu antecessor.
Com base
nessa informação, José Serra quis mostrar
no debate da TV Bandeirantes - e a acusação
foi repetida várias vezes na semana passada - que Ciro
Gomes mentiu, como se tivesse inventado uma condecoração.
O candidato oficial manipulou eleitoralmente a informação.
A verdade:
Ciro tem o direito de dizer que o Unicef premiou o Ceará
durante sua gestão. Mas enganou quando contou sobre
a autoria do programa de combate à mortalidade.
Nos últimos
dias, os tucanos mudaram de tática contra Ciro. Experimentaram,
de início, atá-lo à imagem de Fernando
Collor. Ambos, de fato, se parecem, especialmente no voluntarismo
um tanto tresloucado e na dificuldade de manter o equilíbrio
emocional. Mas comparar Ciro a Collor é apenas uma
jogada de marketing. E ainda não funcionou, se é
que vai funcionar.
Agora,
eles batem na tecla de que Ciro não é confiável,
apontando-o como mentiroso crônico. E aqui existe margem
de manobra: o ex-governador dá a entender que sempre
estudou em escola pública (errado), que parou de falar
mal de Antônio Carlos Magalhães depois da morte
do seu filho, Luís Eduardo (errado), que fundou o PSDB
(errado), que não faz linchamentos morais (errado),
que saldou a dívida do governo (errado).
Durante
a semana, imaginava-se, em particular nos meios governistas,
que os ataques fossem surtir efeito. Na quinta-feira, porém,
a desilusão veio numa pesquisa do Ibope: Ciro subiu
e Serra caiu.
Provar
que um político mente comove a opinião pública?
É
mais fácil encontrar neve no Ceará do que um
político que nunca mentiu ou manipulou eleitoralmente
uma informação. Serra, por exemplo, apresentou-se
como criador do seguro-desemprego, que foi criado por José
Sarney. Vendeu a idéia de que a queda da mortalidade
infantil era uma das grandes conquistas de sua gestão
como ministro da Saúde - uma vitória que, em
essência, pode ser dividida entre várias esferas
e pessoas, a começar do programa lançado no
Ceará, cuja autoria é manipulada por Ciro. É
verdade quando dizem que Serra não estava tão
identificado com o Plano Real, ao contrário do que
ele tenta mostrar na campanha.
Seria
tão fácil quanto injusto igualar as atitudes
de Serra e de Ciro. Mas será que o eleitor comum percebe
as diferenças?
Há
tempos, venho notando (e as minhas impressões são
reforçadas por educadores) que, para a imensa maioria
dos estudantes, o "rouba, mas faz" é, em
larga medida, aceito. É mais ainda disseminada a percepção
de que todos os políticos enganam, ludibriam, mentem.
Tais visões alimentam nos jovens um ceticismo geral
e crônico em relação aos políticos,
o que os afasta da leitura dos jornais e até do aprendizado
de história, visto como uma sucessão de versões
oficiais.
Sentem-se
como se todos os políticos, sem exceção,
os considerassem "babacas", a quem acenam com promessas
mirabolantes, torcendo números e fatos.
Essa percepção
que vejo com nitidez entre os jovens foi detectada em toda
a população pelo Instituto Vox Populi, que mostrou
aos entrevistados uma lista de categorias e indagou-lhes qual
delas fala menos a verdade. A lista relacionou como categorias
artistas de televisão, empresários, crianças,
advogados, jornalistas, motoristas de táxi, políticos,
professores e padres. Em primeiro lugar, bem na frente (muitíssimo
na frente), ficaram os políticos.
Transformar
os palanques em espaço para fazer o ranking de políticos
que mentem talvez seja notícia de jornal ou matéria
para artigos e análises - daí a criar um diferencial
diante do grosso do eleitorado é, no mínimo
(e coloque mínimo nisso), uma empreitada arriscada.
PS - Não
tenho vocação corporativista. Mas, quando Ciro
Gomes, na sua crônica irritação, chama
de "babacas" os fotógrafos que cobriam um
de seus comícios, ofende não apenas os jornalistas
mas também os trabalhadores. Ou ele acha que aqueles
indivíduos estão ali para se divertirem? Com
isso, ele passa a seguinte dúvida: se como candidato
trata as pessoas com tal nível de desrespeito, imaginem
quando se tornar presidente.
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