Padre
Marcelo, o sem-igreja
Padre
Marcelo Rossi inaugurou esta semana a categoria dos sem-igreja.
Entristecido,
ele rogou a Deus, durante a missa de despedida, domingo passado,
que exercesse poderes de corretagem imobiliária e lhe
conseguisse um novo teto para abrigar a multidão de
fiéis.
"O
problema é que a igreja transformou a vida de seus
vizinhos num inferno", diz a urbanista Regina Monteiro,
do movimento Defenda São Paulo, uma das pessoas que
articulam o enquadramento do sacerdote na lei do silêncio.
Localizado
em Interlagos, o Santuário do Terço Bizantino,
cenário dos cultos aeróbicos do padre Marcelo,
tirou o sossego da vizinhança, submetida na marra à
cantoria. A falta de espaço empurra a multidão
para fora do templo, atendida só pelos alto-falantes,
e cria missas a céu aberto.
Foi tentado,
inicialmente, um acordo amigável. Sem resultado. Inconformados,
os moradores se organizaram, acionaram o Ministério
Público e exigiram que os cultos se realizassem a portas
fechadas.
A guerra
contra os alto-falantes durou um ano. Na quinta-feira passada,
a Justiça, pouco se importando com a notoriedade do
padre Marcelo, determinou o fechamento das portas da igreja.
"Não
posso fechar as portas e deixar o povo de fora", justifica
o padre, instalado há três anos naquele galpão
de 7.000 m2, insuficientes para abrigar seu sucesso. O culto
de despedida, por exemplo, atraiu 80 mil fiéis, indiferentes
à chuva - aquele povaréu lotaria o estádio
do Morumbi.
O constrangimento
imobiliário talvez não seja em vão. A
decisão judicial, consequência de uma articulação
comunitária, serve como mostra de civilidade urbana
e estímulo para mais cidadãos fazerem valer
a lei.
"Vamos
empunhar o caso do padre Marcelo como um grande exemplo",
orgulha-se Regina Monteiro.
Animadas
com a decisão judicial, associações de
bairros sentem-se fortalecidas para fazer cumprir a lei do
silêncio, desrespeitada por bares, boates e templos
evangélicos.
Apesar
dos apelos às forças imobiliárias divinas
e, no plano terreno, de contar com a ajuda de poderosos amigos,
padre Marcelo sabe que não será fácil
encontrar, em São Paulo, um templo capaz de abrigar
dezenas de milhares de pessoas sem provocar barulho.
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