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11/11/2001 - 09h14

O terrorismo deve ser derrotado por meio da prosperidade global

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JEFFREY SACHS
Especial para a Folha de S. Paulo

Quando Franklin Roosevelt e Winston Churchill definiram os objetivos dos aliados da Segunda Guerra Mundial na Carta Atlântica, falaram sobre assegurar "o avanço econômico e a segurança social" para o mundo todo.
Em seu discurso de posse, em 1941, Roosevelt disse que o mundo deveria se basear em quatro liberdades, incluindo a "liberdade de carências". Ele pediu acordos econômicos globais que garantissem a todos os países "uma vida de paz e saúde para seus habitantes".

O presidente George W. Bush recentemente fez eco aos líderes da Segunda Guerra Mundial, quando declarou que "nós também derrotaremos os terroristas construindo uma prosperidade duradoura, que prometa mais oportunidades e vidas melhores para toda a população do mundo".

Esse é um objetivo digno e urgente, mas sua concretização exigirá mudanças significativas nas políticas dos países ricos, particularmente dos próprios Estados Unidos.

O mundo atual não oferece prosperidade para todos os cidadãos. Mais de 1 bilhão de pessoas lutam diariamente pela simples sobrevivência -e muitas não conseguem.

Durante os dois últimos anos, fui presidente da Comissão de Macroeconomia e Saúde da Organização Mundial da Saúde. A comissão recebeu evidências detalhadas de que milhões de pessoas pobres morrem todo ano porque lhes faltam os meios mais básicos para continuarem vivas.

As perdas mais chocantes são as que resultam de doenças evitáveis e tratáveis, como sarampo, infecções respiratórias, malária, tuberculose e Aids.

O problema é que o tratamento dessas condições não custa muito dinheiro, mas muito mais do que dispõem os países pobres. A comissão descobriu algumas coisas chocantes.

Nos países mais pobres, os gastos anuais com saúde ficam em torno de US$ 11 por pessoa por ano, enquanto pelo menos US$ 33 por pessoa por ano são necessários para oferecer os serviços básicos de saúde.

Os países ricos devem fornecer aproximadamente US$ 20 por pessoa para superar essa lacuna. Em vez disso, eles fornecem apenas US$ 2 por pessoa, e assim mesmo acreditam que estão suprindo as necessidades dos pobres.

Quando milhões de pessoas morrem em consequência da falta de ajuda financeira, os Estados Unidos e outros países ricos agem como se isso fosse uma ocorrência "natural", e não o resultado de negligência política.

Se cada país rico contribuísse com cerca de um décimo de 1% de sua renda nacional (mais ou menos US$ 0,01 para cada US$ 10 do PIB -Produto Interno Bruto), o resultado seriam US$ 25 bilhões por ano que poderiam ser usados para salvar as vidas de milhões de pobres no mundo.

Essa quantia possibilitaria estender os serviços essenciais de saúde a centenas de milhões de pessoas que hoje carecem de cuidados médicos, incluindo tratamento para Aids, imunização de crianças e distribuição de simples mosquiteiros para evitar a malária.

Infelizmente, os países ricos contribuem com cerca de um quarto do que é necessário, ou seja, US$ 6 bilhões em vez de US$ 25 bilhões.

A comissão estimou que cerca de 8 milhões de pessoas por ano poderiam ser salvas por meio de uma iniciativa com verbas adequadas.

Os Estados Unidos têm sido o doador mais mesquinho do mundo, fato não reconhecido pelo povo americano. Segundo pesquisas de opinião recentes, os americanos acreditam que são o país mais generoso de todos -estimam que os Estados Unidos gastem cerca de 20% de seu orçamento federal em ajuda externa.

A verdade é que menos da metade de 1% do orçamento é gasto em ajuda! Quando a ajuda é medida como parcela do PIB, os Estados Unidos se classificam em último lugar entre os países ricos. Muitos países europeus contribuem com dez vezes mais, proporcionalmente.

Ao pedir um mundo mais próspero para todos, o presidente Bush demonstrou as posições americanas sobre desenvolvimento econômico quando disse que "o comércio pode vencer a pobreza e o desespero".

Muitos americanos acreditam que as forças de mercado por si só, incluindo o comércio internacional, podem solucionar os problemas da pobreza.

Como economista comercial, sei que isso é apenas meia verdade. O comércio de fato beneficia os pobres, se os mercados dos países ricos forem abertos para que os pobres possam vender o que produzem. Mas o comércio por si só não é suficiente.

A política comercial não pode salvar os milhões de pessoas que morrem de doenças. Somente a assistência financeira dirigida pode fazer isso. Além disso, onde há doenças, o crescimento conduzido pelas exportações é uma meta quase impossível.

A mesquinharia americana, além disso, resulta em altos custos para a segurança americana. A inteligência dos Estados Unidos há muito compreendeu que as doenças e o empobrecimento contribuem para a "falência estatal", termo técnico para colapso político, revoluções, guerras civis, terrorismo patrocinado pelo Estado e golpes militares.

Quando ocorrem as "falências estatais", frequentemente são seguidas de dispendiosas intervenções militares dos Estados Unidos e seus aliados.
Os países ricos só parecem intervir quando é tarde demais, em vez de trabalhar seriamente para evitar as crises e o colapso, em primeiro lugar.

O presidente Bush abriu uma discussão mundial sobre as maneiras de promover a prosperidade para todos. Os líderes mundiais deveriam, portanto, enviar uma mensagem ressonante aos Estados Unidos e a outros países ricos.

É hora de os ricos promoverem o verdadeiro desenvolvimento econômico por meio da assistência externa em níveis adequados às necessidades dos pobres e por meio de mercados abertos que permitam aos pobres exportar para atingir uma prosperidade maior.

Até que se tomem essas medidas, o mundo permanecerá perigoso e dividido, com os pobres sofrendo ou morrendo desnecessariamente, e a instabilidade e os distúrbios políticos continuarão a reinar.

  • Veja os reflexos da guerra na economia


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