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Os
professores Fernando e Fernandinho
O presidente
Fernando Henrique Cardoso usou, na semana passada, a Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) para uma
espécie de direito de resposta e, num tom professoral,
tentou dar uma aula sobre a realidade social brasileira.
Alvo dos
ataques dos presidenciáveis de oposição
- e pouco defendido pelo candidato da situação
-, Fernando Henrique exibiu estatísticas sobre os avanços
na educação e até no emprego. Quis mostrar
que a situação é melhor do que a apresentada
no debate eleitoral. "Na campanha eleitoral, as pessoas
usam os dados abusivamente para defender um ponto de vista.
Dados que aparecem assim, milhões para cá, bilhões
para lá, não têm valor científico,
servem apenas para fazer propaganda."
Na semana
passada, a melhor aula sobre a realidade social do país
foi, no entanto, de outro Fernando, o Beira-Mar. Não
usou muitas palavras. No controle de um presídio que
se apresenta como de "segurança máxima",
no Rio de Janeiro, ele comandou um massacre contra seus rivais
com a conivência das autoridades. Ao celular, comemorou:
"Aqui está tudo bem. Tá dominado, tá
tudo dominado".
Dali,
do presídio de "segurança máxima",
os traficantes parecem ter mais controle sobre a cidade do
que as autoridades soltas.
Fernando
Henrique, no Palácio do Planalto, o topo do poder político,
e Fernandinho Beira-Mar, em Bangu 1, o topo da delinquência,
deram uma aula sobre o que espera o próximo presidente
da República. Ambos, cada qual em seu cenário,
com seu estilo, dizem, em essência, a mesma coisa: os
candidatos, de Serra a Lula, passando por Ciro e Garotinho,
estão vendendo ilusões.
Uma análise
equilibrada dos dados lançados na semana passada indica
que, no geral, o Brasil vem evoluindo socialmente. Há
mais gente - e por mais tempo - nas escolas, cresce o número
de matrículas no ensino superior, as mulheres avançam
nas empresas, o trabalhador está mais instruído,
diminui o trabalho infantil, as residências dispõem
de mais telefones e computadores.
Interessado
em vender sua bandeira de salvador do emprego, um diferencial
em relação aos tempos de FHC, José Serra
não se preocupa em mostrar, com a devida clareza, que
milhões de vagas foram abertas. De 1993 até
o ano passado, abriram-se mais 9 milhões de vagas,
o que não foi capaz de atender à demanda.
Se não
interessa a Serra falar sobre esses dados (afinal, ele ficaria
na defensiva e tiraria o impacto do projeto Segunda-Feira,
com sua promessa de 8 milhões de empregos), interessa
muito menos a Lula, autor da promessa de 10 milhões
de empregos.
Com todos
os percalços, avançamos socialmente, mas nunca
a nação se sentiu tão fragilizada: o
melhor retrato dessa fragilidade era a bandeira vermelha do
Comando Vermelho, hasteada no tal presídio de segurança
máxima. Vimos todos a tranquilidade e os risos de Fernandinho
Beira-Mar, sinais da suposição de que, esteja
onde estiver, terá proteção.
Há
um estoque enorme de desempregados, de subempregados e de
pessoas com baixa qualificação - a mão-de-obra
barata dos Beira-Mar. Gerar emprego em sociedades com esse
nível de tecnologia é mais difícil; máquinas
engolem vagas. E, como todos sabem, não se vai produzir
crescimento acelerado.
As despesas
sociais do governo subiram de R$ 113 bilhões para R$
172 bilhões, mas, mesmo assim, não temos a sensação
de que as cidades estejam mais civilizadas, de que as escolas
públicas tenham melhorado consideravelmente, de que
as ruas estejam mais seguras ou de que os hospitais públicos
recebam melhor os pacientes. Será que o candidato eleito
terá muito mais dinheiro parta gastar, levando-se em
conta os apertos fiscais?
Isso significa
que o governo FHC seja uma tragédia social e que o
futuro presidente ou governador tenha pouco a fazer? Nem uma
coisa nem outra. Significa que as ilusões dos candidatos,
embalados pelos marqueteiros, são uma bobagem. A verdade,
que não aparece nos anúncios milionários
da campanha eleitoral, ensinada pelos professores Fernando
e Fernandinho, é singela: a evolução
social de um país é obra de gerações,
com maciços investimentos em educação,
aliada a competência administrativa e a envolvimento
comunitário. O que se faz hoje em educação
trará resultado em dez anos.
O Brasil
de hoje está mais rico, mais educado, porém
mais violento; até a distribuição de
renda está menos ruim. Se pensarmos na violência,
o Brasil de ontem, muito mais pobre e deseducado, era um paraíso.
Sou do tempo (e nem faz tanto tempo assim) em que as crianças
andavam sozinhas e tranquilas no centro de São Paulo.
As políticas
de combate à exclusão são complexas,
exigem uma teia de parcerias, uma reestruturação
dos gastos e investimentos permanentes, que vão da
pré-escola, nossa maior omissão na área
social, ao desenvolvimento de políticas específicas
e nacionais para a juventude.
Nenhum
dos candidatos, seja da oposição, seja da situação,
teria a capacidade de dizer, claramente, que o Brasil do pleno
emprego, acenado na campanha, é um efeito especial
de marketing.
P.S. -
Está circulando pela Internet um texto atribuído
a mim, com ataques pessoais a Lula. É uma fraude. O
que escrevo é publicado nas minhas colunas.
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