Especialistas
dizem que medidas duras de restrição ao automóvel
são inevitáveis Nem Rodoanel nem
expansão do metrô seriam capazes de conter cerco
ao uso de carros na capital paulista, avaliam técnicos
A vida de quem se desloca de carro na cidade de São
Paulo vai se tornar cada vez mais difícil ou, no mínimo,
mais cara.
Será uma conseqüência inevitável
às medidas de restrição ao uso do automóvel
que a prefeitura deverá adotar nos próximos
quatro anos, independentemente do partido político
que estiver no comando, conforme apostam especialistas.
Alguns avaliam que a impopularidade de ações
prejudiciais ao transporte individual deve ser no curto prazo
até inferior ao desgaste motivado pela deterioração
do trânsito.
O cenário foi traçado por técnicos entrevistados
pela Folha para falar de tendências diante do crescimento
da frota da capital paulista, que, no saldo deste ano, já
recebe mais de 1.300 veículos diariamente.
Para amortizar os impactos seria necessário construir
uma avenida como a Paulista por semana na cidade -medida obviamente
inviável.
A maioria dos técnicos considera que não há
Rodoanel, limitação ao transporte de carga,
expansão da rede do metrô ou modernização
de semáforos capaz de reverter a tendência de
restrição ao carro, ainda que possa postergá-la.
Se por um lado é quase consensual a opinião
de que a vida de quem anda de carro deve ser dificultada,
por outro há divergências sobre de que forma.
Há quem acredite que, assim como Londres, São
Paulo vai aderir ao pedágio urbano. Outros apostam
na restrição ao estacionamento em via pública,
politica já iniciada na gestão Gilberto Kassab
(DEM) e que encarece a garagem privada.
Alguns avaliam que a restrição ao transporte
individual será somente física, com a priorização
dos coletivos. Ou seja, com mais corredores de ônibus,
carros perderão espaço.
A construção de mais linhas de metrô,
promessa dos principais candidatos a prefeito, está
longe de ser considerada suficiente para contornar a piora
do trânsito. Primeiro pela demora das obras. Segundo,
pois não haverá metrô na porta da casa
de todo mundo. Terceiro porque não é suficiente
para levar a maioria a deixar o carro na garagem, dizem analistas.
Fama de vilão
Jaime Waisman, professor da USP, cita uma previsão
que leu recentemente: a imagem do automóvel na próxima
década poderá piorar assim como ocorreu com
a do cigarro. Ganhar fama de vilão, em razão
do trânsito e da poluição.
"Tirar espaço do carro é tendência
internacional. As pessoas já estão mais dispostas
a aceitar restrições. Mas não para pagar
mais", diz Waisman, que, no curto prazo, defende restrição
de estacionamento e ampliação dos corredores.
"O pedágio precisa ser tratado com mais cuidado
por aqui, pois esbarra na falta de transporte público",
afirma.
O consultor Flamínio Fichmann aposta numa perspectiva
mais radical, a do pedágio urbano, sob risco até
de a piora do trânsito resultar em mais impopularidade
do que a decisão pela cobrança. "Quem não
fizer poderá pagar um preço maior. O problema
do congestionamento já passou do ponto, está
muito além do razoável."
"Apesar de a via ser pública, ela é apropriada
de forma individual. Quem usa carro tende a se deslocar mais.
E quem usa mais tem que pagar mais, como é com um telefone",
defende Vernon Kohl, também favorável ao pedágio
urbano, embora acredite que a medida seja "coisa para
quatro, cinco anos".
Até lá, avalia Kohl, as viagens de automóvel
devem ser reprogramadas, "mas sempre em níveis
cada vez mais desconfortáveis". "A cidade
não vai parar, mas vai ficar cada vez pior."
O especialista Bernardo Alvim aposta em "medidas radicais
em favor do transporte coletivo". "Por que há
tanto espaço de estacionamento reservado ao automóvel
e não tanto ao ônibus? O paradigma não
pode estar no transporte individual."
Um estudo do começo da década em algumas capitais
brasileiras mostrou que os carros, proporcionalmente ao número
de usuários transportados, ocupavam as vias oito vezes
mais do que os ônibus.
Alencar Izidoro
Ricardo Sangiovanni
Folha de S.Paulo
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