São
Paulo é um caso de segurança nacional
Desconfiados
da eficiência dos agentes de segurança brasileiros,
dois irmãos empresários são protegidos,
em São Paulo, por pequeno batalhão de militares
estrangeiros, especializados em ações contra
terrorismo. Cada movimento de um integrante de seus familiares
mais próximos é precedido de uma operação
logística, com uma frota acompanhando seus carros.
Sem tantos
recursos para manter um exército particular, um executivo,
vítima de sequestro relâmpago, abandonou o desejo
do carro importado e adquiriu um táxi; supõe
que os sequestradores ainda não estejam fazendo dos
taxistas alvos preferenciais.
Depois
de ser assaltada três vezes, uma mulher desenvolveu
um método de redução de danos: passou
a levar uma bolsa "falsa", com pouco dinheiro, mas
sem documentos e cartões de crédito. A bolsa
verdadeira fica debaixo do banco do carro.
Uma grande
empresa resolveu agradar seus executivos incluindo a blindagem
dos carros entre os benefícios indiretos. Já
existe quem pague pela blindagem de um dos quartos da casa,
transformado numa espécie de cofre, capaz de resistir
a qualquer investida de assaltantes; acionado o alarme, a
família se tranca no "cofre" e chama a polícia.
Empresários
e executivos contratam, além dos conhecidos serviços
de ronda, helicópteros, conectados com seguranças
em terra, para vigiar suas casas.
A onda
de violência faz da mais poderosa cidade brasileira
uma comunidade frágil e acuada. O fato mais importante
da vida dos habitantes de São Paulo que, na sexta passada,
completou 448 anos, é a disseminação
do medo numa proporção jamais vista.
Cada um
salva-se como pode; alguns contratam exércitos no exterior,
outros resignam-se com as bolsas "falsas".
Não
é um problema só dos paulistanos. Pela importância
de São Paulo como pólo irradiador de negócios
e da inserção do Brasil no mundo globalizado,
trata-se, sem exagero, de um caso de segurança nacional.
Quando
atacaram Nova York, no ano passado, os Estados Unidos inteiros
se sentiram atacados, por verem atingidos seu núcleo
de poder. Quem é importante e influente no Brasil vive
ou faz negócios em São Paulo.
É
quase impossível -diria até impossível-
encontrar qualquer brasileiro que desenvolva um projeto com
um mínimo de relevância, econômica, política,
tecnológica ou mesmo cultural, que não dependa,
em algum nível, de contatos na cidade.
Estou
começando a me convencer de que os problemas da capital
e das cidades vizinhas, com seus 18 milhões de habitantes,
são tão graves que exigiriam uma solução
radical: a criação de um novo Estado. Haveria
um governador, com uma bancada federal, apenas para cuidar
dos desafios metropolitanos, desobrigado de administrar o
interior.
Sei que
a idéia é inviável neste momento -e talvez
seja sempre inviável. A começar do singelo fato
de que não há dinheiro para se construir uma
nova capital, por mais que a idéia agradasse a prefeitos
e lideranças do interior, que ganhariam mais poder.
A essa
altura, muitos leitores já devem estar acusando este
colunista de bairrismo. Bobagem. Em nenhum lugar do Brasil
há tamanha aglomeração de migrantes e
filhos de migrantes, especialmente do Nordeste -inclusive
este colunista, filho de um pernambucano. Fomos, no passado,
a cidade dos italianos e hoje somos a cidade dos nordestinos.
Se não
é viável criar um novo Estado para dar racionalidade
administrativa, é de se esperar que as três esferas
de poder, federal, estadual e municipal, possam executar projetos
em conjunto. Teriam de combater a crônica lentidão
das máquinas públicas, a extrema dificuldade
de execução de ações que envolvam
vários níveis de governo e, para completar,
as ambições pessoais dos governantes, ainda
mais num ano eleitoral.
A operação
conjunta resultaria, por exemplo, em muito mais dinheiro para
construir prisões, equipar e fiscalizar a polícia.
Prende-se hoje como nunca se prendeu -vamos reconhecer-, mas
é pouco.
Significa
também articular programas de renda mínima e
educacionais para evitar que o jovem caia na marginalidade
e planos de urbanização nos grandes guetos,
onde prospera a delinquência. Bombardeada por todos
os lados e cercada de guetos, São Paulo deve ser encarada
como um problema nacional e urgente, assim como Nova York
para os americanos ou Berlim para os alemães.
PS - Há
quatro anos, voltei de Nova York e, até hoje, perguntam-me
se estou arrependido. Muito pelo contrário. Por ser
síntese do Brasil e cidade que abriga o que há
de mais expressivo em nosso capital humano, São Paulo
está cada vez mais efervescente, mais cosmopolita e,
claro, mais criativa. Estou convencido de que esse lado luminoso
será capaz de vencer o medo. Para mim, paulistano,
judeu, filho de um nordestino e uma nortista, é muito
mais significativo e prazeroso participar da reconstrução
de São Paulo do que da de Nova York.
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