FHC,
o sem-garagem
Aos 75
anos, o advogado João Uchôa Borges frequenta
assiduamente o Automóvel Clube de São Paulo,
do qual é presidente há 18 anos - e está
prestes a ser desalojado pelo presidente Fernando Henrique
Cardoso.
Localizado
no edifício Esplanada, com vista para o vale do Anhangabaú
e para os jardins do Teatro Municipal, aquele clube já
promoveu algumas das festas mais disputadas pela elite paulista,
chegou a ter 1.600 sócios, rigorosamente escolhidos
e, foi o símbolo de uma cidade que se imaginava européia.
Dali se
assessoraram prefeitos para adaptar o automóvel a São
Paulo, cidade então alardeada como a "locomotiva
do Brasil" ou como "a cidade que mais cresce na
América Latina". A chegada do automóvel
era a própria chegada do futuro.
João
Uchôa viu os bailes desaparecerem; na memória,
ficaram as corridas - as primeiras da América Latina
- organizadas pelo clube, o salão de jogos reservados
apenas para os homens, as conversas em francês. Dos
1.600 sócios sobraram apenas 100, todos movidos pela
nostalgia. "Era um verdadeiro clube social, inspirado
no modelo francês", recorda. Os filhos da elite
tinham a França como principal referência cultural
e acadêmica.
Daqui
a alguns meses, Fernando Henrique Cardoso vai trocar de Esplanada:
deixará a ministerial e irá para o edifício
Esplanada, instalando-se no andar ocupado pelo clube. "Quando
esteve aqui, o presidente Fernando Henrique Cardoso disse
que ficaria mais dez anos e que traria toda a sua biblioteca".
Os defensores
da revitalização do centro estão felizes,
mas Uchôa está triste. Com a chegada do novo
inquilino, o Automóvel Clube, sem condições
de ir para outro lugar, fecha as suas portas: os seus cem
sócios não conseguem pagar as contas de uma
nova sede. Não será poupado nem mesmo o restaurante,
que, embora esteja em seus últimos dias, ainda mantém
o rigor dos velhos tempos. "Quem não está
de gravata e paletó não entra."
Fernando
Henrique Cardoso vai ter se de acostumar aos hábitos
do passado. Uma das ironias é que não fizeram
garagem no prédio que iria abrigar o Automóvel
Clube - até porque, antigamente, a elite não
se incomodava de andar a pé pelo centro da cidade.
Dali, apesar de negar, ele vai avaliar se, em seu futuro,
cabe a volta à Esplanada de Brasília.
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